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"O melhor lugar da mesa é onde eu sento", diz Fagundes sobre o seu trabalho

Mauricio Stycer

11/04/2016 05h01

velhochicofagundes

Sai Rodrigo Santoro, entra Antonio Fagundes. A partir desta segunda-feira (11), o protagonista de "Velho Chico" exibe uma barriga notável, mas está mais vaidoso, pinta o cabelo e busca parecer mais jovem do que é.

A novela das 21h30 da Globo chega aos dias atuais. O coronel Afrânio de Sá Ribeiro, perto dos 70 anos, está recebendo convidados em sua casa para festejar o centenário da mãe, Encarnação (Selma Egrei). O UOL assistiu à gravação de algumas destas cenas, na última semana, na ilha de Cajaíba, em São Francisco do Conde, a 70 km de Salvador.

Dirigido por Luiz Fernando Carvalho, Fagundes contracena com Marcelo Serrado, no papel do genro Carlos Eduardo, e de José Augusto Branco, que faz uma participação como um senador, amigo do coronel. Subservientes, os convidados riem das piadas sem graça ou grosseiras que o personagem faz.

"Velho Chico" é a terceira novela de Benedito Ruy Barbosa em que atua como protagonista. As outras foram "Renascer" e "Rei do Gado". Do autor, também atuou em "Terra Nostra", "Meu Pedacinho de Chão" e na minissérie "Mad Maria".

Depois da gravação, de banho tomado e sem a peruca que usa em cena, Fagundes conversou com o repórter. Pergunto como se sente vivendo novamente um protagonista. "O melhor lugar da mesa é onde eu sento. Eu sou sempre protagonista. As pessoas podem não achar, mas eu estou sendo."

Peço para o ator explicar as diferenças entre Zé Inocêncio, os Mezenga e Afrânio de Sá Ribeiro: "As pessoas, enganosamente, dizem que o Benedito fala sempre do mesmo assunto. É uma mentira, uma vasta mentira, de quem vê superficialmente a televisão".

Fagundes prossegue no assunto: "O Benedito é uma pessoa que aprofunda diferentemente cada assunto que ele aborda. Não tem, com certeza, nenhuma relação entre 'Renascer', 'Rei do Gado' e 'Velho Chico'. Nenhuma", enfatiza.

E completa: "As pessoas que são reducionistas dizem: 'Ah, é uma novela rural!'. É preconceito enquadrar a coisa dessa forma. Pessoas que tentam enquadrar o Benedito desta forma não estão assistindo às novelas dele. Porque se assistir vão perceber que não são iguais. As diferenças são muito fortes".

O ator elege duas cenas da primeira fase como "emblemáticas" da trajetória do seu personagem. Na primeira, Afrânio chega no bar e encontra o inimigo de seu pai, o capitão Rosa, e diz: "Não estou armado. Minha arma é a pena e a lei". A segunda é o momento em que Afrânio para o carro numa encruzilhada, em dúvida se vai para a fazenda da família ou se volta para Salvador.

Diz Fagundes: "Ele é o emblema de qualquer pessoa honesta que queira entrar no Congresso Nacional hoje em dia. Na encruzilhada, ele diz: vou pra cá ou pra lá? Se ele quiser ser honesto, é igual ter uma pena e a lei do seu lado – e levar uma facada logo depois. E se ele não quiser ser honesto, ele vai ser o quê? Ele vai entrar no sistema. E o sistema come ele. É o desenvolvimento do Afrânio. Ele vira um arquétipo da loucura que é esse Brasil".

Nas cenas da festa do centenário, o coronel Afrânio porta um pequeno broche com a bandeira brasileira. Fagundes chama a atenção para este detalhe e diz: "Não tenham dúvida: ele é o que está acontecendo hoje. E o que está acontecendo hoje é fruto daquela encruzilhada que o cara estava lá atrás."

O ator é só elogios para o diretor da novela. Nos últimos anos, Fagundes foi dirigido por Carvalho em "Meu Pedacinho de Chão" e "Dois Irmãos" (série inédita). "É o terceiro trabalho que faço com ele neste 'teveliê', um ateliê de televisão. É quase uma manufatura. Não é uma novela. Não é só um personagem que você vai fazer. Você senta e tem uma noção do universo onde você está atuando."

Fagundes acrescenta: "O Luiz Fernando é um pintor, no sentido de que põe a mão na tinta. Alguns quadros ele pinta com o dedo, como o Van Gogh. Ele gasta tinta. Ele enfia a mão".

Por fim, o ator observa: "Pode dar certo, pode não dar certo, a gente nunca sabe. Ninguém faz um trabalho para dar errado. As pessoas vão aceitar ou não vão aceitar… Depois vamos discutir isso. Mas o nosso melhor está sendo feito."

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O jornalista viajou a convite da Globo.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.