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Repórter do povo no Rio, Susana Naspolini fala de perrengues e superação

Carolina Farias

Do UOL, no Rio

24/03/2019 04h00

Parece até zoeira ou pegadinha. A repórter da Globo Susana Naspolini já apareceu em cima de uma árvore, dentro de buracos, pedalando bicicletinha, comendo churrasquinho e até vestida de longo para imitar a cerimônia do Oscar - com tapete vermelho e tudo. As peripécias exibidas no "RJ1", o telejornal local, são formas que ela encontra para retratar, com bom humor os inúmeros problemas da periferia da cidade.

Conhecida pela espontaneidade, a repórter tem uma impressionante história de superação: ela foi diagnosticada com câncer quatro vezes, a primeira aos 18 anos, outros dois quando tinha 37 e o último, em 2016, aos 43. Da doença, Susana tirou um aprendizado.

Susana Naspolini não se inibe se tiver que subir em uma árvores para relatar os problemas da população no Rio - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Susana Naspolini não se inibe se tiver que subir em uma árvores para relatar os problemas da população no Rio
Imagem: Reprodução/Instagram
"Na vida a gente aprende mais com o sofrimento, com as pedras do caminho do que com as alegrias. A gente escolhe como se posicionar: levar uma lambada e sair dela melhor ou sair amargurada. Tem as duas opções diante de qualquer problema, não apenas do câncer. Exercito muito isso. Não é fácil, mas é uma escolha."

Na última vez que o câncer foi diagnosticado, Susana tinha perdido o marido havia apenas dois anos. O repórter esportivo Maurício Torres morreu precocemente, aos 41 anos, em decorrência de um problema cardíaco.

"Claro que não tê-lo ao meu lado foi ruim. Mas a morte dele foi tão sofrida. Aprender a não ter ele nas nossas vidas foi tão difícil que não foi porque eu estava doente que ficou pior. Teria sido muito bom se ele estivesse ao meu lado por causa do câncer, mas também na Páscoa, no Natal, no cinema de sábado à noite, nos problemas", diz Susana.

Em maio, Susana lança o livro "Eu Escolhi Ser Feliz", que trata sobre sua trajetória e principalmente como enfrentou a doença quatro vezes.

"A vida é maravilhosa. A gente sofre, chora, tropeça, cai, mas o bom é levantar e rir no outro dia. Levar um não cinco vezes e se esforçar para que, na sexta vez, venha o sim. Estar vivo é ter problema. A única forma de não ter problemas é morrendo, mas a gente quer viver. Escolha o pensamento bom. Levanta, sacode a poeira, toma um café, come um chocolate, liga pra um amigo, faz alguma coisa. Só não dá espaço pra energia ruim", ensina.

Repórter é ser humano

O quadro "RJ Móvel" é apresentado por Susana há cinco anos e foi praticamente criado por ela e seu cinegrafista Diógenes Melquíades.

"Os moradores me contam os dramas e criamos juntos as situações. É minha obrigação saber o que dá ou não para fazer ao vivo. Se não conseguem andar de bicicleta, eu preciso mostrar isso. Se o morador coloca saco plástico no pé para passar pelo esgoto, vou botar também. Não estou criando nem aumentando. O repórter é um ser humano como qualquer outro, que está ali cumprindo a obrigação de mostrar um problema. Essa é a minha luta", explica a repórter de 46 anos, há quase 20 na Globo.

"Queríamos colocar o morador em primeiro plano, sem necessariamente ter um texto gravado pelo repórter. As coisas foram acontecendo aos poucos até chegar onde estamos hoje. Isso é o que mais me emociona: o 'RJ Móvel' foi sendo muito construído pelos moradores. Devo a eles o quadro que temos hoje. Se o quadro é legal, dá certo e as pessoas gostam, o mérito é todo deles."

Susana Naspolini reproduz os problemas da população para chamar atenção do poder público - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Imagem: Reprodução/Instagram
Os moradores fazem a denúncia para e a emissora, que envia a equipe ao local. Uma autoridade, do Executivo municipal ou estadual, sempre é chamada a prestar esclarecimentos ao vivo e informar quando o problema será resolvido. Esse representante ganha um calendário onde uma data é marcada para início ou até mesmo conclusão da obra. Susana volta implacável na data marcada para cobrar a solução do problema.

"Cada fechamento de calendário, uma obra resolvida, é muito emocionante. Passa um filme na nossa cabeça. Desde a primeira vez que fomos ali, a amizade que foi construída. Voltamos tantas vezes no mesmo lugar, às vezes cinco, dez, quinze vezes, que não tem como não saber dos problemas das pessoas. Bato papo, tomo café, trocamos conselhos. Olhar como era, e depois é emocionante e dá um significado para o nosso trabalho", conta.

Para não se arrepender de algumas das demostrações que faz no quadro, Susana diz que ela e equipe calculam os riscos das "simulações" que ela faz nas reportagens.

"Já tive uns arranhões. Outro dia caí de joelho no chão, mas nada grave. Testo tudo antes. Se vou subir em uma árvore, eu não deixo para fazer só no ao vivo. Subo antes para ver se dá certo. Se é perigoso, se não vou me arriscar. Não quero me machucar, nem virar o assunto da matéria. Tenho uma filha para criar. O foco é a obra para melhorar a vida das pessoas", lembra.

Filha madura e parceira

Susana começou aos 19 anos no SBT, em Florianópolis, depois foi para a RBS, afiliada da Globo, em Criciúma, onde nasceu, e na sequência Joinville. Antes de estrear no Rio, em 2001, trabalhou na TV Vanguarda, no interior de São Paulo.

A mudança para a capital fluminense aconteceu por conta do casamento com Torres, que trabalhava na mesma emissora. Após ficar viúva, ela conta que sempre pode contar com o apoio de amigos e da família.

"Não tenho do que reclamar dessa rede que me sustenta: meu pai, minha mãe, meus irmãos. O problema sempre foi nosso. Tem minha filha [Júlia, de 12 anos] que é surreal de tão madura e parceira. Também os amigos do trabalho, de fora, das redes sociais sempre querendo saber como eu estava e fazendo correntes de orações."