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Thiago Martins faz DVD no Vidigal: 'Nascer na favela não me faz diferente'

Do UOL, em São Paulo

04/06/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Ator fala de como sua história de vida está retratada no novo projeto musical, a ser lançado no mês que vem
  • Sobre o retorno das gravações de "Amor de Mãe", ele afirma não saber ainda quando acontecerá
  • Mas faz planos: assim que acabar a novela, sairá em turnê para divulgar as novas canções

Uma casa na praia do Vidigal foi o local escolhido por Thiago Martins para a gravação de seu primeiro DVD, que deve ser lançado neste mês.

"Escolhi um lugar que é na avenida Niemeyer, onde eu cresci. Sou nascido e criado no Vidigal. E a praia do Vidigal é onde eu nasci, onde eu comecei a pegar onda. E eu tenho uma história particular com essa casa [onde aconteceu a gravação]. É uma propriedade particular, e eu sempre tentava invadir para tomar banho de piscina. Já tomei muito cascudo quando era moleque", lembra o cantor.

"Anos depois, gravei meu primeiro DVD nessa casa. A vida é muito isso. Não desistir, se empenhar nos nossos objetivos. Muita gente falava que era impossível chegar, que não ia dar, para eu procurar outra coisa [como profissão]. E eu nunca escutei isso. O fato de eu ter nascido na favela não me faz diferente de ninguém, pelo contrário. A minha motivação é ainda maior."

Em entrevista ao UOL, o ator fala também sobre "Amor de Mãe" e diz que não sabe ainda quando as gravações da trama das 21h devem ser retomadas. "Eu nem lembro onde a novela parou, para ser sincero", brinca o intérprete de Ryan.

Confira, abaixo, trechos da entrevista.

Thiago Martins é Ryan - João Cotta/Globo - João Cotta/Globo
O ator Thiago Martins
Imagem: João Cotta/Globo
Chegada do coronavírus ao Brasil

Nunca pensei que a gente ia chegar a este ponto. No início, achei que logo os chineses encontrariam a cura e que não seria essa catástrofe toda que está sendo. Estava completamente enganado. Essa pandemia veio para mudar a rotina de todo o mundo, não só do brasileiro. É muito mais sério do que a gente pensa.

E está ficando bem mais sério aqui no Brasil, cada dia os casos aumentam mais. E isso me assusta bastante, porque o Brasil ainda tem muito o que melhorar na saúde, na educação. Por isso, todo o mundo tem que fazer a sua parte e realmente ficar em casa, respeitar a quarentena. É um trabalho conjunto. Eu ainda bato na tecla de que se cada um fizer a sua parte a gente vai sair dessa. Esse vírus veio para mostrar o quanto a gente é mais legal unido.

O papel da arte

Se hoje eu sou cantor, se hoje eu sou compositor, se hoje eu sou ator, se hoje eu sou um artista, é porque a arte me tocou de alguma forma e mudou a minha vida. E a arte muda a vida de milhões de jovens de comunidades. A arte tem de ser tratada com muito cuidado e com muito amor também. A cultura e a educação são pontos principais para a mudança, a base de tudo está aí. Então, peço aqui encarecidamente que olhem para a cultura, para a arte e para a saúde com mais atenção. E até com mais amor, mesmo.

Eu não vou desistir de ser artista, de espalhar a minha arte por aí, mas, como eu disse, esse trabalho é conjunto. Há grandes artistas fazendo lives, grandes professores dando aula através da internet, grandes atores se reunindo para ler sobre grandes autores. A arte transforma.

Artista tem que se posicionar?

Acho que como formadores de opinião a gente tem que debater. O diálogo é muito importante. O meu jeito não é o certo, e o seu jeito não é o certo. Acho que a gente tem que chegar a um denominador comum. Por mais que você não concorde com o que eu digo, somos seres humanos, vivemos no mesmo país e ele tem diversos problemas. Como artista, eu tento sempre colocar o meu posicionamento, mostrar no que eu acredito, quais são os meus ideais e as minhas ideias. Mas que seja saudável, não uma guerra. Se a gente não se unir, a tendência é piorar.

Rotina na quarentena

A minha quarentena está sendo como a de todo o mundo: dentro de casa, vivendo mais a família. Tenho assistido muitas séries, filmes, estou estudando violão e comecei a estudar inglês sozinho. Estou me dedicando mais a cozinhar. São coisa que quando a gente está na vida corrida não consegue fazer direito. Eu sempre fui muito caseiro, mas claro que sinto falta de encontrar meus amigos em algum bar, de ir ao cinema, ir ao teatro. Mas dentro de casa, para não pirar, estou tentando treinar com meu personal, procuro tocar violão, jogar videogame —coisa que eu não fazia desde a adolescência.

Ryan (Thiago Martins) e Sabrina (Anitta) em Amor de Mãe - Globo/Estevam Avellar - Globo/Estevam Avellar
Ryan (Thiago Martins) e Sabrina (Anitta) em "Amor de Mãe"
Imagem: Globo/Estevam Avellar

"Amor de Mãe"

Quando isso tudo aconteceu, a Globo de imediato tomou uma decisão: ligou para a gente e comunicou que as gravações seriam interrompidas por um período de quatro a oito semanas. A gente deve estar indo para a oitava semana agora. Eles não falaram nada ainda sobre essa volta. A gente tem um grupo com todos os atores, gerentes da novela, produção. E a gente vem se falando, mas nada sobre a volta. Falamos mais sobre a saudade que temos sentido, sobre o desejo de voltar com a novela, que era muito prazerosa de se fazer.

Eu nem lembro onde a novela parou, para ser sincero. Porque, como a gente estava numa demanda muito grande de trabalho, gravando todos os dias, eu tentava acompanhar pela Globoplay, porque nossos estúdios acabam nove da noite, até chegar em casa já perdi o horário da novela.

Acho que o Ryan vai tentar ao máximo voltar para a Marina [Erika Januza], que é o grande amor da vida dele. Depois de todas as burrices que ele fez, depois de ter ficado deslumbrado com a fama, de ter traído a Marina, acho que ele vai lutar por esse amor. Não sei se vai querer voltar para a música. Famoso eu sei que ele não quer ser.

Carreira na TV

Para um menino que veio do Vidigal, fazer uma novela de grande sucesso como "Da Cor do Pecado" [Globo, 2004] mudou a minha vida. A Globo tinha me procurado, e a Giovanna Antonelli me deu uma forcinha, me indicou para esse teste. A crítica foi muito boa com relação ao meu personagem.

Hoje, a junção da televisão com a internet é uma grande potência. E as novas empresas que chegaram ao mercado são muito bem-vindas, pois tem mais emprego para a gente, que é ator. É o que eu sempre digo: nós, atores, somos eternos desempregados. A gente nunca sabe qual será o nosso próximo trabalho —a não ser que você seja contratado, mas, no meu caso, eu ganho por obra. Eu criei uma outra ferramenta na minha vida e canto também, então eu ainda tenho essa outra carreira. Venho do Nós do Morro, que me ensinou a ser artista. Mas é muito legal ver essas grandes empresas chegando, Netflix, HBO, a própria Fox, que vêm fazendo bastante barulho, produzindo filmes, séries

Fama

Antes de ser artista, eu sou ser humano. Eu gosto, sim, de tomar a minha cerveja, de fazer o meu pagode, o meu churrasco, gosto de treinar, gosto de comer besteira de vez em quando. Quem me segue sabe que eu sou eu mesmo, eu não me fantasio, eu não me coloco em pedestal nenhum. Para mim, ser ator, cantor, compositor é a minha profissão —como médico, como repórter.

É claro que a minha profissão traz muito mais visibilidade, por eu invado a casa das pessoas todo dia, às nove da noite. Mas acho que a transparência é a base de tudo, a verdade. Procuro ser eu mesmo. A internet é uma terra de ninguém, existem pessoas que estão ali para fazer o bem e pessoas que estão ali para fazer o mal. Qualquer frase mal colocada, qualquer brincadeira mal colocada vira uma guerra.

Ser famoso é muito bom, tem que tirar proveito das coisas boas e aprender com as ruins. Você perde a sua privacidade, muita gente quer saber da sua vida, inventa coisas sobre você, mas é muito legal também ver que pessoas se identificam com sua história, que se espelham em você como profissional e até como ser humano, de certa forma. A fama me ensinou muita coisa, mas é claro que dá aproveitar muita coisa que ela dá também.

Lançamento do DVD

Depois de "Amor de Mãe", eu tenho a prioridade de lançar meu DVD —quando eu digo lançar é fazer a turnê. Porque não vou conseguir ficar dentro de casa com as pessoas cobrando esse DVD. Então, vou lançar neste mês e vai ser um momento muito especial. Fiz com muito amor, é a minha cara, com as minhas escolhas. Abro o DVD contando isso. "Eu vim aqui para contar a minha história em música." Quem acompanhar vai ver que é a minha vida, então, tem muito amor envolvido.

Esse DVD foi feito em 20 dias, exatamente. Gravei em 1º de dezembro de 2019, era um domingo, a probabilidade de chuva era 96%, o lugar era aberto e não choveu. O DVD foi um sucesso. Escolhi um lugar que é na avenida Niemeyer, onde eu cresci. Sou nascido e criado no Vidigal. E a praia do Vidigal é onde eu nasci, onde eu comecei a pegar onda. E eu tenho uma história particular com o lugar que eu fiz [o DVD]. Era uma casa, uma propriedade particular, e eu sempre tentava invadir para tomar banho de piscina. Já tomei muito cascudo quando era moleque. E, anos depois, eu estava gravando o meu primeiro DVD nessa casa.

A vida é muito isso. Não desistir, se empenhar nos nossos objetivos. Onde eu cresci, no Vidigal, muita gente falava que era impossível chegar, que não ia dar, para eu procurar outra coisa. E eu nunca escutei isso. O fato de eu ter nascido na favela não me faz diferente de ninguém, pelo contrário. A minha motivação é ainda maior. Meu maior sonho era dar uma vida estável para a minha família e eu consegui fazer isso aos 19 anos. Então, tenho que me orgulhar. Tive muito apoio da minha comunidade, do meu grupo de teatro, dos meus amigos, da minha família, mas tinha gente que torcia contra. E se eu deixasse me levar por isso, eu não estaria aqui hoje dando esta entrevista para você, não estaria vivendo dignamente através da minha arte. E o meu DVD fala muito sobre isso. É um sonho realizado.