Topo

Eva Wilma reflete sobre pandemia: "Mais do que medo, é uma depressão"

A atriz Eva Wilma - Globo/Raquel Cunha
A atriz Eva Wilma Imagem: Globo/Raquel Cunha

Guilherme Machado

Do UOL, em São Paulo

23/06/2020 04h00

"Fui adolescente durante a Segunda Guerra Mundial." A frase é de Eva Wilma, que enquanto reflete sobre o atual momento da pandemia do novo coronavírus, que ela classifica como um dos mais duros da história, relembra sua trajetória e sua experiência. Ela cresceu em meio a um conflito mundial, veio a se tornar símbolo da luta contra a ditadura militar no Brasil e hoje se resguarda contra a pandemia, um momento que encara com tristeza, mas também com bravura.

Os mais idosos conhecem muito a palavra medo, não só no momento atual, como em outros momentos da vida. Mas quem conhece bem isso conhece também o contrário, que é a coragem. Posso citar por exemplo a Laura Cardoso, a Nathalia Timberg, a Fernanda Montenegro, a Nicette Bruno e eu. É um time inteiro da coragem, que é o contrário do medo. Mas, claro, para conhecer a coragem você tem que conhecer o medo também. Eva Wilma ao UOL

As atrizes Eva Todor, Tônia Carrero, Eva Wilma, Leila Diniz, Odete Lara e Norma Bengell em 1968, durante a passeata dos cem mil, em protesto contra a ditadura militar no Brasil, no Rio de Janeiro - Reprodução - Reprodução
As atrizes Eva Todor, Tônia Carrero, Eva Wilma, Leila Diniz, Odete Lara e Norma Bengell em 1968, durante a passeata dos cem mil, em protesto contra a ditadura militar no Brasil, no Rio de Janeiro
Imagem: Reprodução

Em sua casa em São Paulo, a atriz, que está isolada, reconhece que os dias têm sido complicados e que o medo da doença é algo que ronda o ambiente.

Todo mundo teme, como não? Todo mundo sente um pouquinho de medo. Mas eu acho que mais do que o medo, é uma espécie de depressão com o cansaço de ficar dentro de casa. Mas é preciso ter imaginação. Sinto falta não só do teatro, como do cinema, da conversa ao vivo com os amigos e com a família, com meus cinco netos. Isso tudo faz falta.

Mas a atriz também tem encontrado formas de relaxar nesse momento.

Tenho me cuidado como todo mundo. Estou lendo, ouvindo música, não deixando de me exercitar um pouquinho fisicamente. Converso com as pessoas e estou me entregando a esse vício da comunicação virtual, o que para a minha geração é um grande mistério. Estou agora descobrindo tudo. Eu fico no WhatsApp conversando com as amigas. Faço parte de dois ou três grupos, um deles de amigas do colégio. Você imagina: amigas há 60 anos e a gente se comunica, lembrando de coisas!

Oxente, my god!

Atualmente, Eva também encontra alegrias em rever novelas — ela conta que assiste todas. Em uma delas, ela consegue se rever na telinha: "FIna Estampa", onde viver a tresloucada tia Íris, personagem que guardava o grande segredo da vilã Tereza Cristina (Christiane Torloni).

"Eu fazia parte do elenco como atriz convidada, é uma participação pequena. Mas a gente precisa pegar o pequeno e fazer grandioso", conta Eva.

Enquanto fala de sua experiência em "Fina Estampa", Eva relembra ainda outras histórias: como adorou o trabalho de Marcelo Serrado, o Crô, como já havia atuado com a mãe de Christiane Torloni no teatro de Arena, ou então seu trabalho com Lilia Cabral em "De Quina Pra Lua", quando a protagonista da novela das 21h ainda começava sua carreira.

Mas, talvez a lembrança mais forte venha de outra personagem: "A Íris é descendente da Altiva, de "A Indomada", novela do mesmo autor. As duas têm em comum o fato de desencadearem todas as pequenas maldades".

A vilã icônica que Eva viveu em "A Indomada" serviu como inspiração para sua aparição em "Fina Estampa". Tanto, que as personagens tinham muitos dos mesmos trejeitos e até um mesmo bordão: "Oxente, my god!".

A Maria Altiva, sem dúvida, é uma personagem que todo mundo lembra sempre. Não só pela capacidade do autor, como minha de atriz, mas também pelo humor da personagem dentro daquelas maldades todas. Eu tive um prazer enorme em fazer aquela personagem, sempre sem perder o prazer da brincadeira de fazer um papel.

As semelhanças eram tantas, que no final de "Fina Estampa", tia Íris foi parar em Greenville, cidade fictícia onde a trama de "A Indomada" se passava.

Greenville é um nome poético, uma vila verde. Quando eu fiz a cena de retorno a Greenville em 'Fina Estampa' foi gostoso, foi emocionante. Eu fiz com muito prazer essa cena. - Eva Wilma sobre o desfecho de sua personagem

Novelas e futuro

Eva Wilma como tia Íris de 'Fina Estampa' - Globo/Estevam Avellar - Globo/Estevam Avellar
Eva Wilma como tia Íris de 'Fina Estampa'
Imagem: Globo/Estevam Avellar

A última novela de Eva Wilma foi em 2018, quando atuou em "O Tempo Não Para', onde viveu a doutora Petra, um papel que ela acredita conversar muito com o momento atual.

Tenho satisfação de lembrar não só de 'O Tempo Não Para', como também de 'Verdades Secretas', onde eu fazia uma idosa alcoólatra, mãe de um dos protagonistas. Ela tinha humor, tinha aquela brincadeira toda que eu adorei fazer. E em "O Tempo Não Para" eu fazia uma cientista, nada tão atual quanto essa proposta da ciência. Essas coisas ficam na memória para sempre.

Ela se emociona assistindo as novelas atuais, um hábito seu — ela fica especialmente tocada ao ver o trabalho de jovens atores como Letícia Colin, Felipe Camargo e Caco Ciocler. "Tanto Felipe quanto Caco foram meus filhos em seus primeiros trabalhos na televisão e lembro bem de ter percebido logo o talento desses excelentes atores . Eu fico muito feliz, é como se eu tivesse vendo a geração de filhos e netos com tanto talento", enfatiza ela.

No meio de tudo isso, ela também pensa nos projetos que ainda quer tocar depois da pandemia. Ela mesma enfatiza: tem mais de 60 anos de carreira e não pretende parar, já tendo um filme, "As Aparecidas", e um espetáculo musical, "Casos e Canções", engatilhados.

O espetáculo começa com a canção tocando 'Em frente', de Renato Teixeira e Almir Sater, que motiva esse trabalho e é uma música que eu adoro. Eu começo falando "ando devagar, porque já tive pressa, e levo esse sorriso, porque já chorei demais. Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe, só levo a certeza de que muito pouco eu sei, ou nada sei".

Eva Wilma - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução