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As justificativas que Rodolffo usa, sem perceber, para normalizar o racismo

BBB 21: Rodolffo fala sobre João com Juliette - Reprodução/Globoplay
BBB 21: Rodolffo fala sobre João com Juliette Imagem: Reprodução/Globoplay

Ane Cristina e Pedro Ezequiel

Do UOL, em São Paulo

06/04/2021 08h50Atualizada em 16/04/2021 11h29

Ao vestir a fantasia do castigo do monstro, no "BBB 21" (TV Globo), Rodolffo afirmou que a peruca do figurino era igual ao cabelo de João, que é crespo. O comentário racista afetou João Luiz por dias seguidos. Ontem, no jogo da discórdia, o professor de geografia revelou a todos da casa a fala de Rodolffo, chorou por alguns minutos e precisou sair da dinâmica para se recompor.

Ao invés da reação imediata ser um pedido de desculpas, Rodolffo reafirmou seu comentário. O sertanejo só se desculpou quando cobrado por Pocah.

Após o jogo da discórdia, o cantor continuou tentando justificar comparando a si mesmo e pessoas da sua família a João, normalizando o racismo. Confira abaixo alguns dos "argumentos" de Rodolffo:

"Era um pouco semelhante"

Logo após o desabafo de João, no qual o professor de geografia disse que a fala de Rodolffo "tocou num ponto muito específico" e cobrou respeito do sertanejo, Tiago Leifert perguntou se Rodolffo gostaria de posicionar. O brother respondeu reafirmando a fala racista:

Se todo mundo observou como era a peruca do monstro... Acredito eu que era um pouco semelhante. Rodolffo

Rodolffo comparou uma peruca com o cabelo crespo. A peruca era de um homem das cavernas — algo descuidado, primitivo, em mau estado — com o black power de João, que tem um significado de resistência e estilo. Para ficar bem explicado e não restar dúvidas: Rodolffo associou o crespo a algo ruim, afirmando que são "semelhantes".

A pesquisadora e educadora em moda, história cultural e curadoria Hanayrá Negreiro disse a Ecoa no ano passado como o cabelo tem um significado. "Os fios crespos comunicam a negritude, consolidam uma busca pela ancestralidade e o orgulho por um cabelo que é tão renegado pela sociedade. Ao assumir tal aparência, a pessoa expressa que tem orgulho do seu black power e o usa como manifestação política, de uma luta antirracista

"Meu pai tem cabelo igual"

Em sua vez de falar, Camilla defendeu João e disse que a fala de Rodolffo a fez mal. "O que cansa a gente não é essa coisa de você não saber o que é. As justificativas sempre são essas e eu realmente entendo que você não tenha falado para magoar", apontou a influenciadora.

Rodolffo a interrompe, questionando: "Camilla, o cabelo do meu pai é igualzinho o do João. Se fosse pra machucar, eu queria machucar o meu pai?"

"Eu sei, eu entendo que as vezes a intenção não é magoar. Mas magoa", rebate a carioca.

"Mas a intenção não foi! Você acha que eu faria uma coisa de maldade? Cabelo do meu pai é igualzinho dele", volta a repetir o goiano.

Ainda que não tenha sido intencional, o comentário do cantor sobre João reforçou um estereótipo racista. Ter parentes ou se relacionar com negros não isenta alguém de ter falas ou atitudes racistas.

Pelo contrário, ter família inter-racial ainda pode permitir casos de racismo, pois tem uma hierarquia, como apontou Lia Vainer Schucman, doutora em Psicologia Social pela USP, em reportagem de Universa em 2019.

Um ano antes, Anhamona de Brito, doutora em Difusão do Conhecimento pela Universidade Federal da Bahia e ativista de Direitos Humanos, que já atuou como Superintendente de Direitos Humanos do Governo da Bahia, fez um alerta em Universa: "Ter negros e gays como amigos ou parentes não faz com que o preconceito e a discriminação se dissolvam no ar".

Falou do próprio cabelo

BBB 21: Rodolffo mostra o cabelo para Camilla - Reprodução/Globoplay - Reprodução/Globoplay
BBB 21: Rodolffo mostra o cabelo para Camilla
Imagem: Reprodução/Globoplay

Após o jogo, enquanto o programa ainda estava no ar, Rodolffo disse a Camilla que também tinha cabelo crespo.

"Eu tenho cabelo crespo, isso aqui é alisado", disse o brother, tirando o boné e apontando para o cabelo.

"Não, Rodolffo. Deixa eu te falar, existe uma diferença entre cabelo cacheado, crespo, liso e ondulado. O que a gente mais luta hoje, é pela aceitação do nosso cabelo e essas comparações. Pode não ter sido sua intenção, mas isso magoa e pra gente que ouve é cansativo", respondeu a influenciadora.

Rodolffo não possui o cabelo crespo, como ele mesmo exibiu e é possível acompanhar nas câmeras.

Mas ainda que tivesse, não seria uma justificativa válida, pois não o daria "passe livre" para comparar o cabelo de João com a peruca do monstro. Seria ofensivo da mesma maneira: a associação do crespo a algo ruim ainda estaria ali na sua fala.

Comparou a situação a ter "canela fina"

Ainda na conversa com Camilla, Rodolffo afirmou que costumam "brincar" com ele em relação a ter as panturrilhas magras.

Se ele achou ruim, eu concordo, mas se fosse pra contrariar uma classe, se eu soubesse que contrariaria, cara... Brincam comigo. Eu não apelo com brincadeira, eu sou magro, tenho as canelas finas, o povo brinca que eu tenho. Rodolffo.

"Eu também tenho canela fina, isso é outra questão", rebateu Camilla.

Mais uma vez, Rodolffo comparou situações que não são comparáveis. O comentário sobre o cabelo de João está relacionado a racismo estrutural, ou seja, a distinção histórica entre brancos, negros e indígenas que favorece o primeiro grupo.

Seu corpo, seja ele magro ou não, diz respeito a alimentação, biotipo e uma cobrança estética.

Ainda que possíveis brincadeiras sobre sua panturrilha tenham magoado Rodolffo, são situações extremamente distintas.

Além de mexer com pontos profundos como autoaceitação e autoestima, a fala do sertanejo reforça um estereótipo ao comparar uma pessoa negra a um "homem das cavernas", como explicado ali em cima.

Um ano atrás, a imagem de um participante negro foi comparada com "um monstro": Babu Santana teve seu pente garfo, que é um símbolo da luta antirracista, ridicularizado, e foi colocado como quem dava medo na casa — para além da fantasia das dinâmicas. E nenhuma das vezes foi só brincadeira. Na ocasião, Babu respondeu: o black power é a coroa e o pente garfo é a libertação.

O documentário "BBB: Casos de Polícia", produzido pelo UOL, relembra a história de Babu no BBB 20 e também a de Solange Vega, do BBB 4, que teve seu cabelo chamado de "pixaco" pela participante Marcela, a Mama. Assista:

Fogo no parquinho! As dinâmicas do jogo da discórdia no 'BBB 21'

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