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Adrilles: Boa morte, Geralda. Boa ressurreição, Geralda

Com cinco pontos, Geralda foi eliminada nesta sexta-feira (1) - Reprodução/TV Globo
Com cinco pontos, Geralda foi eliminada nesta sexta-feira (1) Imagem: Reprodução/TV Globo

Colaboração para o UOL

02/04/2016 08h11

O quarto lugar no “BBB” tem um gosto quase amargo. De morte na praia. Mas nem tanto. Todo o nado foi filmado e devidamente visualizado por dezenas de milhões de pessoas. Que podem aprovar ou reprovar ou analisar a fundo a epopeia particular do afogado que ainda vive.

Houve um sujeito -- quarto lugar em “BBB”, tragipateticamete suicidado na praia, com pretensões a poeta -- que disse em sua eliminação que em poesia se ganha na perda: moralmente, esteticamente. Que o maior ícone da história da cultura mundial era um sujeito aparentemente derrotado, crucificado no final. Uma aparente derrota circunstancial que foi a maior vitória da história do humanismo.

E valeu a crucificação de Geralda à beira mar? Em grande parte. Se Geralda interpretava mal a origem difusa de seus afetos na casa, ela conseguiu projetar a maior e mais verdadeira das interpretações: o gosto pela vida. Ora, interpretação verdadeira. Porque amor à vida é algo superestimado, por falta de opções mais claras. E Geralda demonstrou se condicionar a amar o que vivia, a reinventar o que viveu -- e vive -- pra se amar e tentar amar melhor o que e quem a circundava. Geralda Interpreta pra si e para os outros a paixão que cria pela vida. E acaba acreditando em sua interpretação, para sua felicidade, esta palavra tão estranhamente interpretada. Mesmo no outono de sua trajetória. Este outono da terceira idade que aponta para uma encruzilhada epifânica. A queda das paixões da juventude. Outono em que se aproveita melhor (para quem tem a sabedoria para tanto) aquilo que a vida resta a oferecer, sem grandes ilusões -- sabendo-se que a vida mesma é a mais sublime das criações. Uma ilusão concreta, tátil para seu escultor.

Geralda pouco ganhou de dinheiro, nada ganhou de prêmios. Ganha em experiência  e em afeto da parte do público que sabe ter a generosidade de gostar, absolver ou mesmo amar personagens ambíguos, para além da ambiguidade aparente; para o centro do melhor que um ser humano tem a oferecer, debaixo -- ou na superfície mesma -- de camadas de dúvidas de caráter.

A vitória pouco acrescenta ao vencedor. O reconhecimento adorna o ego, enche os bolsos, infla a vaidade. Desamadurece em grande parte dos casos. Cabe a Geralda saber converter sua morte na praia em ressurreição em águas mais profundas. Como fez o tal aparente derrotado crucificado há milênios. O exemplo está dado. E é bem simples em sua tragédia: amar suficientemente a vida a ponto de perceber uma bela razão para perdê-la. Boa morte, Geralda. Boa ressurreição, Geralda.