"Soberano" reforça preconceito que só elite torce para o São Paulo
A onda de filmes sobre times de futebol e seus feitos históricos reflete o desenvolvimento do marketing esportivo no Brasil. Um sinal positivo, diga-se, que mostra a existência de um mercado ampliado, com consumidores dispostos não apenas a adquirir camisas e outras quinquilharias, mas também lembranças menos tangíveis.
São filmes feitos, basicamente, para o mercado de DVD, destinados aos torcedores dos respectivos times homenageados. Quase todos, porém, têm sido submetidos a breves temporadas nos cinemas, abrindo-se assim à contemplação – e ao crivo – de um público mais amplo.
"Soberano – Seis Vezes São Paulo", que estreia nesta sexta-feira, é o mais recente de uma safra que já produziu homenagens ao Corinthians, Internacional e Grêmio, entre outros. O filme documenta os seis títulos nacionais que o clube conquistou (em 1977, 1986, 1991, 2006, 2007 e 2008) por meio de imagens de arquivo, depoimentos de torcedores e entrevistas com atletas que participaram dos campeonatos.
Os diretores Carlos Nader e Mauricio Arruda optam por uma narrativa convencional, capaz de entreter, divertir e emocionar o são-paulino. Nesse conjunto, não espanta a inclusão do apelativo depoimento de um jovem que mistura suas lembranças sobre o título de 1986 com o tratamento que sofria contra um câncer. "Devo muito ao São Paulo", diz ele, hoje, curado.
Causa, sim, estranheza em "Soberano" o mote escolhido pelos diretores, também autores do roteiro, para dar sentido e costurar a narrativa do filme. É o conceito de "hereditariedade". Desde a canção de abertura, composta por Nando Reis, até o final, reforça-se por meio de depoimentos a ideia de que a paixão pelo São Paulo é um sentimento herdado, que passa de pai para filho, de geração em geração.
Um depois do outro, os torcedores vão descrevendo a emoção de torcer para o mesmo time do pai e do avô e da alegria que sentem por transmitir este "legado" aos próprios filhos. Um torcedor negro reforça essa tese ao falar que, na Zona Leste, onde nasceu, "era minoria". E diz: "Eu fugi à regra".
A principal crítica que se faz ao São Paulo é justamente ao fato de ser um time "da elite", em oposição a dois times "do povo", o Corinthians e o Palmeiras. Não que seja verdade, mas é uma imagem cristalizada na cabeça do torcedor.
Na homenagem do Clube dos 13 ao presidente Lula, realizada no Corinthians, abordei o presidente do Palmeiras, Luiz Gonzaga Belluzzo. Perguntei se não era estranho para ele circular pelo salão nobre do maior rival. "Eu me sinto bem aqui. É uma coisa mais parecida com a gente", respondeu, numa alusão justamente a esta oposição entre "povo" e "elite".
O Estado de São Paulo, que batiza o nome do clube, orgulha-se do fato de ser formado por imigrantes de todos os cantos. Esta população é formada por gente que trouxe na bagagem a sua paixão por um time do local de origem, mas que viu seus filhos adotarem os clubes paulistas, incluindo o São Paulo, como de sua preferência.
Ao insistir na ideia de que torcer pelo São Paulo é um assunto de família, que se herda, "Soberano" está claramente reforçando um preconceito.
Em tempo: Duas visões diferentes da minha sobre "Soberano" podem ser encontradas aqui e aqui. Um álbum com 20 filmes sobre o universo do futebol pode ser visto aqui. O UOL Cinema também publicou uma entrevista com os diretores, que pode ser lida aqui.
O trailer do filme
[uolmais]http://mais.uol.com.br/view/6426416[/uolmais]
Sobre o autor
Contato: mauriciostycer@uol.com.br

















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