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Nássara: bamba do samba, gênio do traço e mestre na carioquice

Mauricio Stycer

10/01/2011 14h01

Homem de múltiplos talentos, Antonio Nássara é um desafio para os seus biógrafos. Como tratar do sujeito que compôs "Alá-la-ô", uma das marchinhas de Carnaval mais tocadas da história e, ao mesmo tempo, é considerado um dos maiores caricaturistas brasileiros?

Contemporâneo, amigo e parceiro de Noel Rosa, mas também de Mario Filho (irmão de Nelson Rodrigues), apenas para citar dois personagens exemplares, Nássara é protagonista privilegiado de três histórias com agá maiúsculo – do samba, da imprensa e da carioquice – na primeira metade do século 20.

Seu nome está associado a tantos feitos e a tantas pessoas diferentes que chega a confundir. Nássara, por exemplo, é autor do primeiro jingle radiofônico brasileiro, nos anos 30, e foi uma das estrelas do "Pasquim", no início da década de 70.

Compôs 232 músicas, especialmente sambas e marchas, gravados por Francisco Alves, Orlando Silva e Araci de Almeida, entre muitos outros bambas. Sua inesgotável produção gráfica apareceu em ícones da imprensa, como "Crítica", "Diretrizes" e "Cruzeiro", e parte dela hoje pertence ao acervo do Museu Nacional de Belas-Artes.

Talvez por sua produção se espalhar por campos tão diferentes, Nássara é menos reverenciado do que merecia. Ainda assim, já foi objeto de alguns estudos e livros.

O pesquisador Carlos Didier é o mais recente se debruçar sobre a vida e a carreira do artista, em "Nássara Passado a Limpo" (José Olympio Editora, 252 págs., R$ 35), que acaba de ser publicado. Seu livro acrescenta informações e histórias a outros dois títulos, hoje só encontrados em sebos – "Nássara – O perfeito fazedor de artes", de Isabel Lustosa, e "Nássara, desenhista", de Cássio Loredano.

Uma das novidades do livro de Didier é a revelação de que Nássara, filho de imigrantes sírio-libaneses, nasceu no dia 12 de novembro de 1909, um ano antes do que sempre afirmou (dado ainda não corrigido na Wikipédia).

Notável no livro de Isabel Lustosa, a simpatia e o bom humor de Nássara também impregnam a biografia escrita por Didier. Mais uma conversa do que um estudo, "Nássara Passado a Limpo" tenta apresentar, como diz Ruy Castro, "o homem da esquina, o completo carioca".

O livro abre o apetite do leitor, mas não preenche todas as lacunas. Há, por exemplo, poucos e pequenos registros de sua produção visual, o que obriga o interessado a recorrer à ótima coletânea organizada por Loredano em 1986 para entender o impacto da obra daquele que Millôr Fernandes definiu como "o Mondrian do portrait-charge".

É, de qualquer forma, um excelente aperitivo para os que ainda cantam, no Carnaval, "mas que calor, ô, ô, ô, ô, ô, ô", sem saber quem compôs essa divertida marchinha. Nássara morreu em dezembro de 1996.

Em tempo: As caricaturas de Getúlio Vargas e Jânio Quadros, além da capa do LP de Pixinguinha, foram reproduzidas do livro "Nássara, desenhista".

Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.