Tipos de leitor: Ubaldo, o Paranóico
Mauricio Stycer
05/04/2011 12h29
Eis um tipo resistente, difícil de ser convencido, esteja você falando de política ou futebol, desastres naturais ou acidentes do destino. Ele (ou ela) está sempre procurando sentidos ocultos nos textos, enxergando teorias da conspiração onde há apenas opinião. Sempre acha que, por trás do que lê, existem intenções disfarçadas, com propósitos não revelados.
Quem, como eu, escreve ou lê sobre televisão na internet, conhece Ubaldo, o Paranóico de longe. Ele é o sujeito que vê manipulação e segundas intenções em todos os textos. "Você é pago para falar mal da Globo", escreve ao ler alguma crítica negativa à líder de audiência. E acrescenta: "Nunca vi um texto seu falando bem da Globo".
Dias depois, ao trombar com algum texto elogioso a programa da emissora que ele julgava ser perseguida pelo blogueiro, muda de opinião. Radicalmente: "Você é pau mandado da Globo", grita.
Naturalmente que a paranóia de Ubaldo é democrática. Com frequência, ele vê perseguição a outras emissoras também. "A Globo te paga para falar mal da Record", escreve. "Por que você persegue o 'CQC'? Assiste outra coisa", propõe outro.
Ubaldo, o Paranóico, é parente do Maníaco da Censura, um tipo identificado e retratado com muita perspicácia por meu colega Leonardo Sakamoto. "O Maníaco é um leitor que se enxerga como vítima de um complô universal, pois acredita que escreveu um comentário revolucionário e que – céus! – foi limado pelo cretino do blogueiro", escreveu ele.
Além de ver tramóias nos textos do blogueiro, Ubaldo frequentemente reclama que seus comentários foram censurados. Quando localizo no blog o comentário que ele julgava suprimido, ele retorna com um pedido de desculpas, seguido de alguma nova estocada. "Pelo menos você não me censurou, mas esta sua perseguição ao Marcelo Tas está passando dos limites".
Semana passada, cai na besteira de misturar futebol e televisão num mesmo texto. Elogiei o "Globo Esporte" de 1º de Abril e a piada que fez sobre o título nunca alcançado da Libertadores pelo Corinthians. A conspiração contra o Timão foi o tema de inúmeros comentários, como este:
"Vejo que as regras de comentário só valem para corintianos. Os demais podem usar caixa alta, usar palavrões, insinuações falsas. É por esses tipos de imparcialidade que a imprensa brasileira é tida como sensacionalista e tendenciosa." É isso aí.
Contra a opinião de especialistas que entendiam, na época, que o regime militar iria abrandar a repressão e levar o país de volta à democracia, Ubaldo tinha medo de um retrocesso, achava que estava sendo vigiado e poderia ser preso e torturado.
Um resumo com os melhores desenhos de Henfil dedicados ao personagem pode ser visto no livro "A Volta de Ubaldo, o Paranóico" (Geração Editorial, 134 págs., R$ 32)
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Atualizado às 15h40
Sobre o autor
Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).
Contato: mauriciostycer@uol.com.br
Sobre o blog
Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.