Em crise, jornalismo da Record é usado pela Igreja Universal
Mauricio Stycer
16/11/2011 07h01
Vice-líder no horário, o "Jornal da Record" caiu para terceiro, superado pelo SBT, ou viu o concorrente empatar no Ibope alguns dias em novembro. A audiência média do principal noticiário da emissora em outubro foi de 6,7 pontos, a mais baixo no ano.
O programa já trocou de horário inúmeras vezes em 2011. Em julho, deixou de concorrer com o "Jornal Nacional" e passou a ser exibido às 19h40. As mudanças decorrentes da passagem-relâmpago de Datena pela emissora e dos Jogos Pan-Americanos cobraram um preço alto. Desde então, a sua audiência vem caindo. Durante o Pan, o JR foi exibido excepcionalmente às 18h e depois dos Jogos voltou ao horário do primeiro semestre, começando às 20h30.
No esforço de recuperar a audiência perdida, o noticiário está dando mais ênfase a assuntos de comportamento e saúde, em detrimento de reportagens mais aprofundadas ou de investigação.
O apelido maldoso deve-se ao fato de que, tocados de leve por um pastor durante os cultos, os fiéis desfalecem, como que por mágica.
Na prática, a reportagem foi um ataque impiedoso aos pastores que fazem apologia desta prática, com o objetivo de alertar eventuais fiéis de que o "cai-cai" é, na verdade, charlatanismo ou obra do demônio. Contrariando uma regra elementar do bom jornalismo, a Record não ouviu nenhuma voz em defesa dos religiosos atacados ao longo dos intermináveis 39 minutos da matéria.
Dentro da emissora, o ataque ao "cair no espírito", como também é conhecida a prática, foi visto como uma vitória de setores da Igreja Universal do Reino de Deus que defendem a utilização da Record no ataque aos adversários religiosos e, também, no esforço de recuperar o número de fiéis, que estaria em queda.
A reportagem exibida no "Domingo Espetacular", de fato, contraria a essência de todo discurso sempre defendido pelos principais nomes da emissora nos últimos anos, de que existe uma separação total entre a IURD e a Record.
Este tem sido o tom das raras manifestações públicas tanto de Edir Macedo, fundador da igreja e presidente da emissora, quanto de seus principais executivos, como Honorilton Gonçalves, vice-presidente artístico e de programação, e Douglas Tavolaro, vice-presidente de jornalismo.
Procurada para comentar a reportagem do "Domingo Espetacular" e a queda da audiência do "Jornal da Record", a emissora informou que a abordagem sobre o "cair no espírito" foi "jornalística" e que o telejornal sofre "oscilações" normais no Ibope, mas continua com vice-líder no horário.
Atualizado às 23h30 de 17/11/2011: Devido ao grande número de comentários publicados em curto intervalo de tempo, aprovei alguns que contrariam as regras deste blog, motivo pelo qual foram apagados hoje.
Sobre o autor
Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).
Contato: mauriciostycer@uol.com.br
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