Depoimento de Xuxa transforma espectador em psicólogo
Mauricio Stycer
21/05/2012 00h53
O relato sobre a proposta que teria recebido do empresário de Jackson é especialmente curioso. Xuxa foi muitas vezes comparada ao cantor americano por conta da estanha imagem que construiu, de uma vida sem amigos nem amores, protegida em uma "bolha", isolada do mundo real.
A entrevista ao "Fantástico", como tantas situações protagonizadas por Xuxa, foi um evento "controlado", ao longo do qual ela foi senhora da situação. Disse apenas o que quis, da forma que achou melhor. Isso incluiu, por exemplo, o fato de falar de Adriane Galisteu sem que o nome ou a imagem da "rival" aparecesse na edição ou, ainda, o fato de não mencionar o pai de sua filha.
Ao conhecer Senna e se encantar pelo piloto, Xuxa revelou ter pensado: "Um cara com grana que não vai querer a minha". Este mesmo pragmatismo aparece ao longo de quase todo o depoimento dado a Claudio Manoel.
Já ao descrever a sua atual carência afetiva e sexual, riu como se fosse uma criança. "Os hormônios", exclamou, sem saber se reclamava ou festejava do fato de sentir desejo.
Por fim, veio a parte barra pesada do depoimento. "Eu fui abusada", ela disse, com todas as letras. "Não foi uma pessoa, foram algumas pessoas que fizeram isso", continuou, antes de citar "o melhor amigo" do pai, "o cara que ia casar com a minha avó" e um professor da escola como autores de abusos que sofreu.
Por que revelar em rede nacional um trauma desta gravidade? Xuxa está engajada numa campanha contra o abuso de crianças e pode ter pensado que o seu depoimento ajudaria a tornar o tema menos tabu. É provável que isso até ocorra, mas acho que há formas e formas de fazer campanhas educativas.
O depoimento de Xuxa, creio, faz pensar basicamente sobre Xuxa. Transforma todos os espectadores em psicólogos de botequim. Somos obrigados, de uma hora para outra, a voltar a especular sobre a vida e a carreira da "rainha dos baixinhos" e sobre o seu comportamento em diferentes situações. O que é muito triste, enfim.
Em tempo: Um relato mais detalhado do depoimento pode ser lido aqui.
Sobre o autor
Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).
Contato: mauriciostycer@uol.com.br
Sobre o blog
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