Topo

“Além do Horizonte” pagou o preço de fugir do padrão de “novela das 7”

Mauricio Stycer

03/05/2014 05h01

alemdohorizontelililc

Os números são implacáveis – "Além do Horizonte" foi a novela das 7 com a mais baixa audiência no horário. O que me parece menos claro é o significado destes números. A novela foi um fracasso por que era ruim ou por que apresentou algo inesperado e indesejado pelo público deste horário?

Em alguns ambientes, esta discussão talvez não faça sentido. O que importa são os números. Entendo, porém, que o resultado de "Além do Horizonte" no Ibope merece uma reflexão menos simplista.

alemdohorizonteautoresPara começar, sugiro ao leitor um exercício fácil: lembrar de alguns títulos com qualidade muito inferior, mas que tiveram audiência maior que a da novela de Marcos Bernstein e Carlos Gregório. Vou evitar citar nomes aqui, para não ser desnecessariamente indelicado, mas tenho certeza que a tarefa não é difícil.

Acho que "Além do Horizonte" foi rejeitada por parte do público porque propôs uma narrativa diferente, uma história de mistério, ação e aventura, que exigia um tipo de atenção que não se dá normalmente às comédias românticas do horário.

Concordo com Bernstein (à esq. na foto acima) quando ele diz: "A gente provou que é possível fazer além da comédia. É mais uma alternativa para o horário. É bom tanto para autores, que podem criar em outro gênero, quanto para o público que tem uma alternância. Tem espaço para comédia, romance, aventura… É bom ter variedade".

alemdohorizontetapireDentro do que a novela se propôs, houve erros e acertos. O melhor, na minha opinião, foi mesmo a ideia de introduzir um tema misterioso, a tal comunidade onde seria possível encontrar a "felicidade", em torno do qual toda a trama girou.

Também gostei de ver a história dividida em três planos – o Rio, a pequena Tapiré e a comunidade – cada um com seus núcleos principais e histórias paralelas, mocinhos e vilões.

Por fim, vi como uma ousadia digna de elogio a proposta de escalar jovens atores, alguns com pouca experiência, para protagonizar a novela. É verdade que nem todos deram conta do recado, mas isso acontece também quando atores consagrados têm a mesma responsabilidade.

alemdohorizontemarcelopriinesThiago Rodrigues (William) começou bem e estava fazendo ótimo par com Juliana Paiva (Lili), mas a mudança na história acabou deixando o personagem dele sem graça. Vinicius Tardio (Rafa), a quem parecia destinado um papel importante, não ocupou este espaço.

Em uma trama paralela, Igor Angelkorte (Marcelo) e Laila Zaid (Priscila) injetaram humor da melhor qualidade à trama. As irmãs "artísticas", vividas por Luciana Paes (Ana Selma) e Mariana Xavier (Ana Rita), também tiveram grandes momentos de graça. Mariana Rios (Celina) mostrou talento, apesar das reviravoltas da personagem. E a novela ainda revelou um ator-mirim, o carismático JP Rufino (Nilson).

alemdohorizontehermesEntre os veteranos, a melhor surpresa foi Maria Luisa Mendonça, na pele da dondoca Inês. Antonio Calloni (LC) e Alexandre Nero (Hermes) foram vilões ambíguos, como se espera do tipo (uma pena a saída prematura do segundo, engolido pela areia movediça, no meio da trama).

Encerro repetindo algo que escrevi no início do ano. O investimento da Globo em uma novela "esquisita" como "Além do Horizonte" é apenas um exemplo de menor importância. Mas espero, em 2014, que a reação negativa não influencie outras decisões ousadas e necessárias, seja da própria emissora, seja das suas concorrentes.


Leia também
1. A novela é boa porque o Ibope subiu ou o Ibope subiu porque a novela é boa?
2. O que esperar de 2014
3. "Além do Horizonte" merece crédito pela coragem de fugir do padrão
4. "É possível fazer além da comédia", diz autor de "Além do Horizonte"
5. Nilson Xavier: "Além do Horizonte" ignorou Ibope e manteve essência até o fim

Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.