Encontro entre Silvio Santos e Edir Macedo sugere amizade que não existe
Mauricio Stycer
03/08/2015 09h01
Apresentado pela repórter Adriana Araujo como "um encontro de amigos", o "tour" de Silvio Santos pelo Templo de Salomão na companhia de Edir Macedo mostrou, mais uma vez, a admiração do dono do SBT pelo líder da Igreja Universal. Mas não pela Record.
Há muito anos, Silvio tem feito manifestações de respeito pele trabalho religioso e social de Macedo. Em fevereiro de 2014, questionado pelo repórter João Batista Jr., da "Veja São Paulo", se eram amigos, disse que "não", mas repetiu os elogios. "Acho que o Edir fez uma bela obra. Ele ajudou mesmo, tirou muita gente do álcool e das drogas. Pode ter defeitos, mas as qualidades dele são mais importantes."
Ao abrir a reportagem do "Domingo Espetacular" sobre a visita de Silvio Santos ao Templo de Salomão, Adriana Araujo disse: "O apresentador de milhões de fãs recebido pelo bispo de milhões de fieis. Como nunca vistos antes. O que eles têm a dizer um para o outro? E por que decidiram se encontrar?" Ou seja, a própria repórter frisou se tratar do encontro entre o dono de uma emissora de televisão e o líder de uma igreja.
Todas as referências de Macedo a Silvio foram de cunho religioso. Uma delas até um pouco agressiva: "Silvio, você não foi um sortudo.Você é fruto da promessa que Deus fez a Abraão. Eu vou abençoar aqueles que te abençoam. E vou amaldiçoar os que te amaldiçoam." A reportagem não mostrou o que Silvio respondeu.
Silvio, por sua parte, elogiou a igreja e o trabalho do bispo várias vezes: "Ser contra isso é um disparate", observou. "Foi uma iluminação de Deus", disse o dono do SBT sobre a ideia de construir o Templo de Salomão. Macedo respondeu, a certa altura: "Eu sou a prova viva de que Deus existe." Daquele seu jeitão, Silvio apenas disse: "Okay."
Em dois breves momentos da reportagem de 35 minutos que documentou a visita, Silvio tomou a iniciativa de se dirigir a Macedo como dono da Record. Na primeira vez, disse: "Todos deveríamos nos unir para que nós pudéssemos alcançar melhores resultados. Seria muito melhor do que um ficar se digladiando com o outro. Besteira isso". Edir apenas respondeu: "Ah, sim. Ah, sim."
Ambos também falaram rapidamente sobre a compra da Record, ocorrida em 1989. É um episódio rumoroso, a respeito do qual existem várias versões. Já tentei resumir o que Silvio, a família Machado de Carvalho e Macedo dizem sobre o assunto num texto no blog (leia aqui). Neste domingo, Silvio apresentou uma versão colorida ("eu fiz questão de vender", disse), bem diferente da que é relatada em três livros.
Record e SBT têm duelado de forma muito dura há mais de 15 anos. O último encontro entre os dois empresários havia ocorrido em 1998, justamente por conta da disputa entre as duas emissoras. Silvio tirou Ratinho da Record e foi ao encontro de Macedo negociar a multa rescisória. Não deve ter sido um encontro de amigos. "Fui pagar uma nota que fiquei devendo pra ele", contou neste domingo.
Em 2007, a Record superou, pela primeira vez, a rival na média geral de audiência, tornando-se vice-líder. Em 2014, o SBT recuperou a posição, empurrando a emissora de Macedo para o terceiro lugar.
Desde então, recuperar a vice-liderança tem sido uma obsessão para a Record. A emissora contratou novos apresentadores (Sabrina Sato), criou novos programas ("Domingo Show"), recontratou Gugu Liberato, investiu na sua primeira novela bíblica ("Os Dez Mandamentos"), mudou e cancelou atrações com baixo Ibope – até agora sem sucesso. A emissora ainda conta com duas armas poderosas para 2015 – a estreia de Xuxa e o reality "Cake Boss".
Em abril de 2014, a Record chegou a anunciar a contratação de Jean Paulo Campos, o menino que interpretava Cirilo na novela infantil "Carrossel". "A Record me roubou ele! Seu Edir, isso não é coisa que se faça", reclamou Silvio durante o seu programa (veja aqui). Dias depois, o ator foi convencido a ficar no SBT.
Neste domingo, Silvio deu uma mãozinha para Macedo. Com o encontro entre os dois, segundo dados prévios do Ibope, a Record registrou 17 pontos de média , contra 18 da Globo, que exibia o "Fantástico", e 8 do SBT , que apresentava o … "Programa Silvio Santos".
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Sobre o autor
Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).
Contato: mauriciostycer@uol.com.br
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