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Dos grandes narradores que admiro, nenhum grita

Mauricio Stycer

27/02/2016 04h01

Aprendi muito sobre futebol ouvindo jogos narrados pelo rádio. Nos anos 70, os principais narradores no Rio eram Jorge Curi (1920-1985) e Waldir Amaral (1926-1997).

O primeiro era dono do grito de gol mais potente e longo que já ouvi (ainda mais se fosse gol do Flamengo). Mas só gritava nessa hora. O segundo era uma espécie de narrador-cronista, descrevia uma partida como se estivesse escrevendo um texto (o autor do gol era um "indivíduo competente").

Na televisão, o primeiro narrador a me marcar foi Geraldo José de Almeida (1919-1976). Vibrava a cada jogada bonita: "Linda! Linda! Linda". E dividia com o espectador as suas surpresas: "Que que é isso, minha gente?"

É verdade que o futebol mais cadenciado nos anos 70 permitia aos narradores respirar um pouco mais, o que deixava as narrações mais elegantes, talvez. Isso mudou à medida em que o futebol foi ficando mais veloz, e os narradores obrigados a falar mais palavras por minutos.

Ainda assim, grandes narradores que vieram depois, como José Carlos Araujo e Osmar Santos, por exemplo, acrescentaram velocidade à narração, mas raramente recorreram à gritaria. Outros, como Januário de Oliveira ("Ta lá um corpo estendido no chão") e Silvio Luiz ("Pelas barbas do profeta"), introduziram humor e picardia aos jogos mais aborrecidos.

Isso para não falar de Galvão Bueno, que se intitula um "vendedor de emoções". O principal narrador da Globo há quase três décadas é capaz de transformar o jogo mais chato do mundo numa transmissão divertida. Sem gritar.


Faço este longo preâmbulo para falar de Andre Henning (foto). Só fui apresentado às suas narrações em 2016, quando o Esporte Interativo passou a fazer parte da grade da NET. Estou dez anos atrasado e peço desculpas pela minha falha.

O narrador do EI parece trabalhar sentado em uma cadeira elétrica. Ele grita em toda e qualquer situação. "Cartão amarelo!!!!!!!!!!!! David Luiz!!!!", explode Henning. "Lateral para o Chelsea!!!!!!!!!!!!!!", comemora o narrador. E assim vai, o jogo inteiro, gritando emocionado ao descrever enfiadas de bola mal-sucedidas, chutes para fora e faltas, violentas ou não.

Em entrevista ao UOL Esporte, publicada horas antes do primeiro jogo das oitavas-de-final da Liga dos Campeões da Europa, Henning afirmou: "Posso garantir que aqui não tem 'forçação de barra' na dose da emoção. A gente narra, transmite aquilo que realmente estamos sentindo". Não é o que se ouve durante as suas transmissões.

Divido os narradores em dois times, os talentosos e os que gritam. Neste segundo time, me sinto obrigado a dizer que não conhecia ninguém com a força de André Henning.

Este texto foi publicado originalmente no blog UOL Esporte Vê TV.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.


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