Globo mudou “Anos Rebeldes” por supostos excessos da temática política
Mauricio Stycer
12/05/2017 04h01
Disponível desde esta quinta-feira (11) para assinantes da GloboPlay, a minissérie "Anos Rebeldes" é uma das raras obras de teledramaturgia que aborda com alguma profundidade o que ocorreu durante ditadura militar instaurada no Brasil entre 1964 e 1985.
Escrita por Gilberto Braga, com a colaboração de Sérgio Marques, Ricardo Linhares e Ângela Carneiro, foi ao ar, em 20 episódios, entre junho e agosto de 1992, durante o governo Collor.
No livro "Anos Rebeldes" (Editora Rocco, 2010), Braga conta que Roberto Marinho designou um auxiliar, o jornalista Claudio Mello e Souza, para ler o roteiro previamente. O parecer foi de que o autor estava "carregando demais nas tintas políticas", o que levou a mudanças no texto. Conta ele:
A Globo decidiu oferecer "Anos Rebeldes" em seu aplicativo online, não por acaso, no momento em que está exibindo, no horário das 23h, "Os Dias Eram Assim". Trata-se de uma novela ambientada, até o momento, justamente neste período de maior recrudescimento do regime militar.
As notícias publicadas a respeito desta pesquisa podem levar à conclusão de que a novela vai mal porque o público é desinformado ou não tem memória sobre um período histórico do país.
Na minha opinião, já defendida em outras ocasiões, o público pode estar tendo dificuldades com o tema em "Os Dias Eram Assim" porque ele está sendo mal apresentado – a novela é simplista, maniqueísta e hesitante ao falar deste período sombrio.
Também não é possível ignorar que a Globo, além de ter apoiado o regime militar desde o início, sempre vacilou diante da necessidade de falar com clareza sobre o período. Como relata Gilberto Braga no livro sobre "Anos Rebeldes", esta dificuldade se estendeu ao período da redemocratização – a minissérie foi ao ar sete anos depois do fim da ditadura.
É injusto, por isso, colocar na conta do público, na sua suposta "falta de memória", a dificuldade de compreender "Os Dias Eram Assim". Se há alguma culpa aí ela é não apenas de quem criou a novela, como das emissoras, Globo incluída, que mal abordam esse tema.
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Sobre o autor
Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).
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