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Filme sobre Edir poupa a “inimiga” Globo e limita ataque à Igreja Católica

Mauricio Stycer

29/03/2018 19h10


Lançado nesta quinta-feira (29), "Nada a Perder" descreve a trajetória de Edir Macedo segundo os relatos do próprio bispo. É, por assim dizer, uma cineautobiografia sobre o fundador da Igreja Universal e proprietário da RecordTV. Ou, como disse o crítico Roberto Sadowski, "uma peça de propaganda" da igreja.

Com direção de Alexandre Avancini, o mesmo da novela e do filme "Os Dez Mandamentos", o longa-metragem tem roteiro inspirado, basicamente, na autobiografia "Nada a Perder", publicada em três volumes, entre 2012 e 14, e na biografia "O Bispo" (2007), de Douglas Tavolaro, com reportagem de Christina Lemos.

O filme vai da infância em Rio das Flores (RJ) até 1995, quando Macedo, em Nova York, é avisado sobre a crise causada pelas imagens do bispo Sérgio von Helder chutando uma imagem de Nossa Senhora de Aparecida. Um aviso na tela informa que o episódio será descrito na segunda parte do filme.

O subtítulo, "Contra tudo. Por Todos", reproduz de forma apropriada o tema principal do filme – as dificuldades e agruras de Macedo em toda a sua vida. Ainda criança, sofre bullying dos colegas por causa de uma má formação nas mãos. O primeiro pastor que admira não dá valor ao seu esforço e o trata com preconceito de classe. R.R. Soares, casado com uma irmã de Macedo, despreza o seu interesse em pregar. A segunda filha nasce com um problema no céu da boca. Pior de tudo, Macedo é preso, acusado de charlatanismo, em 1992 e passa 11 dias na cadeia.

Este é o episódio central do filme – a cena da prisão abre "Nada a Perder" e é retomada na parte final. O inimigo nomeado de forma explícita por Macedo em todos os seus livros e em "O Bispo", é a Igreja Católica, apontada como responsável pela prisão. Um religioso, com a cruz pendurada, articula a detenção e assiste ao depoimento do bispo à Justiça.

No livro de Douglas Tavolaro, Macedo também é explicito em relação à Globo. Falando do episódio da prisão, ele diz: "Você quer saber a verdade? Eles deram vários tiros no pé. A situação se reverteu a meu favor, para frustração de meus inimigos".

– Inimigos? – pergunta o autor.
– Eu tinha e tenho muitos inimigos.
– Quem eram e quem são esses inimigos?
– Quem eram? O clero católico, a Rede Globo e gente poderosa usada por eles. Eu até entendo tantos ataques, realmente há motivos para isso. A Igreja Universal incomoda, a Record incomoda. Nós assustamos. Nosso crescimento assustou muita gente na época da minha prisão e continua assustando até hoje.

No filme, porém, não há menção alguma à Globo. Macedo fala genericamente da oposição que sofre dos meios de comunicação e da imprensa, mas não cita nenhuma vez o seu "inimigo". A Paris Filmes, produtora de "Nada a Perder", inclusive, comprou espaço publicitário na Globo para promover o filme.

É possível que a emissora carioca apareça de forma mais explícita na segunda parte. Além do episódio do "chute na santa", é em 1995 que a Globo exibe a minissérie "Decadência", de Dias Gomes, que muita gente enxergou como inspirada na Igreja Universal. Também foi em 95 que o "Jornal Nacional" exibiu um famoso vídeo no qual Macedo aparece ensinando outros bispos da igreja a pedirem dinheiro aos fieis.

Os únicos empresários de comunicação citados no filme são Silvio Santos e Paulo Machado de Carvalho, então donos da Record. Uma cena de "Nada a Perder" mostra Macedo negociando a compra da emissora com Silvio Santos – o bispo está na reunião disfarçado como motorista do seu representante e, no esforço de destravar o negócio, resolve revelar a sua verdadeira identidade.

Ainda sobre "Nada a Perder", é justo registrar que se trata de uma produção caprichada, com reconstituição de época (anos 1970 e 80) muito bem feita e um ator, Petrônio Gontijo, com excelente desempenho vivendo o protagonista.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

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