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Domingão errou ao exibir fala de Faustão sem contexto; explicação desagrada

Mauricio Stycer

07/01/2019 23h49


Ouvindo o polêmico desabafo de Fausto Silva no último domingo (06) no contexto de tudo que ele disse em 2018, faz sentido imaginar que a crítica aos políticos era genérica, como tantas outras que fez. Mas no Brasil atual, tão polarizado, cada pessoa ouve o que quer e interpreta como bem entende.

O problema foi a decisão de colocar o apresentador esbravejando contra a classe política no primeiro programa exibido em 2019, seis dias depois da posse de um novo presidente, num cenário político completamente diferente. É compreensível que a fala tenha gerado tantos ruídos.

Fausto Silva passou o ano de 2018 encarnando o papel do "brasileiro revoltado com tudo isso que está aí". Um domingo atrás do outro, reclamou dos políticos, da corrupção, da incompetência, da desunião do país, da violência urbana, da baixa qualidade da escola pública, do excesso de impostos, dos haters da internet…

Até do jingle de fim de ano da Globo ele reclamou. "Eu não canto mais essa porra de 'é um novo dia!' Aqui na Globo não canto mais. Não é um novo dia porra nenhuma!"

Sem dar nomes aos bois, mas mandando indiretas bem claras a quem estava em Brasília, Faustão disparou petardos como esse: "O Brasil é o único lugar em que o governo não faz nada por você. Ao contrário, ele rouba você!"

Em março do ano passado, numa rara ocasião, o seu recado foi mais específico e dirigido à comunicação do governo Temer. Ele chamou de "imbecis" os responsáveis pela área: "Como o poder público é incompetente e corrupto ele não passa ao público, ele não sabe comunicar, nem mesmo esta reforma da Previdência, que é necessária, eles são tão imbecis que não sabem comunicar".

No desabafo exibido no programa neste primeiro domingo de 2019, ele voltou a usar esta palavra ("imbecil"), mas dirigida a alguém "que está lá e não deveria estar". Disse ele: "Na hora do Carnaval e da seleção, o brasileiro (e nós sabemos muito bem) é um povo que tem união, tem solidariedade, tem uma integração. Por que isso não acontece nas coisas sérias? Lutar por educação, saúde pública, contra a corrupção, contra a incompetência. O imbecil que está lá, e não deveria estar, pode até ser honesto, mas é um idiota que está ferrando com todo mundo".

Quem é este imbecil? Apenas seis dias depois da posse de Jair Bolsonaro, o desabafo de Faustão foi entendido por muita gente como uma crítica ao novo presidente. Essa interpretação gerou dois tipos de reação. De um lado, o apresentador foi repudiado, com veemência, por apoiadores de Bolsonaro e, de outro, festejado por críticos do capitão reformado.

Os espectadores, tanto de um grupo quanto do outro, não sabiam que o programa havia sido gravado previamente. Segundo a jornalista Cristina Padiglione, a gravação ocorreu em novembro de 2018.

A reação aos comentários de Faustão foi tão forte que o apresentador julgou necessário nesta segunda-feira (07) gravar um vídeo no exterior, onde passa as férias, e esclarecer que estava se referindo genericamente aos políticos.

Divulgado pelo colunista Flavio Ricco, o vídeo diz: "O programa de domingo passado foi gravado. Ainda assim, em nenhum momento eu falei a respeito do atual presidente, muito menos dos eleitores, no termo 'imbecil'. Quando usei a palavra, usei para explicar que muitas vezes o político imbecil, que não está preparado pra ser eleito e nem sabe porque está lá, ele acaba entrando nessa onda da vaidade e esquece dos problemas do país."

No Twitter, a reação ao vídeo de Faustão não foi boa. Apoiadores de Bolsonaro não se convenceram com as explicações e continuaram ofendendo o apresentador. Já os críticos do presidente, que haviam entendido o desabafo de domingo como dirigido a Bolsonaro, manifestaram decepção com o esclarecimento.

Em resumo, a solução encontrada por Faustão para se explicar não foi bem-sucedida neste primeiro momento.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

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Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.