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Relembre os travestis e transexuais das novelas

Nilson Xavier

22/02/2012 12h53

Esta semana o travesti da novela Aquele Beijo, Ana Girafa, vivido pelo ator Luís Salém, descobriu suas origens: Maruschka (Marília Pêra) é a sua mãe, que o entregou a um orfanato quando ele nasceu. Esta revelação trouxe novas emoções à novela das sete, já que Maruschka repudia o filho, a quem chegou a chamar de "aberração", e Ana Girafa vai lutar para ser reconhecido como filho da megera.

Aproveitando o destaque atual de Ana Girafa em Aquele Beijo, vamos relembrar os travestidos que se destacaram nas novelas.


O primeiro ator a se travestir para uma novela foi Ziembinski em O Bofe (Globo, 1972-1973), novela de Bráulio Pedroso. Neste caso, o ator se vestiu de mulher para interpretar uma senhora solitária, a velha Stanislava.

Já na trama de O Grito (1975-1976), de Jorge Andrade, o personagem Agenor, vivido por Rúbens de Falco, era um homem angustiado com um segredo: durante o dia era um sério executivo e à noite se vestia de mulher para perambular pela noite paulistana.

Em 1977, na novela Espelho Mágico, de Lauro César Muniz, pela primeira vez um travesti de verdade ganhou um papel numa novela: Cláudia Celeste era uma corista do teatro de revista de Carijó (Lima Duarte) que ensinava coreografias à personagem de Sônia Braga. Mas Cláudia Celeste entrou para o elenco da novela sem que Daniel Filho (o diretor) soubesse de que se tratava de um travesti – na época do Regime Militar, os travestis eram proibidos de aparecer na televisão. Descoberto, o travesti teve que sair de cena. Mas Cláudia Celeste voltaria às novelas em 1988, em Olho por Olho – novela de José Louzeiro,da Manchete -, e dessa vez sem esconder sua identidade e com um papel fixo: o travesti Dinorá.

Sérgio Mamberti viveu em Dinheiro Vivo, trama de Mário Prata, da Tupi (1979), um personagem inusitado: Dr. Pacheco, cujo segredo era um santuário em homenagem à estrela do cinema Marilyn Monroe. Na trama, após a morte de sua esposa, Pacheco não conseguiu mais se relacionar com outras mulheres, pois em todas via a figura de Marilyn Monroe. O Dr. Pacheco travestia-se de Marilyn para cantar e dançar como se fosse a estrela norte-americana.


Ney Latorraca viveu vários personagens em Um Sonho a Mais (1985), escrita por Daniel Más e Lauro César Muniz. Volpone voltava ao Brasil para provar sua inocência à justiça e se escondia na pele de vários tipos, entre eles, a secretária Anabela Freire, uma personagem que cresceu na história e ganhou duas "primas": Florisbela e Clarabela (Marco Nanini e Antônio Pedro). A novela também contou com a participação da sexóloga Olga Del Volga – criação de Patrício Bisso. Mas os personagens masculinos travestidos de mulheres chocaram a censura da Nova República. A Globo foi orientada a reduzir as aparições de Anabela na novela. Pior para suas comparsas, Florisbela e Clarabela, que tiveram que sair da trama. Mesmo com a polêmica dos personagens travestidos, aconteceu na novela a primeira bitoca entre dois homens na nossa teledramaturgia, na cena do casamento entre Anabela e Pedro Ernesto (Carlos Kroeber).

A participação especial de Rogéria em Tieta (1989-1990) movimentou a trama da novela de Aguinaldo Silva. Os homens de Santana do Agreste se encantaram pela amiga de Tieta (Betty Faria), que a visitava na cidade. Até descobrirem que Ninete se chamava na verdade Valdemar!


Silvio de Abreu ressuscitou Dona Armênia (Aracy Balabanain) e "seus três filhinhas" Geraldo, Gerson e Gino (Marcello Novaes, Gerson Brenner e Jandir Ferrari) na novela Deus Nos Acuda (1992-1993). Os personagens haviam feito sucesso na trama anterior do autor, Rainha da Sucata (1990). Mas, para desespero de Dona Armênia, o caçula Gino voltou de uma viagem da Europa como Gina e confundiu os marmanjos da novela.

A primeira vez que um travesti teve uma abordagem mais séria em horário nobre global foi em Explode Coração (1995), de Glória Perez. Na trama, o ator Floriano Peixoto – em sua estreia em novelas – encarnou a figura de Sarita Witt, que se vestia, falava e agia como mulher, e à noite ainda dava shows performáticos.

Em 1998 foi a vez de Matheus Nachtergaele encarnar um travesti na TV: Cintura Fina, amigo de Hilda Furacão, na minissérie de Glória Perez. Apesar da aparência frágil, Cintura era bom de briga e não levava desaforo para casa.

O travesti Ivone Shirley (Hairton Júnior), de Uga Uga (2000-2001), novela de Carlos Lombardi, ganhava a vida rodando bolsinha. Sua amiga Madá (Beth Lamas) – mulher – era sua parceira de rua. Curiosamente, Madá se passava por travesti por acreditar que assim era mais fácil conseguir clientes.

Em As Filhas da Mãe (2001), de Silvio de Abreu, Cláudia Raia viveu uma personagem inusitada: Ramona – que um dia fora Ramon -, a primeira transexual das novelas. Depois de anos fora do Brasil, o filho de Lulu de Luxemburgo (Fernanda Montenegro) retornou ao país com outro sexo, para o espanto da família. Ramona ainda enlouquecia a cabeça de Leonardo Brandão (Alexandre Borges) que era apaixonado pela moça mas não aceitava o fato de que um dia ela havia sido um homem.

Entre 2003 e 2004, Bruno Garcia, Lúcio Mauro Filho, Lázaro Ramos e Wagner Moura se revezaram em vários personagens femininos na série Sexo Frágil, fazendo graça com a diferença entre os sexos.


Walcyr Carrasco apresentou em Chocolate com Pimenta (2003-2004) um personagem nunca antes pensado em novelas: Kayky Brito viveu Bernadete, um menino que foi criado como menina e não sabia disso. A cena em que alguns personagens olham por debaixo da saia de Bernadete e descobrem que "ela" era "ele", foi uma das sequências mais hilárias da novela.

Em 2005 foi ao ar o primeiro caso de cross-dressing em novelas. O termo é usado para designar pessoas que se vestem com roupas do sexo oposto independente da orientação sexual. Dona Roma – Miguel Magno em A Lua Me Disse,de Miguel Falabella – era a personagem de Amoroso Valentim, dono de uma pensão, que se vestia como mulher e era aceito por todos como tal.


Outro cross-dresser das novelas foi Orã, personagem de Luís Mello em Cobras e Lagartos (2006), de João Emanuel Carneiro. Apesar de inicialmente casado com Silvana (Totia Meirelles), ele se escondia na pele da espanhola Conchita, mas era apaixonado pela mulher e pela família.

Em Os Ricos Também Choram, novela do SBT, de 2005, o ator Celso Bernini viveu o trambiqueiro Hugo, que se vestia de mulher e encarnava Josefina para fugir das pessoas que enganava.


Entrecho semelhante tinha a trama de Bang Bang (2005-2006), de Mário Prata. Para fugir da justiça, os bandidos Billy the Kid (Evandro Mesquita) e Jesse James (Kadu Moliterno) instalaram-se na pequena cidade de Albuquerque disfarçados das irmãs solteironas Henaide e Denaide. Donas da pensão da cidade, ninguém desconfiava que elas fossem os famosos foras da lei. Até a chegada de Calamity Jane (Betty Lago), também procurada por seus crimes, que se hospedou na pensão sob a identidade do forasteiro Mike.

Na temporada de 2006 de Malhação, foi a vez de Bernardo Mendes se travestir. Na trama, seu personagem, Bodão, assumiu a identidade de Ivana para participar de um concurso de culinária. Já no final da temporada de 2004 de Malhação, Cabeção (Serginho Hondjakoff) se transformou em Verônica, uma "menina" que chegou ao Múltipla Escolha para animar o tristonho Rafa (Ícaro Silva).

Marmanjões que fogem da lei escondendo-se por trás de vestidos, perucas, maquiagem, salto alto e seios postiços, também é uma especialidade de Walcyr Carrasco. Em Sete Pecados (2007), o mordomo Antero (Marcelo Médici) personificou a recatada Zizi, entre outros disfarces. Da mesma forma, Elcio (Otaviano Costa) virou Elaine, a Pirulitona de Morde e Assopra (2011), e confundiu a cabeça dos homens da cidadezinha de Preciosa.

Em outra novela de Carrasco, Caras e Bocas (2009), Fabiano (Fábio Lago), travestido de mulata e enganando a todos, participou de um concurso de dança e foi eleito Rainha do Axé.

Na trama de Beleza Pura (2008) – novela de Andrea Maltarolli -, o químico Mateus (Rodrigo Veronesse) foi dado como morto deixando viúva a mulher Helena (Mônica Martelli). Para se manter, ela passou a usar a identidade do falecido marido, se passando por ele, trajando-se como homem. Mas Mateus não havia morrido e retornou. Para ajudar a mulher, que poderia ser processada por crime de falsidade ideológica – Mateus passou então a se vestir de mulher e assumiu a identidade de Tânia.

Em 2009, o SBT contratou um transexual, Fabianna Brazil, para sua novela Vende-se um Véu de Noiva, escrita por íris Abravanel. Na trama, Fabianna viveu o travesti Andressa Carla, pago pela vilã Eunice Baronese (Elaine Cristina) para desmoralizar Homero (Marcos Winter).

A trama de Vidas em Jogo – novela da Record, de Cristianne Fridman, atualmente no ar – teve uma reviravolta com a revelação de que Augusta (Denise Del Vecchio) na verdade era um transexual, o que revoltou seu filho Raimundo (Rômulo Arantes Neto).Recentemente, o personagem acabou misteriosamente assassinado na novela.

Em O Brado Retumbante, minissérie de Euclydes Marinho apresentada em janeiro, o presidente Paulo Ventura (Domingos Montagner) descobriu que seu filho Júlio (Murilo Armacollo) havia se transformado em Julie após uma cirurgia no exterior. Julie estava no Brasil para trocar de nome em seus documentos e sua chegada gerou conflitos, sofrimento e até violência.

Além dos casos citados acima, outras mulheres travestidas de homem também já fizeram sucesso em nossas novelas: Gloria Menezes em Almas de Pedra, Wanda Stephania em Cavalo Amarelo, Bianca Rinaldi em Pequena Travessa, Myrian Freeland em Essas Mulheres, Daniela Récco em Três Irmãs, Nathalia Dill em Cordel Encantado, Bruna Lombardi na minissérie Grande Sertão: Veredas, entre outras.


E a trama de Fina Estampa também apresenta um transexual: Fabrícia (personagem de Luciana Paes), uma das maridas de aluguel que trabalham para Griselda (Lília Cabral). Ela é descoberta e revela estar na fila do SUS esperando para ser operada e, enquanto isso, toma hormônios.

Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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