“Aquele Beijo” termina como começou: morna mas irônica
Miguel Falabella nos brindou em Aquele Beijo com uma trama de humor espirituoso e inteligente, típico de seu universo, floreado com uma narração sempre inspirada. Mas faltou à novela uma história central empolgante, que prendesse o público à frente da TV diariamente e o fizesse torcer pelos personagens centrais. Foram as tramas paralelas, recheadas de bons personagens secundários, que fizeram Aquele Beijo. A audiência respondeu à história morna: uma média final, arredondada, de 25 pontos – inferior aos 30 alcançados pelas duas últimas novelas do horário, Morde e Assopra e Ti-Ti-Ti.
As idas e vindas do quadrilátero Rubinho-Cláudia-Vicente-Lucena (Victor Pecoraro, Giovanna Antonelli, Ricardo Pereira e Grazzi Massafera) não empolgava e foi se esvaindo ao longo da novela. Por um momento, sentimos que a o casal romântico central era Alberto e Sarita (Herson Capri e Sheron Menezes), tendo Maruschka como a antagonista vilã. De todos esses personagens citados, o único que chamou a atenção foi Maruschka Lemos de Sá, interpretada por uma Marília Pêra sempre bem aproveitada e valorizada no texto afiado de Falabella.
O autor havia afirmado que Aquele Beijo era uma novela sobre o preconceito. E Falabella usou de ironia para tratar do preconceito. O preconceito contra os pobres, através do núcleo da comunidade do Covil do Bagre – chamada pejorativamente de "favela" várias vezes ao longo da história. O preconceito contra o gay, na figura da travesti Ana Girafa (Luís Salém). O preconceito contra os gordos – mostrado sob a ótica do humor -, através do núcleo de Olavo e Marieta (Ernani Moraes e Renata Celidônio), com grande destaque para Priscila Marinho, a Chocotona. O preconceito contra os nordestinos – também sob uma ótica inversa: Felizardo (Diogo Vilela) era um patrão tirano com seus funcionários – destaque para a atriz Lana Guelero, a Raimundinha. O preconceito contra o negro, através do núcleo da família de Deusa (Zezeh Barbosa), que de prostituta se tornou uma nobre francesa.
As tramas paralelas engoliram a desinteressante trama central e, através delas, Falabella prestou uma homenagem ao gênero Telenovela. Mãe Iara (Claudia Jimenez) dizia encarnar o espírito de uma criança mexicana, a partir do momento em que sua mãe foi morta quando um ônibus adentrou a sala onde ela estava assistindo a uma novela mexicana. Mirta (Jacqueline Laurence) não era vilã, mas usava um tapa-olho combinando com a roupa tal qual uma vilã de folhetim mexicano. E a abertura apresentou várias cenas de famosos beijos de nossas telenovelas. Os beijos alternavam de tempos em tempos e, no total, foram quatro mudanças na abertura. Apenas lamenta-se que este recurso tenha sido abandonado a partir de janeiro deste ano.
Como rezaria o atual código da Classificação Indicativa, Ana Girafa, a travesti, não teve um entrecho amoroso e ficou sem par romântico no final. Mas seria uma "ironia falabeliana" e tanto se houvesse um beijo entre Ana Girafa e outro homem em plena novela da sete! Foi também por causa do horário da novela que o fim de Grace Kelly (Leilah Moreno) – que se tornara prostituta – foi anunciado na narração do autor desta forma: "morreu aos 32 anos de causas naturais, enterrada como indigente". Um eufemismo irônico do autor.
O último capítulo foi bonito, mas sem grandes reviravoltas na trama – "morno", como foi a novela. Falabella até brincou com seu elenco em cena, sentado num trono indiano comandando a dança de seus personagens – que lembrou Bollywood ou a novela Caminho das Índias – como uma divindade que tem poder sobre suas criaturas, como se comandasse marionetes com cordas.
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