Com trama central morna, “Em Família” se destaca com as histórias paralelas
Vejo algumas semelhanças entre "Em Família" e "Mulheres Apaixonadas", novela também de Manoel Carlos, escrita em 2003. Pelo menos no ponto em que está – com pouco mais de um mês no ar -, "Em Família" é um folhetim de tipos humanos, em detrimento a uma história central forte. Explico melhor tomando "Mulheres Apaixonadas" como exemplo. Nesta novela, Maneco estruturou-se a partir de uma trama central frágil – a que envolvia Helena (Christiane Torloni), sua relação com o marido Téo (Tony Ramos) e o retorno de uma antiga paixão, César (José Mayer). Também em "Em Família", a atual Helena (Júlia Lemmertz) vê ressurgir um amor do passado, Laerte (Gabriel Braga Nunes), formando um triângulo com seu marido Virgílio (Humberto Martins). A diferença é que, a princípio, a presença de Laerte incomoda Helena, enquanto que a Helena de 2003 se sentia totalmente inebriada com a aparição de César.
Todavia, muito mais do que essa pequena semelhança entre suas tramas centrais, está o foco nas histórias paralelas e seus tipos humanos muito ricos. "Mulheres Apaixonadas" foi uma novela que valorizou as tramas que circundavam o núcleo principal, de Helena. Em vários momentos, o autor deu maior ênfase aos outros núcleos da novela, que acabaram despertando maior interesse no público do que a própria história da protagonista. O principal motivo talvez fosse a ótima construção de personagens variados e ricos em dramas em que o público se identificava mais.
E foram muitos os tipos de "Mulheres Apaixonadas" que fizeram o público esquecer Helena: a professora Raquel (Helena Ranaldi), que apanhava de raquete do ex-parceiro Marcos (Dan Stulbach); a neurótica Heloísa (Giulia Gam), inconformada com a separação do marido Sérgio (Marcelo Antony); a garota Dóris (Regiane Alves), que maltratava os avós; o drama de Hilda (Maria Padilha), diagnosticada com um câncer de mama; o drama da alcoólatra Santana (Vera Holtz); as dificuldades de Fernanda (Vanessa Gerbelli) em criar a pequena Salete (Bruna Marquezine), filha que teve com Téo; Lorena (Susana Vieira), uma mulher madura que se apaixona por um rapaz bem mais jovem (Rafael Calomeni); o amor lésbico juvenil de Clara (Alinne Moraes) e Rafaela (Paula Picarelli); o amor impossível de Stella (Lavínia Vlasak) por um padre, Pedro (Nicola Siri); etc.
Talvez seja cedo para fazer esse tipo de avaliação, mas vejo a trama principal de "Em Família" ainda muito morna, ou frágil – pelo menos no que tange o interesse do público pela história de Helena (Júlia Lemmertz). O que se sobressai na novela – por enquanto – são alguns poucos personagens secundários carismáticos e seus dramas paralelos. Atualmente, afora o interesse amoroso da fotógrafa Marina (Tainá Muller) por Clara (Giovanna Antonelli), estão em voga três personagens femininas que prometem movimentar "Em Família": Branca (Ângela Vieira), Shirley (Vivianne Pasmanter) e Juliana (Vanessa Gerbelli).
E não é por acaso que o texto de Maneco é mais afiado justamente nas bocas delas – principalmente as espirituosas Branca e Shirley. Quando aparecem na tela, parece que "Em Família" desperta de um sono letárgico. Com certeza, podem render muito ainda. Bem mais do que meras mulheres apaixonadas, Juliana, Branca e Shirley carregam características de outras personagens de Maneco que ainda povoam a memória do público: Heloísa/Giulia Gam de "Mulheres Apaixonadas", Sheyla/Lília Cabral de "História de Amor", Branca/Susana Vieira de "Por Amor", Laura/Vivianne Pasmanter de "Por Amor", Débora/Vivianne Pasmanter de "Felicidade", Clara/Regiane Alves de "Laços de Família". Mulheres apaixonadas com uma ponta de desequilíbrio emocional sempre rendem dramas movimentados e alguns barracos.
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