“O Rebu” não agradou a todos, mas trouxe prestígio à Globo
Assim como em sua primeira versão (em 1974), a novela "O Rebu" não foi um sucesso popular. E o motivo pode ter sido o mesmo: causou confusão no público, muito acostumado às tramas mastigadinhas das novelas convencionais e alheio a histórias policiais mais elaboradas. A narrativa não linear requer atenção redobrada. Os autores (George Moura e Sérgio Goldenberg) contavam com o fato de o telespectador atual estar familiarizado com filmes e séries americanas que dispensam a linearidade temporal dos acontecimentos.
Talvez, o formato telenovela, para este tipo de narrativa, não tenha funcionado. Depois de seus 35 capítulos, concluímos que "O Rebu" poderia ter sido ainda mais enxuta (na novela original de Bráulio Pedroso, o mistério foi contado em 112 capítulos). A grade variável também prejudicou: além de pular um dia da semana (quarta-feira não havia exibição), a trama começava mais cedo às segundas. Para o público tradicional (para o qual a medição de audiência interessa), novela é hábito: mais fácil fidelizar se estiver em uma grade horizontal (todos os dias no mesmo horário). Por esses motivos, a história de "O Rebu" pode ser melhor assimilada se acompanhada pelo DVD (ou outro meio) à hora que se quer.
O ápice da confusão foi o telespectador perguntar por que, depois de dois meses de novela, os personagens não trocavam de roupa. Ou afirmar que "perdeu o fio da meada da história" após ter deixado de assistir algum capítulo – como que para justificar a falta de entendimento. "O Rebu" também perdeu muito de seu charme ao fazer da festa da trama um mero coadjuvante. Não era o que vendiam as chamadas. Teria sido um apelo a mais se a maior parte da ação tivesse acontecido durante essa festa.
Ainda: diferente da novela de 1974, na qual, além do "quem matou", se perguntava também "quem morreu", a versão de 2014 optou por revelar logo de cara a identidade do morto. Esperava-se algum entrecho mirabolante que compensasse essa opção. Mas não, a novela atual apenas distanciou-se ainda mais da antiga.
Em contrapartida, "O Rebu" se firma como um produto de altíssima qualidade da Globo – técnica e artística. Era o que se esperava da tríade George Moura (no roteiro), José Luiz Villamarim (na direção) e Walter Carvalho (na fotografia), que já havia feito "O Canto da Sereia" (2013) e "Amores Roubados" (2014) – por sinal, com mais repercussão que "O Rebu", que termina com média final de 15 pontos no Ibope da Grande São Paulo (a mesma de "Saramandaia", o folhetim das onze do ano passado).
O elenco, escalado a dedo, que misturava rostos conhecidos do grande público com outros nem tanto, proporcionou grandes momentos, com destaque para as atuações de Patrícia Pillar (Ângela Mahler), Tony Ramos (Braga), Cássia Kis Magro (Gilda), Sophie Charlotte (Duda), Camila Morgado (Maria Angélica), Jesuíta Barbosa (o "bandidinho" Alain), Júlio Andrade (o "maluco" Oswaldo), Bel Kowarick (Lídia, mulher de Braga), César Farrario (o cozinheiro Adão) e Cláudio Jaborandy (o garçon falastrão Severino).
Também merecem citação Vera Holtz, José de Abreu, Dira Paes, Marcos Palmeira, Daniel de Oliveira, Maria Flor, Pablo Sanábio, Elcir de Souza, Mariana Lima, Elea Mercúrio, Cyria Coentro e Jean-Pierre Noher.
Pelo seu valor artístico, "O Rebu", como produto final, se aproxima muito de outra produção recente da Globo, "Meu Pedacinho de Chão" – que, igualmente, não agradou a todos os públicos. A novela das onze talvez não tenha superado a repercussão desejada pela emissora, mas, com certeza, lhe dá prestígio. Com direção e edição criativas, fotografia cinematográfica e trilha sonora de qualidade, "O Rebu" é mais uma prova da tentativa da emissora em experimentar novos caminhos para a telenovela, aproximando-a da narrativa do seriado americano e da estética do cinema. Ainda que não tenha atingido todos públicos, vale como experimentação e uma opção diferenciada e de qualidade.
E no último capítulo, guardadas as devidas proporções, o final é equivalente ao final da primeira versão da novela. Mahler mata por ciúmes.
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