Topo

Totalmente Demais cativou o público com trama simples recheada de melodrama

Nilson Xavier

30/05/2016 20h24

Fábio Assunção, Marina Ruy Barbosa e Felipe Simas (Foto: Fabiano Battaglin/Gshow)

Fábio Assunção, Marina Ruy Barbosa e Felipe Simas (Foto: Fabiano Battaglin/Gshow)

O saldo de "Totalmente Demais" – a novela das sete da Globo que terminou nesta segunda, 30/05 – não poderia ter sido mais positivo. É o maior sucesso de audiência e repercussão no horário em quatro anos – desde "Cheias de Charme", de 2012. A trama de Rosane Svartman e Paulo Halm será sempre lembrada por ter conquistado o público de todas as idades (inclusive o jovem, hoje muito alheio às telenovelas) com uma história simples, fincada no dramalhão, repleta de personagens cativantes.

Que a dupla de autores dialogava bem com o jovem, sabíamos da temporada "Sonhos" de "Malhação" (2014-2015), um dos maiores êxitos de toda a história da novelinha vespertina. A receita de Svartman e Halm para conquistar o telespectador do horário das sete foi apimentar a trama de apelo juvenil com doses cavalares do mais tradicional folhetim. Assim, arregimentou-se também o público mais velho, tradicional consumidor de telenovelas.

A identificação e aceitação foi imediata. Personagens ancorados em arquétipos, claras referências em "Pigmalião" e "A Gata Borralheira" (Eliza parecia a própria), "Totalmente Demais" é a prova do porquê o melodrama encanta tanto mundo afora – outra referência é a mexicana "Maria do Bairro", com Thalia.

Novela seriada

totalmentedemais_cassandraPara "Totalmente Demais" valeu a máxima "uma vez ganho o público, pouco importa a história contada". A novela revelou uma trama de fases, ou melhor, uma trama seriada. Primeiro, o mote central que permeou boa parte da história: o longo concurso Garota Totalmente Demais. Sua duração foi até coerente, já que presenciamos a transformação paulatina de Eliza (Marina Ruy Barbosa), de garota arisca, selvagem, maltrapilha e descabelada a nova musa da beleza. O que incomodou foi a sensação de enrolação e a previsibilidade a cada nova fase (pouco criativa) do concurso, sempre com Cassandra (Juliana Paiva) e/ou Carolina (Juliana Paes) armando – inutilmente – para Eliza se dar mal.

Com o fim do concurso, os coadjuvantes já haviam desenvolvido suas histórias, principalmente os personagens do núcleo de Curicica. Foi quando Sofia (Priscila Steinman), que julgava-se morta, reapareceu, viva e louca, para se vingar de tudo e de todos. A novela entrou numa fase sinistra, com uma trama pouco coerente que culminou num dos desfechos mais absurdos da história de nossas novelas: Sofia foi baleada e morreu (de novo!) na frente dos pais. Melodrama potencializado, pouco sutil – repetido mais tarde em outras situações. Os autores pesaram a mão.

"O Retorno de Sofia", como poderia ter se chamado essa fase, revelou uma estratégia de Svartman e Halm na carpintaria de sua novela: a criação de subtramas dentro da história, de forma seriada, que começam e terminam, a fim de rechear a novela (ou encher linguiça). Foi o que se deflagrou quando a Globo deu ordens que "Totalmente Demais" fosse ampliada. Vimos historinhas que começaram e terminaram de uma hora para outra, para "cumprir tabela". Exemplo: durou quase uma semana a viagem de Carolina, Eliza e Rafael ao Uruguai só para Carolina forjar um flagrante, dos mais bestas, entre Eliza e Rafael. Golpe baixo da personagem e dos autores.

Outro recurso foi o merchandising social. A engrossar a trama, a novela tratou de assédio, adiamento da maternidade, homossexualidade, homofobia, paraplegia e adoção. Ainda que sempre louvável, alguns couberam perfeitamente dentro da história, enquanto outros quase soaram gratuitos.

Com o espichamento de "Totalmente Demais", ficou a sensação de que a novela poderia ter terminado há muito tempo, afinal, não restava mais muita história para contar. O público achou ruim? Pelo contrário. Prova de que a trama poderia durar um ano – como foi "Malhação Sonhos" – ou até virar um seriado de fato. O público já estava apaixonado pelos personagens, pelas idas e vindas do quadrilátero amoroso Jonatas-Eliza-Arthur-Carolina, pouco importando o quanto os personagens iam e voltavam. Mérito dos autores.

O contraponto

totalmentedemais_stelinhaSe, por um lado, Rosane Svartman e Paulo Halm pesaram a mão na condução de "Totalmente Demais", por outro há de se destacar alguns personagens que foram na contramão do melodrama e deram um sabor todo especial à novela, graças aos seus intérpretes e ao texto dos autores. "Totalmente Demais" não teria o mesmo efeito não fossem tipos como a dupla Stelinha e Maurice (Glória Menezes e Reginaldo Faria), sempre com um texto afiado e inteligente. Glória Menezes brilhou como a ranzinza professora de boas maneiras de Eliza.

Cassandra, personagem da ótima Juliana Paiva, também fez toda a diferença dentro da história. Divertidamente nonsense, é outro exemplo de boa união entre o talento do ator e o texto criado para ele. O mesmo para Fábio Assunção (Arthur), Felipe Simas (Jonatas), Vivianne Pasmanter (Lili), Marat Descartes (Pietro), Pablo Sanábio (Max), Julianne Trevisol (Lu), Orã Figueiredo (Hugo), Guida Vianna (Cida), Malu Galli (Rosângela) e Aline Fanju (Maristela). Já Juliana Paes, de posse de uma das personagens mais importantes da novela, ficou devendo ante um tipo difícil e complexo.

O último capítulo bateu o recorde de audiência da novela: prévia de 36 pontos no Ibope da Grande São Paulo (às segundas a audiência das novelas é sempre maior). Os autores chutaram o balde da coerência e privilegiaram a fantasia: Eliza e Jonatas – que iniciaram o romance maltrapilhos pelas ruas do Rio de Janeiro – terminaram juntos e felizes em Paris, dividindo um gramado com a cantora inglesa Gabrielle Aplin que tocou no violão o tema do casal, "Home". Pena que não ficaram no Brasil, justificaria o título da música e não precisaria de um chromakey tão fuleiro quanto o apresentado.

AQUI tudo sobre "Totalmente Demais": elenco completo, personagens, trilha e várias curiosidades.

Siga no TwitterFacebookInstagram

Leia também: Maurício Stycer, "Até os autores riram do melodrama mexicano no fim de Totalmente Demais".

Fotos: Divulgação/TV Globo.

Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

Blog do Nilson Xavier