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"Tempo de Amar" provou que melodrama clássico pode discutir questões atuais

Nilson Xavier

19/03/2018 19h32

Bruno Ferrari e Vitória Strada (Foto: reprodução)

Em entrevista, o diretor Jayme Monjardim definiu "Tempo de Amar" como "uma novela do bem". Com personagens humanos e fortes, a trama de Alcides Nogueira – encerrada nessa segunda (19/03) – fez jus ao título: tratou de amor fraternal de forma ampla e envolvente. Um alento para os olhos, com fotografia belíssima e produção requintada em cenários, figurinos e arte. E alento para os ouvidos, com o português culto na boca dos personagens, uma novidade que chamou a atenção do público. Sem receio do melodrama, autor e diretor propuseram o mergulho em um dramalhão clássico contado em ritmo cadenciado; bem construído e com uma trama redonda – até certo ponto.

Alguns escorregões

O público vinha de uma novela movimentada e alegre ("Novo Mundo") e, a princípio, estranhou em "Tempo de Amar" a desaceleração no ritmo e o excesso de sofrimento dos personagens nas primeiras semanas, o que rendeu à produção a alcunha de "Tempo de Sofrer". Autor e diretor explicaram que o início sofrido foi necessário, para que a história pudesse engrenar. O roteiro não foi alterado e logo os personagens encontraram dias melhores – bem como uma trama mais fluida. O ritmo foi condizente com o seu contexto. O humor, sempre leve, foi inserido gradativamente. Neste particular, destacaram-se o núcleo da geleia Supimpa – de Alzira (Deborah Evelyn), Pepito (Maicon Rodrigues) e companhia – e a agradável Dona Nicota (Olívia Araújo).

O longo desencontro dos protagonistas, em algumas situações forçadas, fez a trama parecer girar em círculos. Mesmo com amigos em comum em uma mesma cidade, Inácio e Maria Vitória (Bruno Cabrerizo e Vitória Strada) passaram a maior parte da novela sem se verem. Para forçar esse desencontro, Inácio até esqueceu do amigo Geraldo (Jackson Antunes), no momento em que este ficou atrelado a Maria Vitória – o encontro entre Inácio e Geraldo poria fim ao desencontro do par romântico. Ainda um ponto destoante: o sotaque italiano dos personagens Giuseppe e Tomazo (Guilherme Prates e Ricardo Vianna) quando a produção optou por não marcar o sotaque do núcleo de Portugal. Ora, ou se trabalha com sotaques, ou não.

Vitória Strada e Bruno Cabrerizo (Foto: reprodução)

Elenco portentoso

Jayme Monjardim lançou dois jovens atores para viverem os protagonistas Inácio e Maria Vitória: Bruno Cabrerizo e Vitória Strada. Ela chamou a atenção desde o início, pela beleza, carisma e segurança em cena. Bruno foi criticado, talvez mais por causa do perfil de seu personagem. Enquanto Maria Vitória era uma moça forte e decidida, Inácio era o personagem ingrato, o mocinho humilde, um tanto inocente e submisso. Ganhou nas redes sociais o apelido de Inércio. Não por acaso, da metade para o final, o ator mostrou evolução em sua interpretação à medida que seu personagem crescia também na trama.

Bruno e Vitória estiveram bem cercados, de um elenco portentoso, robusto. Destaque para as interpretações de mulheres fortes: Marisa Orth (Celeste Hermínia), Regina Duarte (Lucerne), Andreia Horta (Lucinda), Letícia Sabatella (Delfina) e Deborah Evelyn (Alzira). Também os trabalhos de Olívia Torres (Tereza), Lucy Alves (Eunice) e Françoise Forton (Emília). Do elenco masculino, Tony Ramos (sempre irrepreensível), Bruno Ferrari (perfeito como o galã clássico), Cássio Gabus Mendes, Nelson Freitas e o jovem Maicon Rodrigues (o Pepito).

Cássio Gabus Mendes e Lucy Alves (Foto: reprodução)

Vintage, porém atual

Uma trama de época que reverbera na atualidade, "Tempo de Amar" tratou de temas do final dos anos 1920 que são caros à pauta atual – como o empoderamento feminino (o termo "empoderamento" é atual, o movimento não) e outros que, infelizmente, persistem hoje: racismo, corrupção política e a questão da febre amarela.

Em meio à dura realidade, "Tempo de Amar" propôs um escapismo de qualidade – melodramático, mas com leveza, o que requer habilidade na escrita. Um melodrama clássico que prova que é possível a telenovela manter suas raízes folhetinescas e ainda assim acompanhar a evolução da sociedade, garantindo a manutenção do formato.

A audiência respondeu à altura. A novela fecha com uma média final de 23 pontos no Ibope da Grande São Paulo (quando se espera 20), tendo enfrentado o pior período para uma atração do fim de tarde: horário de verão, a estação em si, as festas de fim de ano e carnaval.

Leia também: "Autor e diretor de Tempo de Amar rebatem críticas à sofrência da trama e aos protagonistas iniciantes".

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Sobre o autor

Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.

Sobre o blog

Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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