Por que "Espelho da Vida" ficou imperdível só agora, quase no final?
Nilson Xavier
13/02/2019 07h00
Uma lástima que a trama da novela das seis "Espelho da Vida" tenha despertado faltando praticamente dois meses para o seu término. A narrativa da autora Elizabeth Jhin – original e interessante – sempre teve potencial. Contudo, faltou uma melhor dosagem para fazer essa história fluir de forma homogênea. Foram, pelo menos, quatro meses patinando.
Jhin demorou muito para apresentar os personagens no passado. Passou mais de dois meses privilegiando os do presente, com muitas cenas inúteis envolvendo o núcleo do cinema e quiproquós adolescentes. Um desperdício de tempo! Um caso de barriga (*) no início da novela. Isso afastou a audiência. Aí vieram o horário de verão e as festas de fim de ano, a fome, a peste, a guerra…
Cativar a audiência perdida demanda mais tempo. O ibope baixo em dezembro de 2018 foi terrível para "Espelho da Vida". A autora teve que se desdobrar para avançar com a trama do passado e, assim, ajustar a novela a um ritmo minimamente desejável, tornando a história mais atraente ao grande público. Para isso, precisou de mais um mês. Só que agora a novela está quase em sua reta final.
Neste momento, "Espelho da Vida" está imperdível, com ótimos ganchos (**) a cada capítulo. Não é a mesma novela de 2018. Se em novembro a proporção era de uma cena marcante por semana, agora é praticamente uma por capítulo. Na semana passada, Vitória Strada protagonizou a melhor sequência da novela até então: Cris, dopada e em surto, começa a ver os personagens na vida passada. Bem dirigida e bem interpretada, foi de tirar o fôlego.
No capítulo de segunda-feira (11/02), Isabel invadiu o casarão e Alinne Moraes, sua intérprete, arrebentou no embate com a personagem de Suzana Faini (a guardiã). A direção da novela (sob responsabilidade de Pedro Vasconcelos) é muito boa e o elenco, afiado. Mas, por que só agora a trama está envolvente? Faltou melhor planejamento? A autora realmente acreditou que levar sua história lentamente manteria o espectador ligado nela? Ou essa trama não rendia seis meses no ar?
O público está imediatista – esta é uma realidade sem volta. A concorrência com outras mídias ou outros focos de atenção é muito acirrada para uma narrativa morosa. Está ao alcance de um botão do controle remoto. Uma avaliação a se considerar é o quanto dura uma boa ideia no ar. Seis, quatro, dois meses? A mim, parece mais um caso de boa ideia que não dá seis meses de novela, como "O Tempo Não Para" e "O Sétimo Guardião".
(*) Barriga: jargão novelístico que designa aquele período da trama (geralmente na segunda metade da novela, antes do final) em que nada acontece, em que o autor "enche linguiça", ou "empurra a novela com a barriga".
(**) Gancho: a cena ápice do capítulo, ao final, que dá continuidade à história no dia seguinte.
Sobre o autor
Nilson Xavier é catarinense e mora em São Paulo. Desde pequeno, um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: em 2000 lançou o site Teledramaturgia (http://www.teledramaturgia.com.br/), cujo sucesso o levou a publicar o Almanaque da Telenovela Brasileira, em 2007.
Sobre o blog
Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.