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Mauricio Stycer

"Fina Estampa" tem defeitos, mas qualidades são maiores e garantem sucesso

Tereza Cristina (Christiane Torloni) e Griselda (Lília Cabral), a vilã e a heroína de "Fina Estampa"  - Divulgação Globo / Alex Carvalho
Tereza Cristina (Christiane Torloni) e Griselda (Lília Cabral), a vilã e a heroína de "Fina Estampa" Imagem: Divulgação Globo / Alex Carvalho

Colunista do UOL

16/08/2020 07h01

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Entre as tarefas do crítico de televisão está a de tentar explicar por que determinado programa, mesmo apresentando muitos problemas, é tão apreciado pelo público. Apontar os defeitos é parte do trabalho. Mas é preciso ir além.

Costumo resumir o trabalho do crítico por um conjunto de tarefas, a saber: entender as intenções, avaliar os resultados, enxergar os méritos, lançar luz sobre os defeitos e conseguir explicar com clareza o que é digno da atenção do espectador.

A novela "Fina Estampa" foi objeto de muitas críticas na época de sua exibição original, em 2011. Nove anos depois, o barulho voltou, mas ainda maior, amplificado pelo Twitter.

Escolhida para substituir "Amor de Mãe", cujas gravações foram suspensas por causa da pandemia de coronavírus, a novela de Aguinaldo Silva está provocando uma onda de descontentamento ruidosa, a ponto de o autor enxergar uma campanha contra ela. Um comentário debochado do ator Marco Pigossi detonou uma onda de críticas, levando Aguinaldo a reagir duramente.

"Fina Estampa" foi ao ar originalmente após "Insensato Coração", de Gilberto Braga e Ricardo Linhares, e tinha como missão levantar a audiência do horário, que estava acomodada na faixa de 35 pontos. Conseguiu: a trama teve média de 39 pontos.

Após o primeiro capítulo da exibição original, escrevi: "Depois de uma novela muito distante da realidade, com um protagonista que não trabalhava, duas herdeiras e três vilões psicopatas, a Globo apresenta agora uma trama destinada a colocar no centro do palco o que ela imagina ser a nova classe C do país."

Referia-me a Griselda, ou Pereirão (Lilia Cabral), claro, a grande personagem da trama, uma mulher batalhadora, ética, responsável pela manutenção de uma família grande e orgulhosa de colocar um dos filhos numa faculdade de medicina.

Em oposição a Griselda, o autor criou uma vilã de desenho animado, Teresa Cristina (Christiane Torloni), apoiada por um núcleo de humor, liderado pelo mordomo Crô (Serrado), usado para contrabalançar a postura politicamente correta da heroína.

Esta semana, o colunista Fefito, do UOL, perguntou: "Afinal, como pode um folhetim tão ruim estar no ar?" O texto apontou vários preconceitos e situações hoje inaceitáveis, segundo ele, reiterados por alguns personagens.

Um dos maiores incômodos é causado por Crô, um gay afetado e caricato, sempre em situação subalterna à patroa.

A participação de Crô na trama, não se pode esquecer, é quase sempre em chave cômica, de alívio narrativo. Soa velho e ultrapassado? Sim. Mas está em linha com a representação de homossexuais em várias outras tramas de Aguinaldo, inclusive posteriores a esta novela.

Acho que o grande mérito de "Fina Estampa" é este equilíbrio entre a postura exemplar da heroína e o nonsense da vilã, entre o discurso de "empoderamento", como se diz hoje, e o entretenimento oferecido. Dito de forma coloquial, a novela tem falhas no varejo, mas é muito bem estruturada no atacado.

Não acho que o sucesso de "Fina Estampa", repetido em 2020, se explique pelos seus problemas, que são notórios. Mas sim porque a sua mensagem continua atual e estimulante num momento como este hoje.

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Uma versão deste texto foi publicada originalmente na newsletter UOL Vê TV, que é enviada às quintas-feiras por e-mail. Para receber, gratuitamente, é só se cadastrar aqui.

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