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Após novela, Paraisópolis vira xodó de atores e terá curso de TV

Paulo Pacheco

Do UOL, em São Paulo

06/11/2015 11h37

"I Love Paraisópolis", que termina nesta sexta-feira (6), colocou a segunda maior favela de São Paulo no mapa da TV. O bairro da zona sul, encravado na área nobre do Morumbi, virou xodó dos atores da novela da Globo e motivo de orgulho para os moradores, que se viram representados, segundo o líder comunitário Gilson Rodrigues. A região ainda tem problemas de moradia, saúde e transporte, mas a trama das sete deixará um legado a Paraisópolis: um curso de rádio, televisão e cinema previsto para 2016.

Antes da estreia, Rodrigues, que é presidente da União dos Moradores e do Comércio de Paraisópolis, disse ao UOL que esperava que não fosse apenas mais uma novela e torcia para que a comunidade fosse bem retratada. Seis meses depois, ele comemora a valorização dos moradores.

"A Paraisópolis da novela é diferente da real, mas pelas histórias de vida, a valorização dos nordestinos e os preconceitos que existem contra quem vive na favela, valeu a pena. A comunidade se sente mais orgulhosa. Antes, as pessoas tinham medo de falar que moravam em Paraisópolis, muitas vezes falavam Morumbi. Hoje, vivem um momento feliz, amam Paraisópolis. É uma mudança importante de conceito, tanto para a comunidade quanto para quem a marginalizava", celebra.

O final da novela será acompanhado discretamente pela comunidade. Diferentemente da estreia, que pôde ser vista em um telão de cinema instalado pela Globo em Paraisópolis, o último capítulo terá um evento menor e mais reservado, dentro da sede da associação de moradores.

Atores "moraram" na favela

Os atores e a equipe de produção de "I Love Paraisópolis", também passaram a amar o bairro e se engajaram nos projetos sociais e culturais da região, como o balé e a orquestra filarmônica, que foram retratados na novela.

"Houve total integração da equipe da novela, os autores, diretores, produção, atores. Durante esses seis meses, tivemos uma vivência muito importante. Muitos atores se envolveram em projetos sociais. Henri Castelli, que mora aqui do lado, esteve muitas vezes em Paraisópolis, viveu como se fosse um morador. Bruna [Marquezine] andou como uma pessoa da comunidade, recebeu todo mundo. Eles queriam sentir Paraisópolis, não só por uma questão de laboratório, mas por uma questão de vida", explica.

O líder comunitário espera que os atores continuem ajudando Paraisópolis em projetos futuros como o de Natal, com uma vaquinha que vai arrecadar fundos para crianças carentes do bairro: "Estamos conversando com alguns atores para ajudarem a divulgar a campanha".

Um dos principais legados de "I Love Paraisópolis" para a favela está a caminho. Com a ajuda de diretores, produtores e roteiristas da Globo (o líder comunitário não foi autorizado a citar nomes), o bairro terá um curso de audiovisual previsto para inaugurar em 2016.

"Vamos lançar um projeto chamado Cine Paraisópolis, com a ideia de formar pessoas na área de cinema, rádio, TV e produção. Eles entendem que há uma demanda importante no mercado que não é absorvida, e eles, como profissionais de ponta, querem ajudar na formação de pessoas da comunidade para que possam, posteriormente, trabalhar com isso", antecipa Gilson Rodrigues.

Problemas reais

Apesar dos elogios, o líder comunitário se preocupa com a maneira como as carências do bairro apareceram na trama. "A novela pode parecer que os problemas de Paraisópolis foram resolvidos, mas na realidade o que acontece é o contrário", diz. "Acredito que a tendência é mostrar as conquistas, eles vão apresentar o projeto de reurbanização na ONU, tudo maravilhoso. Mas pode parecer para o telespectador que as coisas estão realmente acontecendo, mas não estão. Estamos preocupados em poder mostrar que existem essas necessidades", completa.

As demandas de Paraisópolis não são poucas. Segundo dados da união de moradores, dos 100.000 habitantes de Paraisópolis, 13.000 são analfabetos. Além disso, 5.000 crianças da região estão fora da escola, e 6.000 pessoas foram removidas para construção de unidades habitacionais que estão atrasadas. Também há as obras do monotrilho da linha 17 - Ouro, em que o trecho até o bairro está paralisado.

Gilson Rodrigues lamenta a falta de investimentos em Paraisópolis, mas comemora a força que a trama da Globo deu para as reivindicações da comunidade: "As obras de urbanização estão paradas, mas a luta está presente na novela e fez os moradores ganharem mais força. Paraisópolis precisa de muita ajuda ainda. Precisa se transformar em um bairro. Ninguém sonhou morar em favela. Resgatar a luta da urbanização foi algo importante que a novela fez, infelizmente ainda sem o resultado concreto".