De vendedora de hot dog a estrela do "Vídeo Show", Iozzi foi o nome de 2015
Por tudo que fez em 2015, Monica Iozzi merece um troféu. Presente na televisão desde 2009, ela não se enquadra mais na categoria “revelação”. Um prêmio mais óbvio, por conta do seu desempenho à frente do “Vídeo Show”, seria o de melhor apresentadora do ano. O mais exato e justo, porém, seria consagrar Monica pelo que ela é, de fato – uma atriz de múltiplos talentos.
Até 8 de maio, ela teve a oportunidade de brilhar em “Alto Astral”, uma novelinha despretensiosa de Daniel Ortiz, dirigida por Jorge Fernando, no qual viveu o duplo papel de Scarlet, uma patricinha loira mimada, e Cidinha, uma faxineira simplória e feia. Em abril, ainda gravando a novela, estreou ao lado de Otaviano Costa no “Vídeo Show”, inaugurando uma nova fase do programa, no qual interpreta uma apresentadora alegre e debochada. E em setembro, vivendo uma vizinha bêbada, ensinou aos colegas de elenco que o “Tomara que Caia” era um programa de improvisação.
Monica é formada em artes cênicas na Unicamp e o desejo de atuar, agora no cinema, é o que a move em frente. “Sou muito aberta ao que aparece. A gente tem que prestar atenção ao que a vida nos apresenta. Uma coisa é você ser persistente, outra coisa é ser teimosa”, filosofa em uma conversa com UOL no Projac, no Rio. “Eu quero fazer tudo que possa me ensinar, ser interessante. Me jogo em tudo.”
A gente tem que prestar atenção ao que a vida nos apresenta... Quero fazer tudo que possa me ensinar, ser interessante. Me jogo em tudo.
O seu próximo passo, conta, é o filme “Chorar de Rir”, de Toniko Melo (o diretor de “Vips”), no qual vive uma atriz cômica de sucesso que deseja provar a sua capacidade de fazer drama. As filmagens serão no primeiro semestre de 2016, mas a data ainda não está acertada. “Serão 40 dias de filmagem, de segunda a sexta”, diz.
Por isso vai deixar o “Vídeo Show”. “Sabemos que vou sair. Isso está concordado com o [diretor] Boninho, com a direção da casa, desde que eu entrei, mas não tem uma data específica para isso”, garante. “E de repente eu volto. Não sei. Vamos ver. Talvez seja um até breve”, deixa no ar.
Monica concorda que, para quem está olhando as coisas de fora, é muito difícil entender a sua saída do “Vídeo Show”. Soa a insatisfação. “Assistindo ao programa, dá para ver que não estou [infeliz]”, diz. “Sempre tive uma relação muito sincera com o Boninho. Ele percebeu que não é por insatisfação que quero sair. É porque tenho muita vontade de fazer outras coisas. E cinema é um mercado muito pequeno e muito fechado. Não dá para sair abrindo mão. Tenho que aprender a fazer.”
Ouvindo a atriz contar a sua história de vida, esse gesto de largar um programa no auge do sucesso faz mais sentido. Não é a atitude de uma menina mimada. Ao contrário, é o passo de alguém que sempre batalhou muito pelo que quis.
Nascida em Ribeirão Preto, segunda filha de um eletricista e uma dona de casa, ela resume a sua infância: “Meus pais eram pessoas mais simples. Meu pai estudou até a 4ª série. Eram pessoas que não tinham acesso fácil à cultura. Mas, ao mesmo tempo, apesar de a gente não ter muita grana, meu pai sempre priorizou duas coisas: uma boa casa e uma boa escola. A gente sempre estudou em escola particular. E a minha escola me abriu um mundo, que eles não tinham acesso. E aí comecei a ter aulas de teatro na escola e me apaixonei.”
Era até divertido, mas fiquei cinco anos sem conseguir comer cachorro-quente.
Sobre ajudar a mãe a vender sanduíches
Monica tinha 16 anos quando o pai morreu em um acidente. “A gente aprendeu a se virar”, conta. A irmã foi vender trufas na faculdade, ela trabalhou em lojas de shopping e ajudava a mãe. “Ela montou um trailer de cachorro-quente. Era até divertido, mas fiquei cinco anos sem conseguir comer cachorro-quente”.
Alguns anos depois, em Campinas, enquanto estudava teatro (“Não lembro de querer outra coisa”), morava na faculdade e também se mantinha fazendo bicos, trabalhando de garçonete, dando aulas para adolescentes, cantando em barzinhos.
Formada, se mudou para São Paulo e a primeira coisa que fez foi arrumar um trabalho – vendedora de livros de arte na Livraria Cultura no shopping Market Place. “Atendia um monte de gente da Globo lá, inclusive o William Waack, que eu falo tanto.”
Monica entrou para o programa de teatro do Sesi (Serviço Social da Indústria) e para a Universidade Livre de Música. Logo largou os estudos musicais e, algum tempo depois, também o teatro. “Segunda-feira era meu único dia de folga na livraria e era o único dia de período integral no Sesi. Fiquei três meses sem nenhum dia de folga. Caí doente e acabei tendo que sair”.
A atriz então foi aceita em uma oficina do Satyros, uma respeitada companhia de teatro experimental em São Paulo. Ficou um ano, montou um espetáculo de criação coletiva baseado na obra de Clarice Lispector e, junto com outros três integrantes da oficina, foi selecionada para participar da companhia principal. “Quando isso aconteceu, minha avó caiu doente em Ribeirão”, conta.
De volta à cidade-natal, pensou em fazer um mestrado sobre teatro grego. “Como é o teatro grego hoje. Como são as montagens das tragédias e comédias contemporâneas. Como esse universo tão diferente está sendo feito na nossa época. Queria ir para a Grécia... Ainda quero fazer. Em algum momento vou fazer”, promete.
Até o momento, é o trabalho que eu mais tenho orgulho de ter feito.
Sobre o "CQC"
Mas aí apareceu o concurso do “CQC”, que buscava selecionar a primeira mulher do time. Fã do programa, Monica gravou um vídeo em Ribeirão, entrevistando pessoas na rua sobre o que elas achavam de ter uma mulher no programa. Foi selecionada e chamada para São Paulo. “Nunca pensei em trabalhar com televisão. Sempre achei que fosse fazer meu teatro... Fui numa tranquilidade, com a certeza que aquilo devia ser cartas marcadas, e aquilo me ajudou. Tinha certeza que não ia ganhar.”
Estreou em setembro de 2009. “Toda semana eu dizia que queria ir para Brasília. Em março de 2010, o Danilo Gentili ficou doente, não tinha ninguém para mandar, aí fui eu. Nunca mais saí de lá. Fiquei três anos e meio fazendo Brasília.”
Ela conseguiu fazer jornalismo pesado, com humor e com um cinismo bem medido e bem dosado.
Diego Guebel, diretor artístico da Band
Foi um sucesso, explica, a pedido do UOL, o argentino Diego Guebel, diretor artístico da Band: “Acho que o lado atriz dela a ajudou muito a conseguir perguntar as coisas mais pesadas e fortes de um jeito ‘meigo’, jeito de caipirosca do interior, como o Marcelo Tas carinhosamente a chamava no programa”. E mais: “Isso para o ‘CQC’ foi genial. Ela conseguiu fazer jornalismo pesado, com humor e com um cinismo bem medido e bem dosado”, conta Guebel.
Monica tem uma visão semelhante: “Se eu não tivesse algum tipo de máscara, não daria para acontecer. Era quase uma personagem. Como se eu fosse uma repórter sem nenhum tipo de filtro. Uma coisa que alguém da rua perguntaria a um parlamentar, eu ia lá e perguntava. Tinha um quê de loucura que me dava liberdade. Eu conseguia falar tudo que eu queria para eles... Aos poucos criei essa persona, meio maluca, meio sem filtro.”
A atriz avalia a experiência no programa como única. “Até o momento, é o trabalho que eu mais tenho orgulho de ter feito, de uma qualidade excepcional. Aqueles anos foram transformadores, tenho muito orgulho de ter feito”. Ainda assim, sucumbiu diante da violência – verbal e física – que enfrentou. “Sei que era muito pesado para ela e sabemos que ela viveu aquilo intensamente, sofrendo muitas vezes até com agressões físicas”, conta Guebel.
Uma vez, acompanhando José Dirceu, Monica afirma que foi alvo de uma cotovelada na boca, dada por alguém não identificado que cercava o político. Em outra situação, tentando entregar uma cesta de “aposentadoria” a José Serra, diz que um segurança jogou a cesta no chão e torceu seu braço. Por fim, tentando entrevistar Silas Malafaia na Comissão de Direitos Humanos, se machucou. “Não lembro direito como aconteceu, mas ouvi um estalo: quebrou meu dedo. Foi a única vez que chorei no Congresso. De raiva.”
Não lembro direito como aconteceu, mas ouvi um estalo: quebrou meu dedo. Foi a única vez que chorei no Congresso. De raiva.
O episódio foi a gota d'água para a decisão. “Saí do ‘CQC’ muito de supetão. Tinha mais um ano e meio de contrato com a Band. O peso de fazer Brasília me desgastou de tal maneira que eu não ia mais conseguir fazer, me sufocou. E também queria voltar a ser atriz."
A atriz anunciou a sua saída no dia 20 de dezembro. No dia 2 de janeiro de 2014, conta, Boninho a convidou para ser “ombudsman” do “BBB 14”. E dois dias depois, Jorge Fernando a reservou para um papel em “Alto Astral”, que só estreou em novembro daquele ano.
Ainda estava na novela quando foi chamada para um teste no “Vídeo Show”. Aprovada, afirma não ter recebido nenhuma orientação especial. Tinha apenas que fazer um programa ao vivo ao lado de Otaviano Costa, com quem nunca havia trabalhado. “Não sei de quem é a frase, ‘só é feliz quem não tem medo do ridículo’. Otaviano assina embaixo. Eu também, mas ele mais”.
A partir do momento que é ao vivo e a gente está falando sobre televisão, por que fingir que esse universo não existe?
Ouvido pelo UOL, Otaviano explica: "Antes deste nosso momento junto, a orientação artística, no que diz respeito ao tom do programa, era outra. Era um programa ‘calmo’. Eu estava calmo. Boninho sacou no momento em que fizemos o teste dela a química imediata que havia entre nós e deixou estes dois loucos brincarem e mudarem o que era, até então, histórico. A partir dali eu sabia que teríamos outro ‘Video Show’. Mais divertido, debochado, improvisado e mesmo assim, mantendo seu principal DNA: a televisão. O jogo com Monica é delicioso criativamente."
A atriz confirma: “O programa parece que tem vida própria. Não combinamos nada. Mesmo as invasões no estúdio começaram por acaso, com o Tiago Abravanel, que é meu amigo”, conta. As menções a apresentadores de outras emissoras, igualmente, surgiram por acaso. “Nelson Rubens, Sonia Abrão, Hebe, Gil Gomes, Silvio Santos... A partir do momento que é ao vivo e a gente está falando sobre televisão, por que fingir que esse universo não existe? É conhecido. Então vamos falar.”
Kizzy Magalhães, diretora-geral do “Vídeo Show”, conta ao UOL que esperava reclamações por conta dos improvisos da dupla de apresentadores: “Quando ouvi a primeira piada entre Monica e Otaviano fiquei esperando o telefone tocar. Mas nunca tocou”, diz. “Ela trouxe um público jovem para o programa”.
Monica esclarece que, assim como no “CQC”, a apresentadora do “Vídeo Show” também é um tipo criado por ela. “É uma personagem. Tem um lado infantil, inspirado nas fãs adolescentes, que ficam enlouquecidas com os galãs” explica.
É uma personagem. Tem um lado infantil, inspirado nas fãs adolescentes, que ficam enlouquecidas com os galãs.
As brincadeiras com o namorado, o produtor e roteirista Felipe Atra, também fazem parte. “Chamo-o de Tomate, um apelido de infância, que não uso na vida real. Tem a ver com essa personagem adolescente. As menininhas têm um namorado, mas choram por causa do Luan Santana.”
Sobre o seu companheiro de bancada, Monica é só elogios: “Parece clichê, mas é tão verdade: Otaviano tem um jogo, uma troca, um companheirismo tão verdadeiro, tão rápido, tão livre de vaidade, sem um pingo de egoísmo. A pessoa que vier vai estar extremamente bem aparada.”
Decidida mesmo a sair do “Vídeo Show”, Monica filosofa: “Cada escolha é uma renúncia, como diria o poeta Charlie Brown [na música ‘Lutar Pelo Que É Meu’]”. E diz que pretende voltar a ser apresentadora no futuro: “Quero ter um programa que fale sobre política, que ensine política para a população de forma didática e leve e, se possível, engraçada.”
Quero ter um programa que fale sobre política, que ensine política para a população de forma didática e leve e, se possível, engraçada.
E também sonha com um programa de entrevistas. “Mas não um talk show. Um programa de entrevistas que você consiga se aprofundar nos assuntos com as pessoas. Não necessariamente uma coisa de piada, uma coisa de conhecer as pessoas de outra maneira.”
A grande atriz de 2015 se diz realizada até agora: “Sempre quis que o meu trabalho fizesse alguma diferença em alguma coisa. Mesmo numa coisa pequena. No ‘CQC’ eu sentia isso grande. De repente, a gente tira muito valor da comédia. Receber esse feedback das pessoas do ‘Video Show’ eu sinto que faz uma diferença, numa outra linguagem, numa outra grandeza. Mas faz. E isso é ótimo. Nunca achei que fazer entretenimento pudesse ser tão bacana. Gosto do que faço.”
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