Ney Gonçalves Dias lembra "TV Mulher": "Gabi e Clodovil eram inimigos"
Trazer nomes de peso como o de Clodovil Hernandes (1937-2009), que fez fama como comentarista de moda antes de eleger-se deputado federal, para as manhãs de um programa diário é só para quem tem o prestígio de um "TV Mulher". Essa é a visão do apresentador Ney Gonçalves Dias, que dividia o comando da atração com Marília Gabriela nos anos 80.
O jornalista e radialista, que gravou uma participação no novo "TV Mulher" - produção do canal Viva em 10 episódios que começa a ser exibida a partir da próxima terça (31) -, acredita que o programa, que ficou conhecido pela originalidade, tinha uma credibilidade que é difícil de encontrar hoje em dia. Além dos integrantes que faziam o programa acontecer, como Clodovil, Marta Suplicy e Irene Ravache, todos queriam estar no estúdio como convidados.
"Isso acontecia, também, porque no encerramento do programa a Gabi entrevistava uma pessoa por até quase vinte minutos. Todo mundo queria ser entrevistado pela Gabi. Ela era capaz de levar [para o programa] juiz, desembargador, Elis Regina... Atraía muita gente de várias áreas", afirma em entrevista ao UOL.
Ney diz que tinha uma boa relação com os colegas que faziam o "TV Mulher", mas o clima de cordialidade não era em comum entre todos. Muito pelo contrário. Nos bastidores, Gabi e Clodovil simplesmente não se dirigiam um ao outro. "O Clodovil e a Gabi eram inimigos mortais. Um tinha ódio do outro. Um metia o pau no outro. Isso só fora do ar", revela.
Já sobre Marta Suplicy, que falava abertamente sobre sexo na TV, o jornalista se lembra dos protestos contra a sexóloga e o clima de conservadorismo.
"Ela falava de pênis, vagina, coisas que nunca tinham sido ditas na televisão. Teve um dia que a censura veio pra cima eu tive que ir na casa dela com o Roberto Irineu [Marinho, então presidente do Grupo Globo] para ver educadamente se podíamos dar uma moderada para fugir da censura. Tinham mulheres, donas de casa, que proibiam as filhas de assistirem. Quando aparecia a Marta, desligavam a televisão".
O formato do "TV Mulher" foi concebido por José Bonifácio de Oliveira, o Boni, influenciado pelo sucesso dos programas radiofônicos da época. Ney se lembra que o Brasil atravessava um momento de grave crise econômica, fazendo com que o todo poderoso da Globo adaptasse para a televisão um estilo que já funcionava no rádio. Para transformar a ideia em realidade, o diretor Nilton Travesso foi convocado para a missão.
O apresentador ganhou o posto, ao lado de Gabi, pela experiência que tinha como comentarista. "Eu trabalhava na Jovem Pan, em São Paulo, que era a única emissora noticiosa de rádio. Fazia um jornal de manhã com o Wilson Fittipaldi [pai do piloto Emerson Fittipaldi]. Só tinha esse jornal no rádio brasileiro. Eu e ele dávamos palpites nas notícias que eram lidas, e tinha muita repercussão", diz.
Depois de meses como repórter do "Fantástico", no qual se orgulha de ter feito a última reportagem com Chico Xavier ("cada vez que a Globo mostrar o Chico, fui eu quem fiz a matéria, embora eu não apareça"), o jornalista foi escolhido para dar sua opinião sobre as notícias do dia e, também, ajudar a tirar as dúvidas da área do direito, enviadas por telespectadores por meio de cartas.
Ney Gonçalves Dias diz que o "TV Mulher" nasceu como uma experiência, que deveria ser o embrião de uma programação de qualidade sem deixar de ser popular. Como tal, era controverso mesmo dentro da Globo. Uma das divergências era como deveria ser apresentado. "O Boni achava que deveria ser feito em um teatro, com auditório e palco, mas acabou sendo feito em estúdio", afirma ele.
A Globo só não perdeu qualidade nas novelas, que é algo fora do comum. O resto é só para preencher espaço na grade para faturar.
"A Globo sempre foi acusada de ter mais forma do que conteúdo. E o 'TV Mulher' só tinha conteúdo, não tinha forma – não passava reportagem gravada, só muito raramente. O negócio era olho no olho", afirma. "Por isso a bronca do Boni, ele achava que, já que tinha só a cara da gente, que fosse num auditório ou num teatro para que as pessoas se apresentassem no palco", explica.
O diretor, responsável pela grade da emissora como é feita até hoje - intercalando novelas com jornais, por exemplo -, acompanhava de perto o "TV Mulher". Detalhista, apontava erros, dava sugestões e dizia o que precisava mudar. "O Boni mandava mensalmente um relatório para o Nilton Travesso, sugerindo que ele repassasse às pessoas envolvidas o que estava escrito. Falava para fulana falar mais devagar, para beltrano trocar de roupa ou que o cenário não estava bom", conta.
TV aberta: “É uma mediocridade só”
Ney passou pelas principais emissoras do país e em popularescos como "Aqui Agora" (SBT) e "Cidade Alerta" (Record). Todas as experiências, ele pondera, não chegam perto em prestígio em relação aos tempos de “TV Mulher”.
Ele, que atualmente é comentarista do jornal "RB Notícias", da Rede Brasil de Televisão (RBTV), diz que assiste à TV aberta, mas reclama da falta de qualidade.
"Hoje não tem nada. É uma mediocridade só. Esses dias eu estava assistindo ao Faustão. Além da 'Dança', não tem mais nada. É o ator, a família, quadro de mágica, pegadinha e acabou o programa", dispara. "A Globo só não perdeu qualidade nas novelas, que é algo fora do comum. O resto é só para preencher espaço na grade para faturar", completa.
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