Dira Paes temeu rejeição a casal de "Velho Chico" por discurso político
Ela, professora. Ele, vereador. Ambos preocupados em defender o povo de Grotas de São Francisco. No fim, as semelhanças falaram mais alto que as diferenças e as feridas abertas pela vida que distanciavam os caminhos de Beatriz (Dira Paes) e Bento (Irandhir Santos) em "Velho Chico". O romance acalentado capítulo a capítulo transformou os dois num dos casais mais queridos pelo público da novela das nove - equilíbrio ameaçado pela presença de Martim (Lee Taylor), figura que fascina a filha de Ceci (Luci Pereira) e perturba o irmão de Santo (Domingos Montagner).
"Estamos perto do capítulo 100, e é muito bom para a trama a gente ter esse caminho tortuoso. Com a chegada do Martim, as pessoas ficam excitadas com essa possibilidade e chateadas ao mesmo tempo (risos). O público entra nessa vibração. Ouço gente dizendo: 'Não acredito que você vai largar o Bento' ou 'Nossa, eu ia ficar em dúvida mesmo'. Mas já me disseram: 'Do jeito que eu sou eu ia ficar com os dois!'. A gente acaba provocando justamente essa dúvida", afirma.
No lugar de Beatriz (Dira Paes), você ficaria com quem, em "Velho Chico"?
Resultado parcial
Total de 2238 votosO fato de o casal ter dado tão certo foi uma surpresa para a atriz, que enxerga, no entanto, um alicerce forte construído ainda no roteiro. "Desde o primeiro beijo do casal, o público já queria vê-los juntos. Não sabia que seria tão bem aceito por conta de os dois terem discurso social forte, mas isso foi bem recebido. As pessoas gostam do casal como dupla, porque eles combinam, mas também porque gostam do modo que eles pensam, da maneira como eles encaram o mundo a sociedade", analisa.
Para Irandhir, os comentários nas ruas também se dividem entre a química entre Bento e Beatriz e a identificação dos telespectadores com os ideais dos dois. "Achei ótima a entrada do Martim, porque acrescenta à linha dramática dos personagens. O engraçado é que sou fã do Martim: quando li a sinopse, fiquei sofrendo por ele. Vai ser uma boa briga", aposta o ator.
Na verdade, a briga já está acontecendo, embora ainda não declarada pelo coração da professora: o herdeiro de Afrânio (Antonio Fagundes) e o filho de Belmiro (Chico Diaz) já andaram se estranhando por conta da eterna rixa entre suas famílias. É só aos poucos que o fotógrafo consegue mostrar que não é um novo Saruê, como a reportagem que faz denunciando as péssimas condições da escola da cidade.
"Martim chega de uma maneira que me surpreende muito", diz Dira. "O encantamento de Beatriz por ele não é afetivo. Ela começa a perceber que as impressões dela sobre aquela pessoa são totalmente contrárias, mas não vai querer dar o braço a torcer. Só que ele vai provando isso a cada instante. Aí vai surgir uma relação confusa. Ele está feliz de ter encontrado alguém que fala a mesma língua dele. Acho que ela vai perceber isso daqui a pouco. É um triângulo que vai passar pelo encantamento da alma, mais do que uma atração física", diz.
Deve ser muito frustrante para uma mulher se apaixonar pelo tipo que ela mais desconfia na vida, que são os políticos. Ali foi compreensível essa não aceitação
A relação, segundo Dira, foi construída pelos atores segundo a maturidade dos personagens - por isso, no início, o dilema na aproximação deles se tornou crível. "Deve ser muito frustrante para uma mulher se apaixonar pelo tipo que ela mais desconfia na vida, que são os políticos. Ali foi compreensível essa não aceitação. E ela não gostaria de se envolver porque a relação dela com homens sempre foi de opressão. Vencida essa etapa, acho curioso não colocar a Beatriz tão romântica. Em uma cena, Bento diz que a ama e ela não responde. Acho bacana esse medo, muita gente tem. Ela é muito cautelosa no amar dela", afirma.
Por conta das falas, sempre fortes e politizadas, a atriz chegou a temer uma certa rejeição à personagem. Mas não demorou muito para ela perceber que a professorinha, personagem clássico do imaginário do autor Benedito Ruy Barbosa, não teria um tom panfletário.
"A gente está vivendo momentos muito acalorados. Talvez o personagem fosse o reforço das nossas mazelas. Mas teve justamente o efeito contrário: a Beatriz, o Bento, o Santo e a novela em si, tocam numa coisa atual, mas que são problemas que nos acompanham há seculos. E a novela apresenta de maneira muito inteligente os recantos do Brasil. Quem não conhece pode estranhar, mas você passa por lugares em que parece que o tempo não passou, parece que a gente está vivendo ainda o império. E o Benedito tem a maestria de abordar a questão da luta de classes, do coronelismo, do poder público", diz.
A familiaridade com o universo da educação Dira começou a ter ao participar da edição 2015 do "Criança Esperança", quando teve a oportunidade de observar alguns discursos em câmaras municipais. "Encontrei muitas Beatrizes. E queria que ela tivesse essa inteligência, que vem da alma. Gosto do fato de ela ser uma mulher madura, sem filhos, que se dedica ao trabalho. Estamos falando do campo, mas é uma mulher contemporânea. Admiro muito o olhar dos autores em relação a isso e gosto muito de ela não ser uma mulher piegas. Ela tem uma autonomia, tem personalidade", opina.
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