Arte como resistência política é motor da 2ª temporada de "Magnífica 70"
Até que ponto arte e resistência política se fundem? Em "Magnífica 70", série brasileira da HBO, totalmente. Em plena ditadura militar, uma trupe de criadores da Boca do Lixo comandada por Vicente (Marcos Winter) produz filmes críticos à sociedade enquanto enfrentam os próprios demônios.
Na segunda temporada da trama, no ar desde 2 de outubro, os protagonistas levam a premissa ainda mais longe. Enquanto Manolo (Adriano Garib) dirige “Máquina do Amor”, um longa encomendado por censores do regime, Vicente grava uma versão alternativa que os deixaria de cabelo em pé. “É um passo além dos filmes anteriores que eles fizeram. É mais arrojado, não só esteticamente, mais ética e politicamente. Está dizendo algo muito claramente”, conta Garib.
E, para os atores da trama, é natural que a arte assuma o papel de expressar ideias contrárias às dominantes em um contexto de repressão.
“Se você parar pra pensar, em uma época em que existe um regime ditatorial, militar, totalitário, não são muitos os nichos em que existem cabeças pensantes”, diz Marcos Winter. “Pelo contrário, a tutela do estado alimenta para que o indivíduo deixe de ser indivíduo, deixe de ser um ser pensante, atuante, contraditório. A arte é um dos poucos nichos em que as pessoas continuam conseguindo se expressar, trocar ideias, confabular e transformar isso em produto. E esse produto também tem essa característica, de ser algo que gere discussão, a possibilidade de se rever a história”.
Apesar da dificuldade que é se expressar livremente em um contexto desses, a arte acaba encontrando pequenas brechas para se liberar, acredita a atriz Maria Luísa Mendonça, a Isabel. “O artista vai tentando encontrar essas frestas, esses silêncios que gritam muitas vezes pra poder expressar algo que está sufocado. E aí vem uma arte mais política, que não pode perder sua potência plástica.”
A relação entre política e arte, porém, não funciona apenas em regimes ditatoriais – e permanece atual no Brasil de hoje. “A gente tem necessidade de contrapor a violência que sofre com a beleza da vida, da criação”, diz Simone Spoladore, que vive a atriz e ex-golpista Dora/Vera. “Acho que agora nesse momento do Brasil talvez isso seja um lado bom de tudo o que pode estar acontecendo, que é a gente se reunir e criar mais coisas. Não estou fazendo uma apologia ao sofrimento. É que nesses momentos em que a repressão é muito forte, parece que a gente reage com mais vigor, mais vida”.
“Família virou quadrilha”
A nova temporada de “Magnífica 70” mostra como os personagens têm lidado com as consequências dos eventos da primeira, incluindo um assassinato, um ano e meio depois.
“Cada um de nós chegou na 'Magnífica' e fez da 'Magnífica' uma família. Mas essa família virou quadrilha”, avalia Winter. “A gente está trazendo uma série de culpas, crimes, fantasmas e responsabilidades que a gente tenta resolver, mais uma vez lançando mão dos mesmos artifícios -- a arte, o filme, você gravar a ficção tentando mostrar a realidade, e subvertendo a realidade”.
Para Garib, esta temporada tem sido mais sombria do que a primeira. “É mais sombria, mais nervosa, mais tensa, todos estão no limite e, paradoxalmente, mais unidos. E assumiram de vez esse ofício de fazer cinema juntos, mas têm que pagar as consequências, não só de fazer cinema, que é uma barra pesada, mas também pelo que fizeram na temporada anterior.”
A trama é ainda mais pesada para Dora, que tem sido pressionada pela polícia pela morte de Larsen (Stepan Nercessian). “A Dora está carregando uma culpa porque ela matou um homem. Ela não é uma assassina. Ela é uma pessoa que matou alguém pra salvar os seus amigos. E ela vai viver esse processo de entender o que ela fez. Ela vai enveredar por caminhos tortuosos e vai encontrar o lado sombrio dela”, adianta.
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