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Globo irrita polícia e deputados ao exibir PM racista em "Malhação"

O casal Anderson (Juan Paiva) e Tina (Ana Hikari) de "Malhação - Viva a Diferença" - Ramon Vasconcelos/TV Globo
O casal Anderson (Juan Paiva) e Tina (Ana Hikari) de "Malhação - Viva a Diferença" Imagem: Ramon Vasconcelos/TV Globo

Carolina Farias

Colaboração para o UOL

31/05/2017 17h57Atualizada em 01/06/2017 14h11

O capítulo de terça-feira (30) de "Malhação - Viva a Diferença" revoltou a Polícia Militar de São Paulo, entidades que representam os policiais e os deputados federais Major Olímpio (SD-SP) e Capitão Augusto (PR-SP).

O parlamentar protocolou nesta quarta uma representação na PGR (Procuradoria Geral da República) e no Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações contra a Globo por uma cena em que um policial militar faz uma abordagem racista. A PM publicou uma nota repudiando a maneira como a Globo retratou a corporação.

"A Polícia Militar do Estado de São Paulo repudia, com total indignação, a cena veiculada na novela 'Malhação' [...] na qual dois jovens personagens foram abordados por um policial militar, com figurino semelhante ao utilizado pela PM paulista, que os tratou de forma discriminatória e racista. Ao contrário da cena reportada, a Polícia Militar segue fielmente os princípios constitucionais e basilares do respeito aos Direitos Humanos [...]", publicou a PM em seu blog.

"A cena generalizou toda uma Instituição, formada por pessoas dignas, mães e pais de família, que trabalham em São Paulo, diariamente chamados e reconhecidos pela nobreza das ações que realizam. Os feitos positivos da Polícia Militar paulista e as ações destemidas de seus integrantes são evidentes e sobrepõem-se, inquestionavelmente, aos desvios de conduta que são pontuais. Cenas lamentáveis como induzir o telespectador a criar uma concepção falsa de sua polícia distorcem a realidade de sua essência de conciliação e abnegação", completou a Polícia Militar.

De acordo com o documento elaborado por Major Olímpio, a emissora viola os artigos 220 e 221 da Constituição ao “veicular programa ofensivo à instituição pública com caráter discriminatório e de estímulo a práticas racistas contra pessoa de origem oriental e negra”.

O episódio mencionado por Olímpio, que trabalhou na corporação por 29 anos, traz uma cena em que policiais militares abordam o casal Anderson e Tina, que estavam em uma moto. Na sequência, o policial olha o documento da garota e o que segue é o diálogo a seguir:

Policial Militar: Posso saber o que o senhor faz com uma menor?

Anderson: Somos namorados, senhor.

PM: Pascoal, o negão está falando aqui que namora com a japinha.

Tina: Qual o problema?

PM: Resolveu falar agora, japa?

Tina: Não pode falar assim com a gente.

PM: E como é que tenho que falar então?

Anderson: Deixa ela, mano.

PM (Com dedo em riste): Escuta aqui, não estou falando contigo rapaz e mano é gente da tua cor.

Tina: Você está louco, isso é racismo.

PM: Ô Pascoal, isso aqui é desacato a autoridade, não é não? Bora levar eles para o DP, hein? O negão vai em cana direto se você não ficar quietinha, viu japa? Acho bom ligar para seu pai logo senão a coisa vai feder para você e seu namoradinho aqui.

O policial finaliza a situação com o pai da jovem fazendo uma insinuação, mas o pai da adolescente nega a proposta.

“O senhor tem certeza que não quer que a gente cuide do garoto?”, diz o PM.

Em um vídeo publicado em sua página no Facebook, o deputado diz que as cenas são impróprias.

"[As cenas] estão induzindo a população de que os policiais são criminosos, preconceituosos, em relação a raça, a cor, que são violentos e que são corruptos recebendo propina. Fomos ao Ministério das Comunicações porque a Rede Globo tem concessão pública para operar o veículo de comunicação. E protocolamos aqui na procuradoria pelos crimes manifestados”, explicou o parlamentar.

Ao lado dele no vídeo está o coronel Elias Miler, da ONG Defenda PM, uma associação de oficiais militares do Estado de São Paulo. O policial explica o que pode acontecer com a representação.

“A Rede Globo é uma concessão federal, assim cabe à PGR mover uma ação civil e ao mesmo tempo pedir ao Ministério das Comunicações que a responsabilize administrativamente. A procuradoria é garantidora dos direitos coletivos e difusos, bem como protege serviços essenciais, entre eles a segurança pública prestada pela PM”, afirmou o policial.

O oficial e o parlamentar ainda estimulam que outros policiais entrem com ações individuais ou coletivas contra a emissora.

“Vamos disponibilizar um modelo de ação por reparação que pode ser feito individualmente ou por associação. Espero que sirva de exemplo porque a Rede Globo terá que responder a isso e pare com essas cenas que são totalmente ofensivas, impróprias e um desserviço à nação”, diz Miler.

O deputado, que é policial aposentado da PM paulista, alega que o comportamento dos policiais na cena não condiz com a conduta de policiais não só de São Paulo, mas do país.

“Tomara que todos os policiais que se sentirem injustiçados demandem judicialmente. Não podemos apanhar calados. São 185 anos de luta, muitos dos nossos morreram, perderam saúde e estão em cadeiras de rodas defendendo a sociedade. Não é justo que todo esse trabalho de conscientização, de aproximação da sociedade, seja quebrado por imagens dessa natureza, que não condizem com a realidade e o posicionamento dos policiais militares do Brasil”, conclui.

Por meio de sua assessoria de imprensa, a PGR informou que a representação será analisada. O ministério não respondeu o que fará com a representação até a conclusão da reportagem.

O deputado federal Capitão Augusto, eleito pelo PR (Partido da República) e fundador do

Por meio de nota, a assessoria de imprensa da TV Globo afirma não ter conhecimento da representação e que a obra de ficção recria situações que podem ocorrer na vida real. Segue a nota na íntegra: 

"Não recebemos a representação citada, tomamos conhecimento apenas pela imprensa. A atual temporada de ‘Malhação’, chamada ‘Viva a Diferença’, se propõe exatamente a discutir as diferenças culturais, sociais, de opiniões, de raça, tão presentes no Brasil. A trama explora as dificuldades e as belezas da convivência de pessoas tão diferentes e fala sobre respeitar a opinião, a posição e a cultura do outro. A intenção é mostrar como a convivência entre diferentes tribos pode ser enriquecedora. Como uma obra de ficção, ‘Malhação’ recria, livremente, situações que podem ocorrer na vida real, buscando apenas tecer o pano de fundo para suas histórias."