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"Polícia já colocou revólver na minha cara", diz mãe de Bibi Perigosa real

Elizângela interpreta Aurora, a mãe da Bibi (Juliana Paes) em "A Força do Querer". A professora Fátima, mãe de Fabiana Escobar, a Bibi Perigosa da vida real, se emociona e se identifica com as cenas da personagem com  o neto  - Estevam Avellar/Globo e Arquivo Pessoal
Elizângela interpreta Aurora, a mãe da Bibi (Juliana Paes) em "A Força do Querer". A professora Fátima, mãe de Fabiana Escobar, a Bibi Perigosa da vida real, se emociona e se identifica com as cenas da personagem com o neto Imagem: Estevam Avellar/Globo e Arquivo Pessoal

Marcela Ribeiro

Do UOL, no Rio

05/09/2017 04h00

As cenas em que Aurora (Elizângela) aconselha a filha Bibi (Juliana Paes) e chora ao lado do neto Dedé tem emocionado o público em "A Força do Querer". Na vida real, Fátima Escobar se identifica ainda mais pois passou por momentos semelhantes ao ver a filha Fabiana, que inspirou Gloria Perez a criar Bibi, cada vez mais envolvida e correndo risco ao ficar casada durante 14 anos com o traficante Saulo da Rocinha, conhecido como Barão do Pó, com quem teve dois filhos.

"Muitas lágrimas rolaram. A Elizângela está representando muito bem. Me emociono com as cenas em que ela tenta proteger o Dedé. A minha ansiedade era muito grande de proteger as crianças. Quando não estava com eles, ficava no telefone. Eu queria estar sempre por perto, achava que comigo eles estariam mais protegidos", conta a professora aposentada de 66 anos.

Elizângela disse no "Mais Você" que Aurora tem mexido muito com ela e até chegou a chorar ao rever a cena em que Bibi decide ir morar de vez no morro.

"Não adianta qualquer coisa que você diga. O filho quando mete uma coisa da cabeça, quando ele resolve fazer, quando você perde essa rédea, não tem mais o que fazer. Se tiver que ir, vai fazer, vai quebrar a cara. É uma impotência muito grande", disse a atriz.

Em meio a muitos momentos de tristeza, Fátima recorda um episódio em que o neto se assustou com a movimentação de seguranças do tráfico e a polícia na Rocinha. "Teve uma vez que ele ficou tão arredio, que ele foi para cima do guarda-roupa."

A professora Fátima Escobar e a filha Fabiana Escobar, a Bibi Perigosa - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
A professora Fátima Escobar e a filha Fabiana Escobar, a Bibi Perigosa
Imagem: Arquivo Pessoal

Apesar de trabalhar como diretora de uma escola municipal na época, Fátima se desdobrava para ficar sempre perto dos netos e, mesmo dando muitos conselhos em vão para a filha, e até após se oferecer para sustentar a família para Saulo deixar o tráfico, nunca pensou em virar as costas para ela.

"Ficava com muita pena dela. Em nenhum momento pensava em direcionar a polícia para eles. Queria sempre conversar. Eu pedia muito para as pessoas próximas, amigos, conversarem com ela para tentar descobrir o que estava acontecendo. Eu achava que era um problema psicológico, ela estava muito nervosa", diz.

A professora andava pelas ruas apavorada, pois sabia que a polícia a acompanhava para tentar descobrir qualquer pista para prender Saulo.

"A polícia já colocou revólver na minha cara. Cada vez que os policiais iam para porta da escola, eu ficava em pânico", lembra ela, que certa vez foi para uma festa com os netos em que os policiais ficavam disfarçados de manobrista, segurança e garçom aguardando a presença do genro, que não foi ao evento.

O momento mais duro na vida da professora foi quando o genro foi preso pela primeira vez, em 2005. "A questão me emocionou muito. Fiquei sem chão, minha casinha caiu quando olhei a reportagem no 'RJ TV' e aquilo parecia um pesadelo. Fiquei de cama uma semana com aquela notícia", lembra.

Após a primeira prisão, Saulo conseguiu fugir e ficou vivendo escondido com a família em Maragogi, litoral de Alagoas, até ser novamente preso em 2008. "Fiquei triste demais. A gente não podia mais se comunicar por carta, nem por telefone, porque era tudo grampeado. Meu marido estava com câncer nessa época, a Fabiana se preocupava e não tinha como ter notícias. Esse momento foi muito difícil."

A mãe de Fabiana começou a perceber que o genro estava envolvido em algo errado quando começou a vê-lo se afastar com frequência para atender ligações. "Sabia que estava fazendo algo errado, só não imaginava que era algo tão grande" diz. Saulo é descrito por ela como um homem tranquilo e carinhoso.

"Ele era muito bonzinho. Tenho até hoje um cartãozinho em que ele dizia que eu era como uma mãe para ele. Era bom pai, muito amoroso. Os professores dele comentavam comigo que ele era um rapaz tão educado, todos ficaram surpresos com o envolvimento dele", lembra. 

O contato com o genro continuou durante alguns anos em que ele esteve preso. A professora disse que ficou decepcionada quando ele decidiu se afastar, após se separar de Fabiana, em 2010, e mandar uma carta. "Eu escrevia e ele não me respondia. Aí comentei com a minha neta, que deve ter falado pra ele. Então ele escreveu dizendo que não queria saber de mais nada. E falou: 'Se precisarem de alguma coisa vocês vão traficar'. Achei um absurdo e aí dei por encerrado nosso contato."

"Fiquei magoada porque com essas ganancias, ele escangalhou uma família inteira. Fiz várias ações para tentar ajudá-lo. Emocionalmente, a Fabiana ficou escangalhada", diz.

Saulo está preso desde 2008, quando foi encontrado com sua família vivendo em Maragogi por policiais. Na ocasião, o traficante que tinha sido condenado a 18 anos de prisão, estava foragido desde dezembro de 2005. Ele fugiu da Polinter, no Grajaú, zona norte do Rio, após seis meses de detenção.

Ex-carteiro, o criminoso foi acusado de fornecer drogas para favelas do Rio, incluindo a Rocinha, e de manter um laboratório para refino de pasta de cocaína trazida da Bolívia. Ele também foi apontado pela Polícia Federal na ocasião como um dos principais fornecedores de armas e munições do Rio.

O traficante está atualmente no Instituto Penal Ismael Pereira, Sirieiro, em Niterói e teve o pedido de progressão de regime semiaberto para aberto negado pelo juiz Rafael Estrela, titular da Vara de Execuções Penais (VEP) no mês passado.

A professora não teme que o ex-genro possa querer se vingar da família por algum motivo. "Não acho que ele seria capaz de tomar alguma atitude contra a mim e sua família. Eu o conheço", conclui.

Fátima guarda até hoje um cartão que Saulo mandou para ela - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Fátima guarda até hoje um cartão que Saulo mandou para ela
Imagem: Arquivo Pessoal