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"Doença não é castigo", diz Giovanna Lancellotti sobre síndrome de Rochelle

Rochelle (Giovanna Lancellotti) internada com a Síndrome de Guillain-Barré em "Segundo Sol" - Paulo Belote/TV Globo
Rochelle (Giovanna Lancellotti) internada com a Síndrome de Guillain-Barré em "Segundo Sol" Imagem: Paulo Belote/TV Globo

Marcela Ribeiro e Paulo Pacheco

Do UOL, no Rio e em São Paulo

05/10/2018 04h00

No ar como Rochelle, a vilãzinha da família Athayde em "Segundo Sol", Giovanna Lancellotti, 25, considera um desafio importante em sua carreira e um "dever cumprido" quando ouve nas ruas as pessoas falando que amam odiá-la. Nos últimos dias, a personagem, no entanto, conseguiu sensibilizar muita gente quando foi diagnosticada com a síndrome de Guillain-Barré, doença autoimune grave que afeta o sistema nervoso central e causa problemas motores.

Para as cenas, a atriz precisou emagrecer em tempo recorde: "Poderia ter perdido um pouco mais. Eu tive pouquíssimo tempo, recebi os capítulos e em menos de dez dias já comecei a gravar. Consegui perder quase quatro quilos fechando a boca, tomando chá, malhando e correndo".

Ela também contou com a ajuda das preparadoras Katia Achcar e Patricia Carvalho e conversou com algumas pessoas que tiveram a doença.

"Corri atrás para saber mais dos sintomas e como é o processo de recuperação. Meu pai e meu padrasto são médicos e me ajudaram muito com a parte teórica. Muita gente também entrou em contato comigo pelas redes sociais. Tem sido muito importante, não só para construir a Rochelle, mas pessoalmente é inspirador ver a força das pessoas, ouvir suas histórias e aprender com elas. Todas me comovem porque passam por um longo processo de recuperação e vibram a cada vitória, a cada passo dado", conta.

Lancellotti explica que levou um susto quando descobriu que a personagem teria a síndrome.

"É horrível. A pessoa sente muita dor, é uma impotência ali, você não sabe se vai durar muito tempo, se você vai melhorar rápido. Você não tem certeza de nada. Eu finjo sentir, mas não estou sentindo. Preciso só passar [para o público] que estou sentindo."

"Quem está passando por isso merece todo o meu respeito, porque é uma fase muito difícil, a pessoa precisa ser muito corajosa, ter muita garra, ter muita fé, muito apoio da família. Isso mexeu bastante com a minha cabeça e como eu vejo as coisas", completa.

"Em três dias estava tetraplégica"

A professora de capoeira Jaqueline Ferreira, 31 anos, é um exemplo disso. Ela foi diagnosticada com a síndrome em dezembro de 2015 e não consegue esquecer o desespero ao ver os sintomas avançarem tão rapidamente.

A professora de capoeira Jaqueline Ferreira em dois momentos: À esquerda, ao lado da família, ainda no hospital, se recuperando da síndrome guillain barre, e à direita em foto atual - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Jaqueline em dois momentos: À esquerda, ao lado da família, ainda no hospital, e em foto atual
Imagem: Arquivo pessoal


"Começou com fraqueza e formigamento no braço direito, em seguida, no braço esquerdo, em três dias estava tetraplégica, só mexia os olhos. Fiz ressonância magnética e não apareceu nada. A saúde aqui é precária... Fui diretamente para a UTI e fiquei entre a vida e a morte", lembra.

Em apenas 10 dias, ela perdeu 17 quilos e quase ficou com diafragma comprometido.

"Tive alta ainda tetraplégica. Após quatro meses, mexi os braços, após quase seis meses dei os primeiros passos. Dormi professora de capoeira, acordei paraplégica. Hoje uso muletas, não corro, não pulo, não agacho. A fisioterapia fará parte da minha vida eternamente. Sou canhota e alguns dedos da mão esquerda não se abrem por completo", conta.

Jaqueline diz que fica emocionada e até evita assistir as cenas de Rochelle no hospital em "Segundo Sol".

"As cenas da novela me fazem relembrar todo o sofrimento que senti, a cada cena, uma lágrima cai. No caso dela o diagnóstico foi rápido, mas na realidade não é assim. Sabemos que ali é uma ficção, que não é assim tão fácil, ainda mais quando se trata do SUS."

Nos próximos capítulos, Rochelle receberá alta do hospital e começará um tratamento em casa para recuperar seus movimentos. O público verá a jovem mais humana e a família mais unida para ajudá-la na recuperação.

"Acho que todo mundo merece uma segunda chance. E a Rochelle vai passar por um processo de redescoberta de si e das pessoas que a cercam. Acredito que a mudança venha disso, desse renascimento que ela vai experimentar ao passar por uma situação tão delicada. Pelo menos, é o que torço para que aconteça [risos]. Não acho que você passe por algo assim e não se transforme. Torço para que com ela seja assim".

Ela não acredita que o autor João Emanuel Carneiro tenha escrito a doença de Rochelle como um castigo por conta de suas vilanias e não crê no ditado aqui se faz, aqui se paga.

"Não gosto desse pensamento porque isso não é verdade. Doença não é castigo, não é falta de merecimento. Ela acontece e pode ter tantos motivos para isso. No caso da Síndrome de Guillain-Barré, não há como prever. É uma reação do sistema imunológico".

Giovanna torce pela redenção e felicidade de Rochelle: "Acho que antes de pensar num amor romântico, ela tem uma recuperação aí do amor familiar: com a irmã, os pais, o tio... Essa jornada será muito importante para ela".

Mesmo com tantas maldades em cena, a atriz consegue tirar um lado bom da personagem para levá-lo com ela após a novela. "Eu e Rochelle temos a determinação em comum. E isso vou continuar levando comigo. Claro que, até aqui, usamos isso de forma bem distinta. Mas vamos ver o que o futuro [e o João] reserva para ela agora!"

Falso estupro

Rochelle (Giovanna Lancellotti) fingiu ter sofrido tentativa de estupro por Roberval (Fabricio Boliveira) - Reprodução/Globo - Reprodução/Globo
Rochelle (Giovanna Lancellotti) fingiu ter sofrido tentativa de estupro por Roberval (Fabricio Boliveira)
Imagem: Reprodução/Globo


A cena da falsa acusação de estupro de Rochelle, que foi ao ar pouco antes de ela ser diagnosticada com a doença, repercutiu mal para boa parte do público, que considerou um desserviço, num momento em que muitas mulheres são vítimas de agressões e feminicídio. Giovanna diz que, como atriz, está em cena para contar as tramas que o autor escreve.

"Não podemos misturar as coisas. Rochelle fez algo grave, uma acusação falsa que compromete não só quem foi acusado, mas muitas pessoas que passam por isso de verdade. Outra coisa é que Rochelle sempre, desde o começo, tem um desvio de caráter, faz o que acha que precisa para conseguir o que deseja, sempre fez suas vilanias sem se importar com nada", diz.

Assim que a cena foi ao ar, Lancellotti manifestou repúdio ao falso estupro: "Eu já tinha planejado, desde o dia em que li e gravei, que assim que a cena saísse eu iria me posicionar. As pessoas receberam muito bem, elas abominaram muito em relação à Rochelle, não foi uma coisa comigo".