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'O racismo faz você acreditar que é feia, suja e inferior', diz MC Carol

MC Carol - © Vincent Rosenblatt/© Vincent Rosenblatt
MC Carol Imagem: © Vincent Rosenblatt/© Vincent Rosenblatt

Do UOL, em São Paulo

20/06/2020 10h09

A cantora MC Carol fez anteontem um longo desabafo em seu perfil do Facebook contando casos em que sofreu racismo ao longo da vida. No texto, a funkeira afirma que o racismo é capaz de fazer uma pessoa se sentir feia, suja e inferior.

"O racismo é assim: ele te envergonha, te coloca para baixo. Faz você acreditar que você é muito menos do que uma pessoa branca, que você é feia, suja, inferior", escreveu Carol, que alerta para os casos em que o racismo é capaz de afastar os negros na sociedade.

"[O racismo] faz você ficar contra os seus, não se relacionar amorosamente com os seus. Te coloca medo, pavor de andar à noite de roupas escuras num grupo de pessoas pretas", disse.

Para Carol, o racismo coloca a população negra em estado de alerta constante. "Deixa você apreensivo ficando perto da bolsa de alguém ou na casa de algum branco", citou. "O racismo te pega quando você menos espera e, na maioria das vezes, você trava."

"Você fica tão chocada que paralisa, a lágrima vem e você não consegue falar nada! Mas a gente tem que falar, a gente precisa falar", defendeu a funkeira.

"O racismo te causa traumas incuráveis", reforçou ela, que confessou sentir constrangimento ao entrar em lojas e restaurantes até hoje, "mesmo tendo dinheiro".

Sem nenhum filho ainda, Carol se diz preocupada com a conversa sobre racismo que terá com eles um dia. "Eu não sei como vou falar pra minha filha que ela vai sofrer, ser excluída, humilhada e talvez morta por conta da cor da pele dela, que a vida pra ela vai ser 100 vezes pior e mais pesada e que ele não vai poder ter a liberdade de uma criança branca", declarou.

Racismo na escola

No longo texto, a cantora fala sobre algumas das vezes em que foi afetada pelo racismo no ambiente escolar. Ela conta que seus avós, quando decidiram deixar o morro em que moravam, quiseram colocar Carol em uma escola particular.

"Eu passei na porta e só tinham crianças brancas. Ameacei fugir de casa de meu avô fizesse isso [colocar na escola particular] comigo!"

Crente de que a menina sofreria menos, o avô matriculou a neta em um colégio público. No entanto, a funkeira relata que pouca coisa mudou no cenário. "Nem a professora falava comigo, foram meses assim", confessou.

"Eu morava em Venda das Pedras [bairro da cidade de Itaboraí (RJ)], quando chovia tinha que colocar sacola no pé porque tinha muita lama, era horrível", relatou. "Chegada no colégio e era desprezada, faziam piada com a minha roupa, riam do meu cabelo, do meu corpo, falavam coisas baixinho com olhar de nojo."

Ela disse que sentia vergonha de comer na escola e ficar no pátio com as outras crianças. "Eu me escondia todos os dias na biblioteca", contou.

"Era uma luta diária. Eu passava por tudo isso porque eu queria ser alguém, dar uma vida melhor pros meu bisavós, retribuir o que nunca foi obrigação deles", escreveu.

Racismo depois da fama

MC Carol conta no texto um caso de racismo que sofreu depois de já ter ficado famosa, na época das gravações de Lucky Ladies — que mostrava o cotidiano de algumas das maiores funkeiras do país. As gravações do reality show eram feitas em Copacabana, bairro nobre da cidade do Rio de Janeiro.

A cantora relata que foi ajustar um vestido em um ateliê em companhia com uma moça estrangeira branca da produção do programa e parou em um restaurante de fast food para pegar um sanduíche, já que não tinha tempo para um almoço. Carol pediu para a moça chamar um táxi enquanto ela pedia o lanche.

"Ela estava me aguardando dentro do táxi. Entrei no carro com o pacote fechado e dei boa tarde. O taxista olhou no retrovisor e começou a gritar comigo, mandando eu sair do táxi dele", disse. "Ele foi muito agressivo, nem esperou eu descer e já foi abrindo a porta de trás. Parecia que ele iria me agredir."

Ela achava que o taxista estava implicando por conta do lanche e disse que não comeria nada no carro dele. "Ele só gritava que era para eu sair, que ele não iria mais para Ipanema. Aos poucos eu fui percebendo que não se tratava do lanche, se tratava da minha cor!"

Muitas pessoas brancas, que nunca vivenciaram isso, não conseguem entender e Carol entende. "É um absurdo você ser maltratado, humilhado, agredido e morto pela cor da sua pele", afirmou.

"Se eu fosse branca e morasse em Copa, dificilmente acreditaria. Assim como é difícil de acreditar que um pai tem coragem de estuprar sua própria filha, sabe?", concluiu.

Confira o texto na íntegra: