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Trace Brazuca, canal afrourbano, estreia no Brasil: "Negros querem se ver"

Parte da equipe do novo canal Trace Brazuca - Divulgação
Parte da equipe do novo canal Trace Brazuca Imagem: Divulgação

Daniel Palomares

Do UOL, em São Paulo

22/07/2020 13h24

O Brasil é um país formado por uma população 54% negra, a maior do mundo fora da África. Se contarmos também os pardos, esse número chega a mais de 70%. Diante deste cenário, a existência de um canal de TV voltado para a cultura negra parece elementar. É o que defende José Papa, CEO da Trace Brasil, que estreia no dia 25 seu novo canal à cabo, o Trace Brazuca.

Veio tarde demais, com 30 anos de atraso. Enquanto o movimento negro fortaleceu uma classe média negra nos EUA nos anos 1970 e 1980, o Brasil se atrasou. É da periferia que nascem os grandes movimentos que são a força locomotora desse país. Ao invés de colocar a história da negritude ligada a sofrimento, mostramos o que há de melhor.

O Trace Brazuca, que chegará nas operadoras Vivo e Claro, mesclará conteúdos musicais, obras de ficção e documentários de criadores negros, além de outras atrações voltadas a ciência, tecnologia, empreendedorismo, culinária e história africana. O que começou no Brasil em novembro do ano passado como um programa semanal na RedeTV!, o "Trace Trends", agora se expandirá na nova plataforma. Outros 20 canais Trace já são exibidos no continente africano, na Europa e nos Estados Unidos.

É um passo muito importante no audiovisual brasileiro. A Trace não é o primeiro canal negro no Brasil, mas é o primeiro voltado ao afrourbano, voltado a pessoas pretas e periféricas. Elas querem se ver e contar suas próprias histórias. O Brasil nunca teve esse lugar de criação de conteúdo de pessoas negras que não querem se ver de formas caricatas. Nós precisamos criar espaços para inclusão. É um sonho muito antigo.

Ad Junior, head de Marketing do Trace Brazuca

Pé na porta

Para a semana de lançamento, uma programação especial foi pensada, incluindo playlists musicais de cantoras negras latinoamericanas e caribenhas, além de uma série de filmes e documentários dirigidos por Sabrina Fidalgo, uma das mais influentes cineastas negras do Brasil, e que reforça a importância de narrativas afrocentradas.

A estratégia é o pé na porta! Foram tantos anos de silenciamento. Nós, como maioria absoluta da população, vivemos praticamente um estado de apartheid econômico, decretado silenciosamente. Não detemos o poder atrás das câmeras, mas fazem filmes com nossos impostos, sem que a gente se veja. O mais importante agora é que pessoas negras tenham espaço para mostrar sua visão de mundo e contar suas próprias histórias.

Bonitona ela, né?

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A urgência de criar produções voltadas ao público negro e celebrar a cultura afrourbana se tornou mais latente do que nunca, especialmente depois dos movimentos antirracistas que tomaram o mundo nos últimos meses, após o assassinato de George Floyd nos EUA.

Projetos voltados a teledramaturgia e até programas de viagens ainda estão em planejamento, mas devem ganhar gás somente após a pandemia. Ad Junior defende que o Trace Brazuca quer ressignificar a história e a experiência do povo negro para o Brasil.

Queremos normalizar que nossas histórias não passam somente pela dor. É um canal que quer falar com todo mundo. Ao mesmo tempo que não falamos diretamente sobre racismo estrutural, estamos trazendo narrativas que combatam essa existência do racismo. Precisamos mostrar que essa cultura importa.