Eu não conhecia Amora Mautner pessoalmente, apesar de nos falarmos há algum tempo por WhatsApp. Mas a sua fama eu já sabia qual era: a de ser uma mulher temida dentro da Globo. Diretora de "A Dona do Pedaço", ela acumula dezenas de novelas em seu currículo e é conhecida por ser intensa, perfeccionista e exagerada.
Quando entrou na enorme sala de seu apartamento, na quadra da Praia do Leblon, onde eu a aguardava para esta entrevista, muitas informações se confirmaram em poucos segundos. Falando alto, rápida nas palavras, inquieta, Amora, 44 anos, exalava vida. Parecia um vulcão em erupção. Raramente dá entrevista, até porque a TV Globo sabe que a diretora é verdadeira demais. Amora é profunda.
Filha do tropicalista Jorge Mautner, ela lembra a infância, quando dividia a casa com o pai, a mãe (a historiadora Ruth Mendes) e o namorado da mãe. "Normal para o final dos anos 1970", pondera. Para mim, nascido no mesmo ano que ela, no Méier, aquela configuração familiar não parecia assim tão normal. "Mas o Méier vive dez anos atrás", retruca. Assim é Amora.
Como diretora, assinou obras que entraram, de formas distintas, para a história recente da TV: da sensacional "Avenida Brasil" (2012) à decepcionante "A Regra do Jogo" (2015).
Não é tarefa fácil acompanhar sua inteligência. Por diversas vezes tive que interromper a entrevista e dizer que não estava entendendo nada do que ela falava. O vocabulário rebuscado pode ser fruto da vasta cultura ou apenas uma fuga estratégica de algumas perguntas.
Ela mistura Deus com física quântica, mostrando um discurso espontâneo, embasado e consistente. Amora é coerente, cheia de contradições e, por isso mesmo, fascinante. Sua franqueza, suas histórias e seu autoconhecimento impressionam.
Com vocês, a mulher que jamais passa incólume na TV Globo.