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Local onde Domingos Montagner se afogou está sem salva-vidas há dois anos

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Canindé do São Francisco (SE)

16/09/2016 13h24

O acidente que resultou na morte do ator Domingos Montagner poderia ter tido outro desfecho caso houvesse salva-vidas e equipamentos no local. A análise é do ex-profissional que atuou no local por anos e fez vários salvamentos.

Manoel Messias trabalhou por sete anos como salva-vidas na prainha em Canindé do São Francisco. Ao UOL, ele inclusive mostra um livro de ocorrências com nomes e relatos de casos de afogamento no período em que atuou.

"É muito comum gente se afogar aqui, o rio é forte, e os inexperientes sofrem. Isso ocorre especialmente em período de festas, como o Carnaval, quando aqui está lotado", conta.

Segundo ele, se na hora do acidente com o ator Domingos Montagner houvesse um salva-vida e um barco a postos, seria possível tentar um resgate. "Daria tempo chegar lá com ele vivo, com certeza. Levaríamos menos de um minuto para chegar, e uma pessoa não se afoga para morrer nesse período. E a Camila começou a gritar quando ele ainda estava consciente lá, ou seja, teríamos como salvá-lo. Fiz muitos resgates assim", contou.

Messias diz que deixou de atuar há dois anos no local, período então que teria deixado de haver profissionais na área. "A prefeitura foi atrasando salário, eram 11, ficaram seis, depois cinco e depois só eu. Fiquei três meses sem receber salário e sai também", conta.

Barco falhou

16.set.2016 -  Patrícia Santos, administradora, diz que o motorista de Pitanga e Montagner chegou a perguntar se não deveria questionar moradores sobre questão de risco no local - Beto Macário/UOL - Beto Macário/UOL
Patrícia Santos, administradora, diz que barco que seria usado pela polícia para ir atrás de Montagner não funcionou
Imagem: Beto Macário/UOL

Outro problema para salvar Domingos da água ocorreu porque um barco de pescadores --e que estava parado na orla-- não funcionou. "Havia policiais e mais pessoas aqui, e quando a Camila gritou, tentaram pegar esse barco e ir, mas o motor não funcionou. Tiveram de ir andando", disse o vigia da orla, Vanildo Martins.

A versão de que o barco não funcionou foi confirmada por outra testemunha que chegou ao local logo após Camila Pitanga pedir socorro, a administradora Patrícia Santos.

Ele conta que viu, inicialmente, o motorista da equipe pedir socorro na rua de acesso à prainha para salvar Domingos.

"Eu perguntei porque eles teriam ido mergulhar naquele local perigoso, e ele disse que chegou a questionar os atores se deveria perguntar a moradores sobre possível restrição, mas eles negaram porque queriam privacidade e achou que aquilo poderia chamar a imprensa", conta.

A administradora disse também que Camila Pitanga estava desesperada e gritava muito. "Não sabia se era chorou ou desespero máximo, foi algo horrível, ontem não consegui dormir lembrando dessa imagem", afirmou, citando que foi ela quem recolheu e entregou as roupas deixada pelos atores no local onde mergulharam.

Casos comuns
O policial Joab Vicente atua há 16 anos em Canindé e conta que as mortes investigadas no local são comuns. "Não tenho números exatos, mas nesse período foram umas duas por ano", contou.

Ele explica que muitos dos acidentes fatais também ocorreram durante as noites, quando não havia mais salva-vidas. "A pessoa toma bebida alcoólica e vai dar um mergulho, aí acontece o acidente em muitos casos", lembrou.

Afogamento "clássico"
Na manhã desta sexta-feira (16), o delegado Antônio Francisco Filho esteve no local do acidente para fazer análises e disse que o caso se trata de um tipo clássico de "afogamento."

'Apenas confirmamos tudo que a Camila já havia dito, ele tentou nadar contra a correnteza, cansou e acabou sendo tragado. Vou apenas ouvir os bombeiros que fizeram o resgate para fechar o inquérito e encaminhar ao Ministério Público", disse.

Sobre a falta de placas e material humano e técnico para salvamentos, o delegado disse que se ateve apenas a investigar as causas do acidente, e que vai aguardar uma manifestação do MP.