Para figurinista, "Velho Chico" estimula reflexão ao resistir a críticas

Destituído do pomposo título de Saruê, Afrânio (Antonio Fagundes) vai aparecer diferente nos últimos capítulos de "Velho Chico", segundo o diretor Luiz Fernando Carvalho. Alvo de críticas e de estranhamento durante boa parte da novela, que fez muita gente se perguntar em que época se passava a trama de Benedito Ruy Barbosa, o visual excêntrico e a tão falada peruca serão deixados de lado. Na reta final, o enfraquecido coronel deixa, enfim, de ser caricatura de si mesmo e símbolo do retrógrado sistema de poder vigente em Grotas do São Francisco.
Segundo a figurinista da novela, Thanara Schonardie, a reação do público era esperada. "A novela abrange um público muito diversificado, é natural que uma proposta de figurino contemporâneo que, por exemplo, abre mão do uso de calça jeans cause estranhamento no espectador", diz.
Citando Encarnação (Selma Egrei) como exemplo, ela acrescenta que a proposta foi assimilada depois de um tempo. "Na primeira fase ela era a mais criticada, por usar trajes do século 19, em plena década de 60. Na segunda fase, é um dos personagens favoritos, pois a essência do personagem cativou o telespectador ultrapassando as aparências, apesar de suas roupas continuarem paradas naquele tempo", analisa.
O modo de vestir é determinante na forma como o indivíduo se posiciona no mundo. Ele deve revelar suas memórias, maneira de pensar e agir, ao invés de simplesmente reproduzir uma imagem pronta
Thanara Schonardie, figurinista
De acordo com a figurinista, o conceito partiu do diretor, que trouxe "uma análise profunda dos potenciais arquetípicos de cada personagem". À equipe, coube traduzir tudo em materiais, cores e formas. Mesmo diante das críticas por parte do público, a opção foi não fazer modificações simplesmente para ganhar a simpatia dos telespectadores.
"A dramaturgia tem responsabilidade de formação social e cumpre seu papel quando eleva o nível cultural através da reflexão. O figurino contribui com esse movimento ao se distanciar de regras e convenções estéticas, mostrando que o modo de vestir é determinante na forma como o indivíduo se posiciona no mundo. Ele deve revelar suas memórias, maneira de pensar e agir, ao invés de simplesmente reproduzir uma imagem pronta", opina.
Segundo Thanara, outra característica do figurino de "Velho Chico" foi o esforço em representar aspectos sutis da cultura local sem estigmatizá-la. "Os conflitos de exploração humana e dos recursos naturais apresentados na novela são regionais, mas são também de ordem mundial. O sertanejo não está isolado, o que nos leva a recorrer a pontuais elementos idílicos nas representações da forma, suscitando sensações que atravessam fronteiras geográficas, são da alma humana", afirma.
Afrânio
Bem diferente do jovem idealista vivido por Rodrigo Santoro na primeira fase, o coronel em sua fase mais madura é uma figura de poder decadente. "Suas desproporções emocionais, afetivas e ideológicas são reveladas na vaidade exagerada, nas composições de cores do figurino, no uso da peruca. O resultado estético remete à sensação do mal estar político que vivemos hoje", afirma Thanara.
Tereza
A figurinista observa que elementos masculinos e femininos marcam o visual da personagem desde a infância e que eles expressam "sua forte comunhão e unidade com a natureza". "Mesmo tendo se afastado desse universo, viajando o mundo todo, em contato com as mais diversas culturas, sua essência elementar é mantida, passando por uma sofisticação na forma. O pequeno repertório de materiais utilizados remete à simplicidade, variando do linho e do algodão às transparências de tule e seda", diz.
Encarnação
Arcaicas também são as roupas da matriarca dos Sá Ribeiro, que sempre aparece em trajes que remetem ao século 19, adornados por referências barrocas. "Deslocada no tempo cronológico, vive um tempo emocional. Na segunda fase seus trajes tornam-se ainda mais contrastantes ao contracenar com personagens que chegam para questionar e corrigir padrões ultrapassados como Miguel (Gabriel Leone), Tereza e Martim (Lee Taylor)", analisa.
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