"Se começo a ver e eu não apareço, troco de canal", diz Susana Vieira
Às 23h, Susana Vieira aparece na TV diariamente dando vida a Cora, vilã de "Os Dias Eram Assim", mas é outra antagonista - também em exibição na telinha - que não sai da memória do público: a Branca de "Por Amor", em reprise no canal Viva.
"As pessoas lembram da minha última cena, com a empregada, quando a minha família me abandona. Ela, naquela solidão, diz: 'Senta aí. Mas senta na beirada que é coisa de gente rica, chique'. Ela não perdeu a pose, e câmera vai afastando, mostrando a piscina imunda. Não entendo como tem tanta gente que lembra as falas dela. Os memes da Branca são gloriosos", comenta.
Uma diferença, Susana aponta, é que a rival de Helena (Regina Duarte) tinha um certo humor sarcástico. "Tinha uma coisa de leveza da Branca, ela era engraçada, um personagem fantástico. A Cora é séria, não sorrio. Tem uma coisa meio soturna, pesada", compara.
E mesmo uma atriz com tanta versatilidade, que mostra ainda outra faceta no ar com a Maria do Carmo de "Senhora do Destino", atração do "Vale a Pena Ver de Novo", descobriu novas possibilidades em "Os Dias". A novela é a primeira em que ela trabalha com um preparador de elenco, Chico Accioly.
"Primeiro disse: 'Não preciso, não quero'. Lógico, estou aqui há 50 anos sem coach. Quando conheci o Chico e vi como seria, foi uma grande preciosidade", diz Susana, que chorou no primeiro exercício que fez com Daniel de Oliveira, que interpreta Vitor, seu filho na ficção.
"Era para eu contar uma parte da minha vida, o que viesse à minha cabeça de chocante ou de triste. E o Daniel fez a minha história como se ele tivesse passado por aquilo. Hoje eu seria uma atriz muito melhor se eu tivesse feito isso. Acho que todo mundo devia passar por um coach. Ele mexeu com a nossa sensibilidade. Quando Daniel foi fazer a cena, ele fez com muita raiva, que eu não tinha colocado. Ele colocou talvez porque é muito bom ator, inteligente, intuitivo. Sacou que o que eu devia estar por dentro era aquela raiva. Foi impressionante. Isso tudo me deu um tchan", avalia.
A linguagem de cinema proposta pelo diretor de fotografia Walter Carvalho foi outro aspecto que impressionou a intérprete.
"Quando eu vi aquela luz escura, o diretor e todo mundo falando baixo, eu falei: 'Ai, meu Deus, acho que estou fora do contexto aqui' (risos). Nunca vi, acende uma vela aqui e outra ali e começa a gravar. Nunca pensei que na minha vida ainda fosse encontrar uma coisa nova dentro da televisão. E eu já fiz de tudo. O cenário tem teto, o diretor diz para eu não me preocupar com a câmera. Isso foi me revigorando. Não dá mais para fazer outro trabalho sem ser nesse estilo", afirma.
Com o foco da novela mais em política, segundo avaliação de Susana, Cora ficava mais em segundo plano. "Eu achava que meu papel não tinha tanta importância. Falei: 'Acho que eu vou para a passeata, para aparecer lá'. O pessoal de direita era só eu, Calloni [Antonio Calloni, o Arnaldo] e o delegado [Amaral, vivido por Marco Ricca]. O resto do elenco todo naquela passeata", brinca.
"Tenho sentido mais agora, que a novela engrenou e as histórias estão mais claras,que a minha personagem entrou na novela. Vejo pelo público, porque eu erro o horário. Quando eu vejo, já começou. E se eu começo a ver um tempão e eu não apareço, eu já troco de canal. Porque eu quero me ver. Tenho talento, minha vida é isso, eu quero ver meu trabalho", afirma ela, que não gostaria que sua personagem fosse a assassina de Arnaldo. "É um carma muito pesado, mesmo na ficção", diz.
Susana diz que adora ouvir nas ruas que está bem na novela. "Essa é a recompensa de 50 anos na televisão", diz ela, que gosta de ser festejada no setor 1, no Sambódromo, no Vidigal ou em Bangu, onde fez temporada bem-sucedida do monólogo "Uma Shirley Qualquer".
"As pessoas dizem: 'Nunca pensei que você fosse tão simples', 'Olha como ela é humilde'. Como se não fosse obrigação do ser humano ser humilde com o outro. Eu, se trabalhasse no banco, seria faladeira, promoveria festas. As pessoas sabem que eu sou do Carnaval, que frequento Caxias [na Baixada Fluminense]. Meu ex-marido, pai do meu filho, foi presidente do Salgueiro. Estou naquela Avenida há 50 anos. Ajudava Joãosinho Trinta a colar lantejoulas. As comunidade sabem que eu não estou ali para me exibir", afirma ela, que se gaba de ter sido Mamãe Noel na Rocinha.
"Chamei meus netos [que moram nos EUA]: 'Venham conhecer o que é uma favela, como é que é a vida. A vida não é Miami, toda cheia de grama, não é o tênis de 130 dólares. Venham ver como a vovó é amada'", lembra.
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