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Como um convite de Silvio mudou a vida de Piccinini: "Achei que era bronca"

Paulo Pacheco

Do UOL, em São Paulo

12/09/2017 04h00

Eterno jurado ranzinza do "Show de Calouros", Décio Piccinini viu seu coração amolecer pela primeira vez em 50 anos de carreira na TV. Na última semana, quando comemorou 72 anos, ganhou uma festa surpresa dos colegas do "Fofocalizando", programa do SBT, com bolo e depoimentos da família.

"Foi a primeira vez nesse tempo todo que eu chorei no ar. Foi emocionante. Não deu para segurar, meus filhos, minha mulher, meus netos", relembra Décio ao UOL, um dia após celebrar seu aniversário na televisão.

A comemoração foi um dos únicos momentos de paz da atração que esquenta as tardes do SBT com os bate-bocas de Décio com Leão Lobo, Mamma Bruschetta e, principalmente, Mara Maravilha, que selou a união chamando o colega de "o chato mais amado do Brasil". "Estamos atropelando um ao outro. O programa representa as diversidades de opinião do público em casa", explica o jornalista.

Os barracos ao vivo eram a estratégia de Silvio para salvar o programa, que não havia emplacado desde a estreia, em agosto de 2016, quando ainda era "Fofocando". Como última cartada, o dono do SBT interrompeu suas férias e telefonou dos Estados Unidos convidando o ex-jurado do "Show de Calouros" para "incendiar" a atração como fazia no rádio, nos anos 80. O problema é que Silvio também quis contratar colegas já mortos, como Samir Achôa (1933-2008) e Consuelo Leandro (1932-1999).

"Silvio disse: 'Você lembra o programa que fazia comigo no rádio de manhã chamado Falando Francamente?', só com jornalistas e ele ancorando. E adorava, porque comia o pau nas divergências de opinião. Silvio falou: 'Quem estava com a gente? Quero o Samir [Achôa] com você!'. 'Mas o Samir morreu há dez anos!', respondi. 'Morreram todos?', 'Não, você e eu ainda não, e não pretendo ir tão cedo!'".

Silvio Santos e Décio Piccinini no "Troféu Imprensa", em 2015 - Reprodução/Facebook/Décio Piccinini - Reprodução/Facebook/Décio Piccinini
Silvio Santos e Décio Piccinini no "Troféu Imprensa", em 2015
Imagem: Reprodução/Facebook/Décio Piccinini
Em seguida, Silvio explicou qual era sua ideia para salvar o programa de fofocas: "'Quero que continuem fazendo vida artística, mas coloquem casos de jornalismo que escandalizem as pessoas, para poder quebrar o pau, um ter opinião diferente do outro e fazer aquilo que a gente fazia, porque era campeão de audiência'. Perguntei: 'Você acha que dá certo?', e o Silvio: 'Tem que dar! Tem que dar!'". Com Piccinini, "Fofocalizando" teve menos mudanças, fidelizou audiência e encostou na Record.

Mesmo convivendo com o apresentador desde as entrevistas com ele para revistas como "Intervalo" e "São Paulo na TV", na década de 1960, Décio se surpreendeu com a ligação: "Eu o conheço há 50 anos, mas ele não me telefona sempre. Se o Silvio Santos telefona para você, pode não ser grave, pode ser uma notícia boa, mas não vai telefonar para dizer 'como é que você está? Tudo bem?'".

Convite inesperado de Silvio

Outro convite inesperado de Silvio mudou a vida profissional de Décio Piccinini há 47 anos. O jornalista, que começou como office-boy e foi promovido a redator na agência de publicidade onde trabalhava, formou-se e conquistou espaço em revistas de variedades. Foi o pontapé para ir à televisão como entrevistador, primeiramente com Blota Jr. na Record e, depois, com Luiz Aguiar na Band. Ali, foi tomado pelo "homem do Baú", convidado do mesmo programa.

"Silvio falou: 'Oi, Décio, tudo bem? Depois eu preciso falar com você'. Achei que tinha dado zebra na entrevista que eu tinha feito com ele, está p... da vida e vai me dar bronca. Terminou o programa, me coloquei à disposição dele. 'E aí, Silvio, o que aconteceu?'. 'Seguinte, o Celso Teixeira está saindo do meu júri do Show de Calouros e eu preciso de alguém como ele, mas com cara de repórter. Quero que você entre'. 'Mas eu tenho um compromisso com o Luiz Aguiar'. 'Já falei com o Luiz [ele não tinha falado comigo], ele permitiu, basta você começar. E eu comecei. Era fevereiro de 1970. Saí para ver se dava certo em janeiro de 1997", comemora.

Júri do "Show de Calouros", carro-chefe do "Programa Silvio Santos" nos anos 80, no SBT - Divulgação/SBT - Divulgação/SBT
Júri do "Show de Calouros", carro-chefe do "Programa Silvio Santos" nos anos 80, no SBT
Imagem: Divulgação/SBT

"Não sou celebridade"

Piccinini ganhou fama nacional ao participar do júri do "Show de Calouros" ao lado de Pedro de Lara, Elke Maravilha, Sérgio Mallandro, Flor, Wagner Montes, Sônia Lima, Leão Lobo, Aracy de Almeida e outros colegas. E só não ficou mais tempo porque Silvio decidiu acabar com o programa, mas retornou em 2004 como jurado do "Gente que Brilha". Apesar do sucesso, ele rejeita ser chamado de "celebridade".

"Celebridade, para mim, é Silvio Santos, Roberto Carlos, era Hebe Camargo. É o cara passa na rua e não tem ninguém que diz assim: 'Você viu o... como é o nome dele?'. Eu sou um cara conhecido, graças a Deus. Silvio Santos me tornou um nome conhecido nacionalmente. Que bom, sou eternamente grato a ele. Mas não sou celebridade. Acho forte", avalia.

Antes do "Gente que Brilha", Piccinini comandou o "Programa Cor-de-Rosa" ao lado de Silvia Abravanel, filha "número 2" de Silvio. A atração, uma espécie de "Fofocalizando" mais leve, fracassou e durou apenas três meses, dando lugar ao mexicano "Chaves". Para o jornalista, uma estratégia errada do SBT encurtou a vida do programa.

"Silvio precisou que a gente esquentasse o horário do 'Chaves', que tinha saído, para a Adriane Galisteu assumir. Só que ele passou a gente para bater de frente com a novela das seis da Globo. Não deu", relembra.

Décio Piccinini no cenário do "Fofocalizando" - Gabriel Cardoso/SBT - Gabriel Cardoso/SBT
Décio Piccinini no cenário do "Fofocalizando"
Imagem: Gabriel Cardoso/SBT
Parar? Ainda não

Com o fim das duas atrações, Décio se afastou da TV e se "internou" nas revistas que precisava editar (chegou a entregar oito por semana!). Há cinco anos, voltou à televisão como apresentador do "É 10", na Rede Brasil, e desde 2013 retomou o papel de "jurado ranzinza" no quadro "Dez ou Mil", do "Programa do Ratinho", e no "Programa Silvio Santos". E não pensa em parar.

"Vou até onde der, porque jornalista não tem aposentadoria. Sou aposentado, mas ganho meio salário por mês porque um patrão registra e outro não, um é pessoa jurídica e outro é pessoa física. No final, é meio problemático. Por causa disso, vou continuar trabalhando, até onde der, até onde me deixarem, até onde me quiserem."