Topo

Musical em tributo a criador de Chaves também homenageia dublagem do SBT

Mateus Ribeiro interpreta Chaves no espetáculo Chaves - Um Tributo Musical - Stephan Solon/Divulgação
Mateus Ribeiro interpreta Chaves no espetáculo Chaves - Um Tributo Musical Imagem: Stephan Solon/Divulgação

Paulo Pacheco

Do UOL, em São Paulo

26/08/2019 10h52

O abraço de Carol Costa, intérprete de Chiquinha em Chaves - Um Tributo Musical, em Sandra Mara Azevedo e Cecília Lemes, as duas dubladoras da personagem da série mexicana, no primeiro final de semana em cartaz do espetáculo, mostra que a produção vai muito além de uma homenagem ao comediante Roberto Gómez Bolaños, criador do programa de TV. A peça também exalta a dublagem, realizada dentro do SBT no anos 80.

É impossível falar de Chaves no Brasil sem mencionar a dublagem. Aqui, foram alterados os nomes da série (El Chavo del Ocho, ou O Moleque do Oito, em tradução literal), e de personagens como Seu Madruga (Don Ramón) e Chiquinha (Chilindrina). O "abrasileiramento" de bordões e frases clássicas e os tons das vozes de cada personagem foram respeitados pelo musical como se fizessem parte do programa original.

Aí Vem o Chaves, tema de abertura executado há 30 anos pelo SBT (e alvo de processo do compositor, Mário Lúcio de Freitas, alegando falta de créditos), surge no musical assim que Chaves (Mateus Ribeiro) sai do barril pela primeira vez e dança com os moradores da vila. Outras canções clássicas, como Jovem Ainda e Somos Cafonas Sim, tiveram as adaptações da dublagem respeitadas. Apenas Que Bonita Vecindad, mal traduzida (e mesmo assim imortalizada) como Que Bonita Sua Roupa, foi corrigida para Que Bonita Vizinhança.

Chaves foi praticamente dublado do "zero". Sem canais de áudio diferentes para falas e trilhas, a equipe da Maga, dubladora de Marcelo Gastaldi (1944-1995) que prestava serviços para o SBT, precisou refazer todos os efeitos sonoros, de batidas na porta a músicas de fundo, que foram recriadas com exatidão pelo designer de som João Baracho e executadas ao vivo no musical. Quem for ao teatro vai se sentir dentro da tela da TV.

Mateus Ribeiro, o Chaves, abandonou o carioquês de origem e mergulhou no sotaque paulista de Marcelo Gastaldi (1944-1995), dublador que eternizou a voz de Chaves no Brasil. Ele também escalou, como em uma peça de teatro, os dubladores ideais para cada personagem, formando um elenco perfeito para uma produção vista na época com estranhamento pelo SBT.

Carol Costa ao lado de Sandra Mara Azevedo e Cecília Lemes, dubladoras da Chiquinha - Montagem/UOL/Reprodução/Instagram/Paulo Pacheco - Montagem/UOL/Reprodução/Instagram/Paulo Pacheco
Carol Costa ao lado de Sandra Mara Azevedo e Cecília Lemes, dubladoras da Chiquinha
Imagem: Montagem/UOL/Reprodução/Instagram/Paulo Pacheco

Carol Costa, já citada, confessou ao UOL ter tido "crises" para se adaptar às vozes de Sandra Mara e Cecília Lemes. Diego Velloso, o Quico, e André Pottes, o Seu Madruga, se aproximaram dos respectivos dubladores, Nelson Machado e Carlos Seidl. Patrick Amstalden, o Professor Girafales, buscou o meio-termo entre a interpretação mais nervosa de Potiguara Lopes (1941/1942-1992) e suave de Osmiro Campos (1933-2015), donos das vozes do Professor Girafales.

O público do musical também teve ótimas surpresas ao ver uma aula da Escolinha com perguntas sobre História do Brasil, como na TV, com Nhonho (Ettore Verissimo) e a fala arranhada de Mário Vilella (1934-2005), a fanha Pópis (Maria Clara Manesco), dublada originalmente por Marta Volpiani, e Godinez (Lucas Drummond), querido pelos fãs principalmente pela voz fina de Silton Cardoso (1938-2014).

Andrezza Massei, intérprete de Dona Clotilde e uma das estrelas de Chaves - Um Tributo Musical, surpreendeu ao cantar Perigosa, das Frenéticas ("Sei que eu sou bonita e gostosa"). Quem assiste à série sabe que é uma das músicas favoritas da Bruxa do 71 e uma das invenções da dubladora Helena Samara (1934-2007).

Andrezza Massei interpreta Dona Clotilde em Chaves - Um Tributo Musical - Stephan Solon/Divulgação - Stephan Solon/Divulgação
Andrezza Massei interpreta Dona Clotilde em Chaves - Um Tributo Musical
Imagem: Stephan Solon/Divulgação

Consultoria de fãs

Além de se debruçarem em maratonas de episódios, os atores e diretores do musical receberam a consultoria de fãs. O jornalista Antonio Felipe Purcino é administrador do Fórum Chaves, maior comunidade de fanáticos da série no Brasil, e teve colaboração de moderadores como João Victor Trascastro. O ator Gustavo Berriel fundou o primeiro fã-clube nacional, Chespirito Brasil, e a idolatria o levou à dublagem. Ele dubla Sr. Barriga e Nhonho desde 2006 e trabalhou como tradutor das dublagens mais recentes para o SBT e o canal pago Multishow.

Chaves e Chapolin chegaram ao Brasil em 1981, dentro de um pacote de novelas mexicanas compradas por Silvio Santos para o recém-inaugurado SBT. O apresentador e empresário mandou dublar as séries dentro da própria emissora, mas enfrentou resistência de executivos que achavam os programas sem graça. O diretor do núcleo de dublagem, José Salathiel Lage, convenceu o patrão a exibir os dois humorísticos. A estreia aconteceu dentro do game TV Powww!, comandado por Paulo Barboza.

A qualidade da dublagem agradou Roberto Gómez Bolaños, que chegou a ensaiar bordões em português para um possível show de Chaves no Brasil (o que nunca aconteceu). O filho do comediante, Roberto Gómez Fernández, reconhece a importância da versão brasileira para o sucesso da série mexicana no nosso país.

"O Brasil representa a maior comunidade de fãs na América Latina. Para nós, é muito importante estar em contato com eles. Além disso, são muito ativos nas redes sociais, o que nos faz perceber mais de perto o fenômeno de Chespirito e seus personagens no Brasil. Devemos levar em conta que é o único país latino-americano em que o programa é dublado, o que não me surpreende pelo extraordinário trabalho de dublagem que foi feito", afirmou o filho de Bolaños ao UOL.

Chaves - Um Tributo Musical ficará em cartaz até 22 de setembro no teatro Opus, dentro do Shopping Villa-Lobos, na zona oeste de São Paulo, com sessões às sextas (21h), sábados (16h e 20h) e domingos (15h e 19h).