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Qual foi o papel de CQC, Superpop e Pânico na popularização de Bolsonaro

Mauricio Stycer

29/10/2018 05h01

Muita gente responsabilizou programas como "CQC", "Superpop" e "Pânico" pela projeção que Jair Bolsonaro ganhou nos anos 2010. Acho esta uma avaliação muito simplista. A transformação do então deputado num fenômeno de mídia vai bem além deste jogo de culpa e responsabilidade.

O documentário "Get Me Roger Stone", dedicado a mostrar o trabalho do consultor político que ajudou a tornar Donald Trump presidente dos Estados Unidos, oferece várias pistas para entender o fenômeno. Trabalhando como lobista e marquetólogo de políticos do Partido Republicano desde os anos 1960, Stone desenvolveu uma série de táticas – muitas desleais – para promover seus clientes e vencer eleições.

"A mídia é maligna ou preguiçosa. Ou as duas coisas. E se você entender isso, você pode fazer o que quiser", ensina Stone. Esta lição ajuda a entender por que Bolsonaro apareceu tanto na atração de matriz argentina da Band e no programa de Luciana Gimenez na RedeTV!

"CQC" e "Superpop" não eram sócios de Bolsonaro na sua estratégia de promoção. Ambos apenas enxergaram a chance de conseguir audiência sem fazer esforço. Daí os inúmeros convites e entrevistas com ele. Já o então deputado sempre seguiu, ainda que de forma intuitiva, uma outra lição de Stone: "A atual política de desmoralização é essencial hoje para ser notado. Você tem que ser ultrajante para ser notado".

O consultor político de Trump diz ainda: "Política é show business para pessoas feias". E acrescenta: "Você acha que os eleitores não sofisticados sabem diferenciar entretenimento de política?"

Some-se a isso o que ele chama de "o valor da desinformação", a aposta no antielitismo e a estratégia de "fazer com que Trump pareça ser fora do sistema", como dizia ainda na campanha eleitoral, e temos um ex-apresentador do "Aprendiz" transformado em presidente dos Estados Unidos.

Não estou dizendo que Bolsonaro seguiu as regras e lições de Roger Stone. Mas, intuitivamente, levou adiante várias delas. Compreendeu que "CQC" e "Superpop" entre outros, lucravam (pontos no Ibope) com a exibição de suas ideias consideradas ultrajantes e não parou de repeti-las na TV. Apostou no papel de anti-sistema, reproduziu fake news (o "kit gay", por exemplo) e nunca fez questão de parecer bonzinho.

Raramente foi confrontado nestes programas. E quando foi, o objetivo era apenas elevar a temperatura da polêmica, e não esclarecer qualquer coisa. Foi um casamento perfeito.

Da mesma forma, não se incomodou com a paródia que Márvio Lúcio, o Carioca, fez dele no "Pânico". Ao contrário, entendeu claramente que a piada com o "Mito" revertia a seu favor, numa prova, como diz Stone, que entretenimento e política caminham de mãos dadas em alguns circuitos.

Em tempo: "Get Me Roger Stone" está disponível na Netflix. Vale a pena.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

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