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No melodrama de “A Dona do Pedaço”, o importante é sentir; pensar atrapalha

Mauricio Stycer

04/06/2019 05h01


Depois de 20 anos, um achando que o outro havia morrido, Maria da Paz (Juliana Paes) e Amadeu (Marcos Palmeira) se reencontraram no capítulo desta segunda-feira (03) de "A Dona do Pedaço". Sequência fundamental para o desdobramento da trama, ela ajuda a entender o sucesso que a novela de Walcyr Carrasco vem fazendo.

Num melodrama escancarado como esse, o essencial é sentir. Pensar atrapalha. Aceite os exageros. Não espere sutileza. Tudo é dito, repetido e demonstrado com clareza, didatismo e clichês.

Como muita gente observou, por exemplo, se o advogado tivesse jogado o nome da amada no Google a teria encontrado em questão de segundos. Mas esta sagacidade causaria um enorme desperdício de emoções.

Muito mais interessante foi alimentar a expectativa do público, encadeando inúmeras coincidências nos capítulos anteriores, até Maria abrir a porta de uma de suas lojas e encontrar Amadeu sentado, comendo uma fatia de bolo criado por ela.

O espanto da empresária foi expresso na forma de uma gargalhada nervosa. A reação combina com o tipo mercurial desenhado com tintas vermelhas por Carrasco. Maria da Paz deixou a sobriedade e a timidez no passado e se transformou numa clássica "perua de novela" – um tipo exagerado, ridículo e alheio ao que pensam sobre ela.

A personagem de Juliana Paes saiu da pobreza, superou vários dramas e se tornou dona de 22 lojas. Faz o que quer, como quer, sem dar satisfações a ninguém porque é uma vencedora. Sutileza é para os fracos.

Para completar o perfil, Maria da Paz passou 20 anos em completo celibato, pensando exclusivamente no homem por quem se apaixonou e com quem teve uma filha. "Mesmo achando que você estava morto, eu nunca quis deixar ninguém entrar na minha vida", explicou duas vezes, em diferentes momentos do capítulo.

Após um instante de euforia, Maria desmaiou nos braços de Amadeu. Corta para o hospital. "Onde é que eu tô? Tô no hospital de maluco? Porque eu não sei mais saber quem tá vivo e quem tá morto?" Amadeu, então, entra no quarto, sorri e diz: "Sou eu Maria, eu tô vivo! Bem vivo."

Depois de se darem conta que foram enganados pelas próprias mães, Maria diz: "Quiseram separar a gente. Quiseram acabar com o nosso amor".

Corta para uma pizzaria, com letreiros vermelhos. Em três minutos, Amadeu e Maria se acertam. "Nunca esqueci você, nunca esqueci nosso primeiro encontro, nosso primeiro beijo, nosso primeiro olhar", ela diz. "Também nunca esqueci você, Maria", diz ele, antes de acelerar: "Eu tô com uma vontade de abraçar o seu corpo, sabe, te beijar, enfiar a mão no teu cabelo, te puxar e falar: Minha Maria!" E ela: "Me leva daqui!"

Amadeu diz que Maria merecia ser levada para um castelo, mas eles vão a um motel mesmo. Um quarto com luzes em neon vermelho. Maria tira a roupa e dança para Amadeu. Fica em pé na cama, antes de deitar e beijar o amado.

Perto do fim do capítulo, voltamos a ver o casal na cama, agora conversando. Maria resume a sua história como empreendedora e conta a Amadeu que teve uma filha com ele, Josiane. Já o advogado faz suspense: "Tenho uma coisa muito importante para te falar". Corta.

E, na cena final do capítulo, Amadeu finalmente informa a amada que o amor deles é impossível, pois é casado.

Maria da Paz fala: "Fiquei tão doida na hora que eu nem reparei que você tinha uma aliança no dedo", ela diz. "Eu, de alguma maneira, pensei que você, mesmo achando que eu tava morta, tinha se guardado pra mim, igual eu tinha me guardado pra você, mas homem não é igual a mulher. Homem não consegue…"

E Amadeu diz: "Eu te amo, Maria, do mesmo jeito que amava quando acabaram com a nossa vida. Eu vivia sonhando em te reencontrar, mas eu não posso me separar. Eu tô casado e nunca vou poder largar a minha mulher". Tóin!

Com o anúncio de que a Globo já tem a intenção de esticar "A Dona do Pedaço" por mais dois meses, é possível imaginar que este amor impossível ainda vai render muito. E tome melodrama. E neon vermelho.

Audiência: O 13º capítulo de "A Dona do Pedaço" bateu recorde de audiência, claro. Em São Paulo, a novela de Walcyr Carrasco registrou média de 37,1 pontos.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

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Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.