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"Filhos da Pátria" volta menos sutil, mas ainda muito afiada e certeira

Mauricio Stycer

09/10/2019 00h22

Maria Teresa (Fernanda Torres) em cena da segunda temporada de "Filhos da Pátria", ambientada em 1930

Em 3 de outubro de 1930, ainda em dúvida se o Brasil estava sofrendo um golpe ou uma revolução, Maria Teresa Bulhosa (Fernanda Torres) se juntou aos militares que marchavam pelas ruas do centro do Rio e bateu uma panela. Seu marido, o burocrata Geraldo, ainda sem saber para que lado o vento ia soprar, preferiu se esconder.

"Um novo, claro Brasil / Surge, indeciso, da pólvora. / Meu Deus, tomai conta de nós", escreveu Carlos Drummond de Andrade sobre aqueles dias tumultuados.

Já conhecemos Geraldo e Maria Teresa de longa data, assim como os seus filhos Geraldinho (Johnny Massaro) e Catarina (Lara Tremouroux), a empregada Lucélia (Jéssica Ellen), o malandro Domingos (Serjão Loroza) e Pacheco (Matheus Nachtergaele), o burocrata-mestre.

Todos eles protagonizaram um dos melhores programas que a TV aberta exibiu em 2017, a série "Filhos da Pátria". A primeira temporada se passou em 1822, nos dias seguintes à Independência. Teletransportados para um século depois, os personagens seguem muito parecidos – Lucélia, então escrava, agora é empregada dos Bulhosa, mas continua a mais sábia de todos, e Domingos trocou o trabalho na casa da família por uma vida na rua, vendendo sambas.

Johnny Massaro (Geraldinho), Fernanda Torres (Maria Teresa), Lara Tremouroux (Catarina) e Alexandre Nero (Geraldo Bulhosa), os protagonistas da série

Bruno Mazzeo, criador de "Filhos da Pátria", explicou: "A ideia da série é mostrar que o Brasil está sempre recomeçando, um 'agora vai'. Sempre está acontecendo alguma coisa que parece que vai dar certo e, de repente, volta tudo".

Como disse Nelson Rodrigues, "subdesenvolvimento não se improvisa; é obra de séculos". A reflexão surgiu na abertura do primeiro episódio da primeira temporada. A ideia de mover os mesmos personagens para uma outra época e mostrar que, no fundo, o tempo não passa é excelente.

O texto continua afiadíssimo nesta segunda temporada. O elenco todo é de altíssimo nível, nem preciso dizer. Mas Fernanda Torres dominou o primeiro episódio, com as melhores falas e situações. Um deleite ver a sua Maria Teresa em ação.

Só achei que, em alguns momentos, Mazzeo e seus colaboradores apelaram para uma facilidade – as alusões muito explícitas aos dias atuais. "Acabou a mamata", disse um personagem. Além de bater panela, Maria Teresa fez "arminha" com as mãos, soltou um "tchau querida" e ainda falou que "meninos vestem azul, meninas vestem rosa".

"Filhos da Pátria" é mais interessante quando sugere do que quando grita sobre a vocação brasileira ao atraso e ao fracasso.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

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