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DJ Ivis: 'Redes são espaço de empatia em casos de agressão', diz advogada

DJ Ivis - Reprodução/Instagram
DJ Ivis Imagem: Reprodução/Instagram

Breno Boechat e Guilherme Lucio da Rocha

Do UOL, em São Paulo

13/07/2021 04h00Atualizada em 13/07/2021 13h30

Foi por meio das redes sociais que Pamella Gomes de Holanda revelou as agressões que sofria do companheiro Iverson de Souza Araújo, o DJ Ivis. E esse método se tornou algo comum nos últimos tempos, com mulheres expondo nos seus perfis no Instagram, Twitter e Facebook os casos de violência doméstica sofridos por elas.

UOL conversou Janaina Matida, professora de Direito Probatório da Universidad Alberto Hurtado (Chile) e advogada, sobre como o caso de Pamella é reflexo dos casos de violência de gênero no Brasil.

De acordo com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, os canais Disque 100 e Ligue 180, do Governo Federal, registraram 105.821 denúncias de violência contra mulher em 2020. O dado corresponde a cerca de 12 denúncias por hora. Desse total, 72% (75.894 denúncias) se referem à violência doméstica e familiar contra a mulher.

Janaina destaca que casos de violência doméstica costumam contar com um cenário onde estão presentes apenas vítima e agressor.

E, do ponto de vista probatório, é complexo. A gente não pode julgar ninguém por convicção ou capricho. A forma que o processo penal tem para atribuir castigo jurídico é através da prova. O que acontece em muitos casos é que fica a palavra de um contra o outro, o que traz dificuldades para casos de violência doméstica. Mas o caso do DJ Ivis foge à regra. Temos um registro em vídeo muito poderoso --e que ainda que ele afirme ter sido editado e cortado, não é possível justificar as agressões desferidas a Pamela. Não é possível justificar a violência contra a mulher.
Janaina Matida

Os trechos divulgados por Pamella foram feitos, segundo ela, na residência do casal, em datas diferentes. O UOL assistiu aos vídeos, mas por conta do teor violento decidimos não compartilhá-los. Em certo momento, Ivis agride a mulher com ela próxima ou até mesmo segurando a filha do casal, Mel, de nove meses.

Vídeo mostra DJ Ivis agredindo mulher - Reprodução / Instagram - Reprodução / Instagram
Vídeo mostra DJ Ivis agredindo mulher
Imagem: Reprodução / Instagram

A professora critica a maneira como o sistema de justiça trata as acusações feitas por mulheres com relação a agressões que sofrem de companheiros. "Se uma mulher presta queixa por roubo, o relato do acontecimento não é diminuído. Por que em casos de violência doméstica os depoimentos são colocados em xeque? O depoimento de uma mulher sempre deve ser levado a sério. Vítimas de violência não podem sofrer injustiça testemunhal", diz.

Para Janaina, a rede social se tornou um espaço onde as mulheres podem compartilhar seus relatos —e suas provas— e se sentirem acolhidas. No entanto, ela ressalta que a Justiça deve se fazer no âmbito correto, sem linchamentos virtuais. "O processo penal é a melhor forma de fornecer justiça. Não cabe a nós um exame para além disso", afirma.

A professora destaca o exemplo de Mari Ferrer, que expôs um caso de violência sexual que teria sofrido em 2018 e recebeu apoio nas redes sociais com a hashtag #JustiçaParaMariFerrer. "O caso de que tomamos conhecimento ontem não apresenta clandestinidade e, ainda assim, serviu a controvérsias e opiniões divididas. Sintoma disso é que o DJ ganhou mais de 250 mil de seguidores nas últimas horas".

"As redes sociais, realmente, são um fenômeno social no qual as vítimas tentam encontrar empatia, achar o acolhimento que faltou quando se sentiram abandonadas em um contexto de violência. Compartilham seus relatos, vídeos e registros nesta tentativa de sair do abandono", explicou.

As mulheres sofrem muitos dilemas até conseguir levar o que aconteceu para a polícia, com medo de ser vítima duas vezes. Milhares de mulheres passam por violência doméstica e passam pelo dilema: 'vou denunciar meu marido? O pai dos meus filhos?' Muitas vezes, as mulheres deixam de procurar a polícia pelo medo de não serem acolhidas. E esses casos de lesão corporal se encaminham para casos de feminicídio, com uma escalada de violência cada vez maior.
Janaina Matida

No caso do DJ Ivis, embora ele tenha ganhado mais de 250 mil seguidores após a divulgação dos vídeos com direito a críticas, Pamella se tornou um dos termos mais citados no Twitter, com muitos comentários de apoio à atitude de expor as agressões sofridas.

O que salta aos olhos é que não é um caso de dificuldade probatória em razão de clandestinidade, não é uma conduta que ele praticou entre quatro paredes e que não havia testemunhas ou registros. Agora, a sociedade precisa se desfazer dos estereótipos de gênero para analisar esse caso. Não se trata de dificuldade probatória em si, se trata de uma dificuldade de interpretar as provas por conta do machismo estrutural e do patriarcado.

Entenda o caso

Pamella Gomes de Holanda, companheira de Iverson de Souza Araújo, o DJ Ivis, compartilhou nas suas redes sociais uma série de vídeos que mostram o artista a atacando com tapas, socos e chutes. Também via Instagram, ele confessou as agressões, mas disse que é vítima de uma chantagem.

De acordo com a Polícia Civil do Ceará, o caso aconteceu no município de Eusébio e é investigado como lesão corporal pela delegacia da cidade com o apoio do Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis (DPGV). As agressões teriam ocorrido no dia 1º de julho. No entanto, Pamela registrou o caso no dia 3 e, por isso, Ivis não poderia ser preso em flagrante. Após o boletim de ocorrência, a polícia solicitou à Justiça medida protetiva da vítima contra o agressor.

Ainda no sábado, em caráter de urgência, a defesa de DJ Ivis solicitou a Justiça para que o que os vídeos postados por Pamella fossem removidos das redes sociais e que ela ficasse proibida de comentar o assunto com a imprensa. A juíza Maria José Sousa Rosado de Alencar, da Comarca de Fortaleza, negou o pedido.

Em caso de violência, denuncie

Ao presenciar um episódio de agressão contra mulheres, ligue para 190 e denuncie.

Casos de violência doméstica são, na maior parte das vezes, cometidos por parceiros ou ex-companheiros das mulheres, mas a Lei Maria da Penha também pode ser aplicada em agressões cometidas por familiares.

Também é possível realizar denúncias pelo número 180 — Central de Atendimento à Mulher — e do Disque 100, que apura violações aos direitos humanos.

Há ainda o aplicativo Direitos Humanos Brasil e através da página da Ouvidoria Nacional de Diretos Humanos (ONDH) do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH). Vítimas de violência doméstica podem fazer a denúncia em até seis meses.