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Novelas insistem no clichê machista da noiva humilhada no altar

Mauricio Stycer

21/07/2019 05h01

"A Dona do Pedaço" bateu recorde de audiência esta semana com a exibição de uma cena de casamento desfeito no altar por iniciativa do noivo, com direito a humilhação da noiva.

Trata-se de um feito altamente previsível. Cenas deste tipo sempre elevam o Ibope e, claro, provocam protestos pela reiteração de um comportamento machista. É muito raro, em novelas, assistirmos a situação inversa, ou seja, um homem sendo exposto ao vexame no altar pela mulher.

O fiasco do casamento de Vivi (Paolla Oliveira) e Camilo (Lee Taylor) foi o segundo neste mês de julho em novelas da Globo. Há duas semanas, a vigarista Vanessa (Camila Queiroz) foi exposta ao ridículo por seu noivo Quinzinho (Caio Paduan) no momento em que se casariam, em "Verão 90".

Tanto na trama de Walcyr Carrasco quanto na de Paula Amaral e Izabel de Oiveira, as noivas humilhadas deram uma "banana" para os noivos e deixaram o altar com os seus amantes: Vivi com Chiclete (Sérgio Guizé) e Vanessa com Jerônimo (Jesuíta Barbosa). Ambas as soluções buscam atenuar o machismo envolvido na situação, dando a ideia de que as mulheres deram a volta por cima.

De fato, as duas cenas foram menos pesadas do que a exibida há um ano, em julho de 2018, em "Segundo Sol", de João Emanuel Carneiro, no momento do casamento de Cacau (Fabíula Nascimento) e Roberval (Fabrício Boliveira). Nesta cena, o noivo vai além das agressões verbais e rasga o vestido da noiva, que deixa o casamento completamente destruída física e moralmente.

O clichê da noiva humilhada no altar pelo noivo é antigo. Uma cena do tipo sempre lembrada foi vista em "A Próxima Vítima", de Silvio de Abreu, em 1995. Diego (Marcos Frota) agrediu a noiva Isabela (Claudia Ohana) diante dos convidados do casamento ao flagrá-la na cama, momentos antes, com Marcelo (José Wilker). A violência contra Isabela, reiterada em outras cenas, foi discutida, na época, no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.

Tanto no passado quanto hoje, estas cenas de casamento desfeitos no altar reiteram a ideia de que a mulher merece punição pública e violenta por trair ou enganar o noivo. O que é lamentável.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

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