Criada por mãe branca, atriz Teca Pereira diz que levou susto com racismo
Aos 67 anos, Teca Pereira vem se redescobrindo na pele de Jurema, uma das alunas de Segunda Chamada. Em entrevista ao UOL, a atriz diz como aprende com a força da personagem que, na história, é três anos mais velha do que ela e que desafia o marido ao voltar a estudar no período noturno, em um colégio para adultos na periferia de São Paulo.
"Ela é uma mulher de fibra, que enfrentou uma situação de anos de prisão, digamos assim, por falta de estudo. Que a Jurema sirva de exemplo principalmente para as mulheres mais velhas. A morte não chegou, você está viva. Então é preciso lutar e não esmorecer seja lá qual for o seu sonho", encoraja.
Teca não teve privilégios ao entrar no elenco fixo da série da Globo. Ela recebeu o convite e disputou o papel com outras atrizes. Diz ter ficado um tanto apreensiva até saber o resultado. Jurema é, para ela, mais do que uma personagem: é alguém em quem vê refletida a própria história.
"Ela me estimula bastante, e usei a minha vivência para fazê-la, ainda que eu tenha estudado. Ela me deu oportunidade de rever coisas da minha própria vida, a força dela me impulsionou", diz.
Teca acredita que tenha feito os melhores papéis de sua carreira depois de completar 60 anos. Além de séries recentes, como Justiça (2016), 3% (2019), Carcereiros (2018) e Treze Dias Longe do Sol (2018), ela se tornou a primeira atriz negra a interpretar no teatro paulistano, no ano passado, a matriarca Romana, de Eles Não Usam Black-Tie, papel que já foi feito por Fernanda Montenegro.
A atriz se lembra de obstáculos que teve de enfrentar, como situações de racismo, e revela que chegou a perder oportunidades por conta de discriminação.
Foram situações profissionais de não ser respeitada como mulher mulher e negra. Concorria com outras pessoas com menos condições do que eu, mas não fazia o trabalho por conta disso. Não interessava. Mas, quando jovem, era até mais problemático isso. Sou bailarina também, e era necessário que precisassem de uma atriz negra, senão eu não podia concorrer com outras atrizes. Dava uma dor.
"Fui criada por uma mulher bem branca"
Teca conta que demorou para descobrir o que era o racismo e o que precisaria enfrentar pela cor de sua pele.
"Nasci em uma família negra, mas fui criada por uma mulher bem branca, neta de holandeses. Ela me criou como uma pessoa, e não como uma empregada ou uma dama de companhia. Foi a mãe mais maravilhosa que alguém poderia ter. Ela me deu condições e levava a minha autoestima lá para cima. Sempre me estimulava, dizendo: 'O problema está nas pessoas e não em você'."
A atriz diz que foi profissionalmente que ela se deu conta dos obstáculos que teria de superar. "Tomei até um susto quando vi que aquilo era por conta da minha pele e não pela minha capacidade. Levei em conta o que a minha mãe falou. Na área artística, pode parecer simples, mas não é. A minha força vem do meu interior. Tenho confiança em mim e gosto de ser como eu sou. Não fico preocupada com o que pensam. É o meu posicionamento que importa."
Teca acredita que atores negros vêm conquistando mais espaço e observa que o cenário já melhorou bastante. Mas alerta que ainda há muito a ser conquistado.
Estamos desbravando espaços. Está melhorando a passos médios, não a passos largos. As pessoas tinham medo de enfrentar, achando que era assim mesmo. 'Vamos fazer papéis de escravos, de bandidos, de empregadas domésticas.' Não se lutava. Há uma diferença agora. Muitas atrizes estão rompendo esse esquema horrível. A representatividade tem de ser maior.
"Quero fazer uma vilã que seja odiada"
Teca Pereira interpretou principalmente personagens coadjuvantes em novelas. Ela diz que o seu sonho é fazer uma vilã, mas não uma vilã mais ou menos. Para a atriz, o mais importante é se sentir desafiada.
"Tenho vontade de mostrar o que eu posso fazer. Aos 67 anos, só penso em coisas importantes e interessantes para fazer. Tenho fé nisso. Gostaria muito de viver uma vilã, mas uma personagem bem ruim, até a ponto de correr o risco de apanhar na rua. Uma que seja odiada mesmo. Eu adoraria", declara, aos risos.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.