Walcyr Carrasco: "Não posso mais ser pitbull, tenho que ser poodle na vida"
Resumo da notícia
- Em entrevista exclusiva, Walcyr Carrasco fala sobre o capítulo final de A Dona do Pedaço, que vai ao ar hoje
- "Se o desfecho é óbvio, e daí? O que você tem que fazer é um desfecho bom. O público vai ficar surpreso"
- Ele ainda rebateu as críticas, disse que "não perde tempo" lendo e que os críticos são "amargurados"
- O autor comentou sobre a fama de díficil, mas assumiu já ter deixado uma atriz sem falas após ela mudar seu texto
Walcyr Carrasco encerra hoje mais um de seus trabalhos na televisão, a novela A Dona do Pedaço. O autor —que vira noites trabalhando e tem uma agenda bastante cheia— abriu espaço para uma entrevista exclusiva à Coluna do Leo Dias. Ele fala, entre outras coisas, que apresentará, na noite desta sexta-feira, desfechos nada óbvios para a trama de Maria da Paz e promete surpreender os telespectadores.
Por falar na protagonista, ele aponta Juliana Paes como um grande acerto para o papel e diz que não leu nenhuma das avaliações feitas na mídia sobre seu trabalho. Classifica os críticos de TV no Brasil com "amargurados" e aponta que a maioria deles não gosta de folhetins feitos para a grande massa.
Ele admite a fama de difícil e diz que vem tentando mudar: "Tanto eu quanto a Amora [Mautner, diretora de A Dona do Pedaço] temos tendência a ser um pouco duros com as pessoas, e precisamos nos acostumar a não tratar os outros assim. Então, brincamos que não podemos mais ser pitbulls, temos que ser poodles na vida". Ele conta, ainda, que já chegou a punir uma atriz que mudava seus textos e a deixou muda por uma temporada da novela.
O autor, que não vê a hora de tirar férias para se dedicar a outro grande hobby, a pintura, ainda conta sobre seu próximo trabalho: a sequência de Verdades Secretas. Ele classifica a novela como seu grande orgulho e antecipa que a parceira e diretora Amora Mautner estará ao seu lado nessa empreitada.
As rusgas com o autor Aguinaldo Silva também são assunto da entrevista, assim como o incômodo com Marina Ruy Barbosa, depois que a atriz se negou a raspar a cabeça para uma de suas personagens. Ele critica, ainda, atores que se prendem demais à imagem mostrada nas redes sociais, deixando de viver papéis desafiadores —e cita Bruna Marquezine, que disse não ao papel de uma prostituta.
Leia abaixo trechos da entrevista:
Leo Dias - Você contou no programa Entrevista com Bial que a história de A Dona do Pedaço veio rapidamente para você. Como foi isso? Em que momento?
Walcyr Carrasco - Se eu tivesse resposta para essa pergunta, acho que ia ficar trilhardário, porque poderia ensinar a todos a receita. As coisas vão surgindo aos poucos. Eu já estava achando interessante o fenômeno de ter muitas lojas de bolo caseiro. Além disso, um amigo me contou que conhecia famílias de antigos matadores no estado do Espírito Santo, e eu me interessei por isso. Era um tema forte para a novela. De um dia para o outro, juntei as duas coisas. Fui ao Espírito Santo com ele, fui apresentado às famílias, pude ver a realidade dessas pessoas... E a Juliana [Paes] foi comigo.
A Juliana Paes foi um acerto absurdo, não é?
Absurdo. Eu sentei com o Silvio de Abreu [diretor de teledramaturgia da Globo] e falei: "Eu penso em um mulher assim, assado". Eu disse "a Juliana", e ele também. Fechamos nela, porque é [o estereótipo da] brasileira, da latina, é uma mulher com muita vida, lindíssima, da qual eu precisava. E ela tem muita luz!
Qual é a sua obra de que você mais tem orgulho?
Eu tenho um orgulho enorme de Verdades Secretas, tanto que vou fazer Verdades Secretas 2. Ousei muito, abordei um tema forte e, além do mais, ganhei o Emmy com essa novela.
De quem veio a ideia de Verdade Secretas 2?
Eu não sei precisar, mas veio da direção da Globo. Foi um pedido deles, da Monica Albuquerque, do Silvio de Abreu e do próprio [Carlos Henrique] Schroeder, que foi a primeira pessoa que me instigou a fazer uma novela nessa faixa horária que não fosse um remake, que fosse uma história original. Eu acho a ideia [de uma continuação] genial, o público todo quer ver. Espero estar à altura.
Disseram para mim que Walcyr Carrasco hipnotiza mesmo as pessoas. É verdade?
Eu sei hipnotizar, mas eu não hipnotizo as pessoas. Eu só fiz isso no contexto de uma novela que eu queria que a atriz vivesse uma sessão hipnótica. Ela queria saber como era ser hipnotizada, aí eu fiz para ela. Hipnotizar só vale a pena quando a pessoa tem alguma coisa que ela está buscando de fato, alguma recordação importante.
Os críticos vêm dizendo que A Dona do Pedaço é uma obra com desfechos óbvios, mas são desfechos que agradam ao público. O que você acha disso?
Eu nem de longe leio crítica. Vou perder tempo? Não sou ligado a crítica. No Brasil, é muito grande [a figura] daquele crítico amargurado, que vê tudo ruim. Se o desfecho é óbvio, e daí? O que você tem que fazer é um desfecho bom. Mas vou te garantir que o desfecho de A Dona do Pedaço não será óbvio. O público vai ficar surpreso.
A Dona do Pedaço foi o que você esperava?
Foi surpreendente, um sucesso que eu não esperava, porque a novela foi criada muito depressa. A sinopse foi feita em apenas três semanas. Depois, o Silvio [de Abreu] me ajudou a fechar alguns pontos que estavam meio soltos. Eu não tinha tanta expectativa de que fosse acontecer como ela aconteceu, desde o primeiro dia. Para mim, foi uma surpresa incrível.
Muito se falou que a Josiane, grande vilã de A Dona do Pedaço, foi inspirada na Suzane Von Richtofen [que planejou a morte dos pais, em 2002]. Isso é verdade?
Não houve inspiração na Suzane, mas houve em muitos casos que eu estudei de pessoas com um grau maior ou menor de psicopatia. Eu me interesso muito por essa coisa da pessoa que não tem sentimento, que é capaz de matar alguém sem sentir dor ou de se colocar no lugar do outro. Eu gosto de estudar, de ler sobre isso. Me fascina.
Eu queria que você fizesse uma análise das novelas de forma geral. Eu sinto que as histórias estão menos complexas, que têm mais fácil absorção pelo público. Qual é a sua análise?
Eu não parei para pensar sobre isso, mas eu vou por outro lado. Estou há um tempão ouvindo todo o mundo dizer que a novela vai sumir, vai acabar, que as séries vão tomar conta total. Aí, eu me pergunto: se vão acabar, por que a Turquia começou a fazer novela? Por que as Filipinas, o Canadá, o México, a Colômbia e o Brasil, que tem a melhor novela do mundo, estão fazendo telenovela? Não é um produto que está acabando.
Grandes atores estão deixando de fazer novelas por serem trabalhos exaustivos e por, muitas vezes, não trazerem uma bagagem memorável. Talvez, o que será lembrado é um filme, ou uma minissérie. Como manter grandes atores em grandes novelas?
Grande ator para mim é aquele que quer fazer a novela com o coração e que vai dedicar a vida para fazer aquilo bem. Se o cara não está a fim, é melhor não fazer, mesmo.
Você é tido como um autor muito rigoroso, mas me disseram que com uma atriz você foi mais maleável: a Tatá Werneck. É verdade?
Sim, porque ela só sabe fazer com liberdade. Ela é gênia. Não é qualquer ator que tem a forma de interpretar da Tatá. Ela tem um tom de comédia, uma presença de comédia. Eu dava o texto, mas ela desenvolvia da forma dela. Ela não mudava o que tinha que ser feito.
Mas, em um passado distante, você chegou a punir pessoas que mudaram seu texto, não é?
Sim. Eu puni uma atriz, coloquei ela muda, com problema de garganta. Ela não podia falar mais. Mas é porque ela colocava cacos que não precisava, que não acrescentavam ao texto. Eu falei com ela uma, duas, três vezes, e ela não me ouviu. Tem uma escola de atrizes que acha que, se puxar o texto para elas, vão ser mais importantes. O que eu vejo hoje não é o número nem o tamanho de cenas, mas a importância do personagem na trama.
Você tem uma parceria muito grande com a Amora Mautner, diretora de A Dona do Pedaço, que rasga elogios a você. É ela quem vai fazer Verdades Secretas 2?
É ela, sim.
A Amora me contou que teve um sonho ruim e comprou uma santa para você. Isso teria aproximado vocês dois, tanto que, hoje em dia, têm até um apelido carinhoso: chamam um ao outro de poodle. Conta isso.
Eu fiquei amigo da Amora, e o mais legal é que foi fora do trabalho. A gente sai, janta, almoça. Vamos até viajar juntos agora. A história do poodle é o seguinte: tanto eu quanto a Amora temos tendência a ser um pouco duros com as pessoas, e precisamos nos acostumar a não tratar os outros assim. Então, brincamos que não podemos mais ser pitbulls, temos que ser poodles na vida.
Você se vê, um dia, em um canal de streaming?
Vou fazer 68 anos. Já não me vejo tão longe assim, estou envelhecendo. Não sei quanto tempo mais eu vou ter de trabalho, então, não faço grandes projeções para o futuro. Agora quero escrever um livro, mas eu não penso a longuíssimo prazo. Acho que a vida vai acontecendo. Mas vou contar um segredo: estou voltando a pintar. Eu sempre gostei muito de pintar e é algo que tenho feito bastante.
Depois dos problemas que você teve com o Aguinaldo Silva, vocês voltaram a se falar, se reencontraram, mesmo que por motivos profissionais?
Encontrei com ele e, como sou uma pessoa educada, eu o cumprimentei. A quizumba foi dele, não minha. Eu apresentei a minha sinopse [de Morde e Assopra], ela foi aprovada e [a novela] foi ao ar antes da dele. Ele fez a quizumba de achar que eu poderia ter roubado a história dele. Como eu poderia fazer isso se eu estava antes no ar? Mas, quando nos encontramos, o cumprimentei e pronto. Fizemos até uma selfie. A gente tem que ser educado na vida. Isso é uma história dele para com ele, uma história que ele criou para ele.
Em relação à Marina Ruy Barbosa, cuja personagem você matou em Amor à Vida porque ela se negou a cortar os cabelos, não há a menor chance de você chamá-la novamente para uma novela sua?
Já declarei nos jornais que sim. Mas tem que ser um papel que eu ache que tenha a cara dela. Marina é uma grande atriz, mas, hoje em dia, ela é muito forte na internet, e muitos atores, às vezes, não querem fazer um papel negativo porque mexe com a imagem deles em relação a seguidores. Então, tem que ver o que dá para oferecer que deixe a pessoa feliz. Tenho que conversar com ela sobre o papel antes para deixar as coisas claras e bem combinadas.
Isso é fruto de uma geração que surgiu há pouco tempo?
É também, mas, na época em que surgiu o meu problema com ela, talvez não tenha sido bem combinado. Quando ela viu aquilo, de ter que cortar o cabelo, levou um susto. A gente chegou a avisar no início da novela, mas uma coisa é avisar e outra é uma combinação para a transformação de fato. Hoje, para chamar uma atriz do porte da Marina, você tem que combinar bem o que vai ser feito. Quando eu fui escrever O Outro Lado do Paraíso, eu convidei a Bruna Marquezine para viver uma prostituta, e a Bruna foi lá em casa, toda simpática, e disse que não sabia se queria viver outra prostituta. Disse que já tinha vivido papéis assim e que não queria se identificar só com isso. Eu entendi, porque ela queria mudar o rumo da carreira dela. Aí ela fez aquela novela em que era uma princesa. Como ser humano, eu tenho que entender que, naquele momento, ela não queria viver aquele papel. Ela só queria dar uma limpada em termos de carreira por já ter vivido três papéis semelhantes.
Você confessaria que nunca mais chamaria alguém para fazer uma novela sua por ter tido algum problema? Por essa pessoa ter te dito um "não", ou por ter te deixado na mão em alguma situação?
Não tem nenhuma pessoa nessa situação comigo. Antes de mais nada, a gente tem que acreditar que as pessoas se transformam para melhor na vida. A pessoa pode fazer uma coisa horrível com você hoje. Quem vai dizer que daqui a um, ou dois anos, ela vai ser a mesma pessoa? A gente tem que entender. Quantas coisas horríveis a gente já fez na vida e aí, quando encontra a pessoa, ela diz "vamos esquecer, vamos nos abraçar"? Eu tenho que fazer a mesma coisa, ainda mais com um ator com quem eu vou trabalhar. Foi ruim lá, mas pode ser que aqui seja maravilhoso. Eu me vejo mais light na vida.
Qual é o seu sonho, a sua ambição?
Agora, é escrever meu livro e terminar de pintar meu quadro.
Veja a entrevista completa abaixo e ouça a íntegra da conversa no podcast UOL Entrevista.
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