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Por que a interação com o público é tão desejada pelas emissoras de TV

Mauricio Stycer

31/03/2019 05h01

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Um incidente curioso ocorrido nesta terça-feira (26) tem tudo para virar caso de estudo em escolas de comunicação. Ele mostra que as emissoras de televisão estão certas em apostar na interação com o público, mas ensina também que há um risco envolvido, já que o espectador é imprevisível e incontrolável.

Como tem feito já há algum tempo em suas transmissões de futebol, a Globo convidou os espectadores a elegerem o "craque do jogo" na partida entre Brasil e República Tcheca. E o escolhido, com 28,3% dos votos, foi um jogador inexpressivo, que não fez nada de especial em campo, mas cujo sobrenome soa engraçado em português: Ondrej Kudela.

O narrador Galvão Bueno percebeu na hora a intenção cômica do público, e riu junto: "Eu tinha certeza! Houve um movimento na internet. É o bom humor, muito legal. É o voto da ironia. Eles queriam ver: 'Quero ver o que o Galvão vai falar'. Esse bom humor é que vale!"

A Globo poderia ter ignorado esses votos e anunciado o segundo lugar, o brasileiro Lucas Paquetá, como vencedor. Mas, não. A emissora também teve bom humor e expôs publicamente a piada. Galvão completou: "É você que escolhe o craque do jogo. Tá no seu direito. O cara não jogou nada. O importante é votar, participar".

O incidente ensina que, para as emissoras, o mais importante, acima de tudo, é provocar engajamento com o seu público. É isto também que a Band persegue com o "MasterChef", que o SBT tenta com o "Programa da Maisa" e a Record aposta em seus vários realities e shows de talento, como "The Four".

Um outro episódio esta semana mostrou o poder da interação com o público. Apesar da baixa audiência que vem alcançando, a pior na história do programa, o "BBB19" registrou 202 milhões de votos no paredão que eliminou Elana nesta terça-feira (26). É um recorde mundial. O que isso mostra? Fã-clubes obstinados estão engajadíssimos, influenciando no resultado final do reality.

Muita gente viu com desconfiança este número. Seria conveniente, para que as votações do "BBB" tivessem maior peso, que a Globo as submetesse a algum tipo de auditoria – iniciativa que a Record adotou em relação ao seu principal reality show, "A Fazenda".

Também esta semana, o colunista Flavio Ricco escreveu que as "mídias sociais ainda não interferem nos resultados da televisão", referindo-se às audiências. Sim, de fato, não há uma relação direta. A estreia do MasterChef, por exemplo, levou o programa ao topo dos comentários no Twitter, mas rendeu apenas 4 pontos no Ibope.

Mas as emissoras lucram de outra forma. O sucesso de um programa no Twitter se tornou um indicador de desempenho-chave (KPI, no jargão em inglês), oferecido nos pacotes comerciais vendidos pelos canais de televisão. Ou seja, hoje, o patrocinador ou anunciante investe recursos em um programa na expectativa de alcançar um determinado número de pontos no Ibope e, também, estar entre os programas mais comentados nas redes sociais.

Isso explica porque, em atrações ao vivo, os apresentadores e as emissoras façam questão de festejar quando determinado programa se torna "Trending Topic". Significa que uma meta comercial foi alcançada (ou "entregue" ao anunciante). Para quem está na TV, como disse Galvão Bueno, "o importante é votar, participar".

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.